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Sócio e divulgador do Clube de Cinema de Porto Alegre, frequentador dos cursos do Cine Um (tendo já mais de 100 certificados) e ministrante do curso Christopher Nolan - A Representação da Realidade. Já fui colaborador de sites como A Hora do Cinema, Cinema Sem Frescura, Cinema e Movimento, Cinesofia e Teoria Geek. Sou uma pessoa fanática pelo cinema, HQ, Livros, música clássica, contemporânea, mas acima de tudo pela 7ª arte. Me acompanhem no meu: Twitter: @cinemaanosluz Facebook: Marcelo Castro Moraes ou me escrevam para marcelojs1@outlook.com ou beniciodeltoroster@gmail.com

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quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Especial Halloween:  'A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça'  

Eu demorei para começar a ir ao cinema sozinho, sendo que até a década de noventa os meus pais é que me levavam para assistir somente aos filmes dos Trapalhões na tela grande. Porém, foi graças ao "Titanic" (1997) que eu comecei a frequentar sozinho os cinemas de Porto Alegre, dentre eles Imperial e Cine Vitório. Esse último, aliás, foi o cenário para a minha primeira experiência em assistir um filme de horror na tela grande e esse foi "A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça" (1999).

Eu já era muito fã da obra de Tim Burton, já que me identificava com a sua visão autoral na realização dos seus filmes, ao criar tramas do gênero fantástico, onde personagens complexos se misturavam com um cenário sombrio e belamente filmado. Burton já era conhecido por filmes como "Os Fantasmas Se Divertem", "Batman - O Filme" (1989), Edward -Mãos de Tesoura" (1990), Ed Wood e tantos outros, mas faltava um para ser declaradamente um verdadeiro filme de horror e foi através dessa obra baseada no conto "The Legend of Sleepy Hollow", de Washington Irving.

Embora seja um conto americano o escritor se inspirou muito no folclore Europeu sobre lendas de um cavaleiro sem cabeça que decepava a cabeça de camponeses. Deve-se levar em conta que, mesmo sendo dirigido por Tim Burton, a produção ficou por conta do mestre Frances Ford Coppola e que anos antes havia realizado a sua obra de horror "Drácula - De Bram Stoker" (1992). O projeto não era somente para saciar a sede dos realizadores para realização de um filme de horror, como também corresponder os fãs que desejam assistir a um filme que remetesse aos bons tempos, por exemplo, da Hammer, estúdio inglês que se tornou conhecido pelo mundo pela realização de filmes de terror.

A trama se passa em 1799, onde uma série de crimes acontecem em um pequeno vilarejo de Sleepy Hollow. Para investigar o caso é chamado o detetive nova-iorquino Ichabod Crane (Johnny Depp), um excêntrico e determinado oficial de polícia com um jeito incomum de solucionar crimes. Os métodos investigativos de Ichabod serão postos à prova perante ao verdadeiro assassino, um Cavaleiro Sem Cabeça.

Embora seja baseado em um conto americano todo o filme foi filmado na Inglaterra, sendo que 75% do longa foi filmado em estúdio. Isso fez com que Burton se sentisse bastante à vontade na realização do projeto, já que era grande fã dos filmes da Hammer e fazendo como se tivesse voltado no tempo. Ao mesmo tempo, o filme possui algumas passagens sem diálogo, remetendo aos bons tempos do cinema mudo e cujo os trejeitos dos personagens diziam muito.

Mas as homenagens de como se fazia cinema como antigamente não param por aí, pois há referências aos cinemas de horror da Universal dos anos trinta, com o direito a uma fotografia quase em preto e branco e fazendo por alguns momentos nos esquecermos de que estamos vendo um filme a cores. Além disso, o realizador presta uma homenagem em determinadas cenas ao horror do cinema Italiano, como aqueles que Mario Bava havia proporcionado e dentre eles a sua obra prima "A Maldição do Demônio" (1960). Ou seja, um filme todo moldado com tudo o que Tim Burton assistia quando criança, com o direito de uma participação de Christopher Lee, o eterno Drácula, em cena.

