Nota: Filme exibido para os associados no dia 19/10/24
Sinopse: Após anos sendo relegada ao papel de simples esposa, Bernadette Chirac resolve dar o troco.
O recente filme "O Aprendiz" (2024) é um exemplo de cinebiografia corajosa sobre uma figura política polêmica como a de Donald Trump, sendo que o diretor Gabriel Sherman não teve medo das futuras retaliações que poderão vir. Porém, um filme nunca será exatamente fiel aos verdadeiros fatos, principalmente daqueles que envolve diversos jogos políticos. "Bernadette" (2023), segue uma cartilha curiosa ao usar o lado contestador e entrelaça-lo com momentos de puro humor.
Dirigido por Léa Domenach, o filme conta a história de Bernadette (Catherine Deneuve), uma mulher que, após anos trabalhando nos bastidores para que seu marido se tornasse presidente, se vê esquecida e considerada antiquada dentro do Palácio do Eliseu. Apesar de suas esperanças de finalmente ser reconhecida após a eleição de seu marido, o tão desejado reconhecimento nunca chega. Cansada de ser ignorada, Bernadette decide tomar o controle de sua própria vida e começando cada vez mais trabalhar no meio político por conta própria e sem autorização do seu marido.
O filme é baseado na vida real de Bernadette Chirac durante os dois mandatos presidenciais de seu marido, Jacques Chirac (Michel Vuillermoz), de 1995 até 2007. Curiosamente, há o prólogo que revela cenas reais da própria Bernadette em eventos que ela havia participado e fazendo a gente crer que o longa irá se aproximar ainda mais dos verdadeiros fatos. Porém, Léa Domenach opta pelo caminho oposto, ao fazer uma comédia refinada sobre alguns eventos que vieram realmente à tona para a população francesa, mas ao mesmo tempo tendo liberdade para dar algumas pinceladas sobre os fatos que haviam ocorrido.
O filme procura não perder muito tempo com o lado mais complexo do jogo político que acontece por detrás das cortinas, mas sim vermos a construção gradual que Bernadette faz consigo mesma. Através do seu auxiliar, divertidamente interpretado por Denis Podalydès, ela muda de figurino, de comportamento e procurando ser mais próxima com o povo. Com isso, vemos ela participar de diversos eventos, com o direito de a própria estar presente em uma danceteria e fazendo com que o seu marido desperte a sua ira.
Embora já seja os anos noventa, o filme não esconde o fato que as mulheres da França ainda tinham problemas com o lado patriarcado que ainda se encontrava incrustado nesse mundo democrático. O retrato de Jacques Chirac visto na tela chega até mesmo de nos gerar repulsa, principalmente pela forma mesquinha e muito bem construída pelo interprete Michel Vuillermoz. A cena da tartaruga, por exemplo, nos causa um riso forçado, pois no fundo sabemos o quanto aquilo é errôneo.
Como sempre, Catherine Deneuve está ótima em cena, mesmo não se parecendo muito com a verdadeira Bernadette, mas ao mesmo tempo construindo para si uma ideia do que ela poderia ter sido naqueles tempos de luta em que a personagem histórica procurava a sua luz própria. Curiosamente, a sua Bernadette possuía um faro sobre os eventos que estavam acontecendo e que poderiam acontecer no mundo político. A cena, por exemplo, dela temer pelo surgimento de uma Extrema Direita em território francês era o prenuncio dos anos que viriam e dos quais, infelizmente, estamos convivendo com esse lado sombrio da política pelo mundo.
Ao final, constatamos que o papel da mulher neste cenário requer jogo de cintura, mas ao mesmo tempo ousadia para passar por cima. Talvez Bernadette tenha sido percursora de muitas que decidiram aderir a esse meio, mas que ainda hoje enfrentam um machismo que dificilmente sairá do mundo político. Ao menos o filme nos passa uma sensação agradável com um roteiro bem amarrado e cuja piada final é a verdadeira cereja no bolo.
"Bernadette" é um ótimo filme francês com um humor refinado, mesmo retratando um jogo político por vezes sujo, mas antes rirmos do que chorarmos quando adentramos neste tipo de cenário.
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