Esse filme marcaria a terceira participação de Johnny Depp em um filme de Burton, sendo que ambos formariam uma longa parceria também no decorrer no início dos anos dois mil. Aqui, Depp constrói para si um  Ichabod Crane com traços de humor, mas que também não esconde o seu lado trágico devido às sombras do passado. Curiosamente, o seu modo de interpretar remete quase um desenho animado, mas que talvez seja proposital, já que Burton também era muito fã da média metragem da Disney intitulado "Ichabod" (1949) e sendo apontado por muitos críticos como um dos mais sombrios do estúdio.

Curiosamente, a figura do Cavaleiro Sem Cabeça foi composta por mais de um intérprete, sendo um que cavalgava e outro sem cabeça que lutava com espadas que era interpretado por Ray Park, o Darth Maul da segunda trilogia de "StarWars". Já quando o personagem tinha a sua cabeça ele era interpretado pelo ator Christopher Walken, intérprete que já havia trabalhado com Burton em "Batman - O Retorno" (1992) e aqui ele surpreende com a sua presença assustadora mesmo nos poucos momentos em cena. Além disso, o personagem não tem falas, sendo que a sua interpretação corporal fala por si e tornando a figura do cavaleiro ainda mais ameaçadora.

O filme também marcaria o primeiro trabalho do realizador com a jovem atriz Christina Ricci, na época conhecida como a Wandinha nos dois primeiros filmes da "A Família Addams". A sua personagem Katrina Van Tassel mais parece uma figura angelical em meio a personagens tão excêntricos e sombrios e cuja figura da Bruxa está impregnada em boa parte da obra. Neste caso, não dá para não deixar de citar o ótimo trabalho da atriz Miranda Richardson, que aqui faz um trabalho duplo e com forte ligação com o monstro da trama.

Também nunca é demais mencionar o fato de que Tim Burton sempre prezou a criação dos seus filmes com efeitos práticos, sendo que raramente ele abraça o CGI e quando isso acontece o resultado vai contra a sua própria natureza. Para esse filme, porém, um dos poucos CGI vistos em cena é uma em que o Cavaleiro joga o seu machado no chão, sendo que o mesmo acaba se desmanchando. Além disso, o recurso é também utilizado nas tomadas em que o cavaleiro é interpretado por Ray Park e cuja sua cabeça é totalmente apagada.

Pode-se dizer que, independentemente de qual recurso técnico que seja, Burton sempre utilizou em prol de criar uma boa história. Além disso, a trilha musical é novamente composta pelo maestro Danny Elfman, parceiro habitual do cineasta e que aqui novamente o seu trabalho se sobressai na construção de uma melodia que se casa com o lado sombrio da obra. Destaque para os flashbacks do protagonista, onde a sua trilha nos transmite o lado lírico e poético dessas passagens como um todo.

Na época do seu lançamento, o filme ganhou críticas mistas, sendo que alguns declararam o seu amor pela visão autoral do diretor, enquanto outros criticaram o excesso da violência, principalmente devido a decapitação de uma criança dentro da história. Isso não impediu de, ao menos, o filme arrecadar mais de R$ 200 milhões na bilheteria, mesmo tendo estreado junto com o filme "007 - O Mundo Não é o Bastante" (1999). Em premiações, o filme foi vencedor do Oscar de Melhor Edição de Arte, além do BAFTA pela mesma categoria e de Melhor Figurino.

Hoje, pode-se dizer que o filme envelheceu muito bem, sendo visualmente assustador, divertido em alguns momentos graças à atuação de Johnny Depp e tendo uma verdadeira carga de referências com relação ao gênero de horror. O filme é uma prova que, mesmo em um período em que o CGI dominaria na elaboração dos blockbusters, é sempre bom constatarmos que um filme possui o seu peso graças aos efeitos práticos de antigamente. Neste caso, Tim Burton é o que melhor entende.

"A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça" é um belo clássico de horror, elaborado pelas mãos de Tim Burton e um verdadeiro exercício para os amantes do cinema como um todo. 

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