Sinopse: Duas histórias paralelas de amor onde os parceiros são frustrados por obstáculos ocultos inevitáveis, a força da superstição e a mecânica do poder.
Jafar Panahi já era um dos diretores mais conhecidos do Irã, pois basta vermos a sua genialidade em filmes como "O Espelho" (1997) para termos uma vaga ideia do que eu estou falando. Porém, ao se tornar um opositor do governo de lá ele acabou sendo preso em regime domiciliar, condenado a vinte anos em não trabalhar mais no ramo do cinema e chocando a comunidade cinéfila de todo mundo na época. Contudo, isso não o impediu de realizar filmes que sintetizem a sua situação como em "Isto não é um filme"(2011) e "Taxi do Teerã" (2015). Mas se em "3 Faces" (2018) ele prova que as correntes não o prendiam em "Sem Ursos" (2022) ele faz uma crítica acida sobre os limites impostos contra ele e de forma surpreendente.
Na trama, somos introduzidos a duas histórias de amor distintas, mas contadas paralelamente. Em ambos os casos, acompanhamos a frustração dos parceiros, causada por diversos obstáculos ocultos e, por vezes, até mesmo inevitáveis. A narrativa ainda apresenta a força das crenças supersticiosas e as mecânicas de poder em um relacionamento. O longa-metragem foi exibido internacionalmente nos Festivais de Veneza e Toronto.
Quando assistimos a um filme de Jafar Panahi nos perguntamos se o que estamos diante é um documentário, ou um falso documentário ou uma ficção. Na abertura, por exemplo, testemunhamos um casal tentando criar uma forma para atravessar a fronteira, quando na verdade se percebe que aquele momento tudo não passava de uma filmagem, sendo que o próprio Panahi estava dirigindo de longe através do seu computador. Mas é uma ficção dentro de uma ficção, cuja proposta se distancia de genialidade de "O Espelho", mas sintetizando ainda mais a situação do diretor em território Iraniano.
Assim como "3 Faces", o diretor se aproxima cada vez mais da proposta de Abbas Kiarostami, ao distanciar um pouco de Teerã e começar a focar nas vilas que tanto o falecido diretor se dedicava. Em determinados momentos, por exemplo, vemos Panahi pegar o seu carro e dirigir nas estradas empoeiradas, mas somente para chegar a divisa com a Túrquia e colocando a si mesmo em um dilema. A coragem é nítida em vários aspectos, onde realizador prova que não importa quantas condenações podem ser impostas contra ele, pois basta uma câmera na mão para ele se sentir livre para arriscar em qualquer instante.
Ao mesmo tempo é curioso a posição do diretor perante os velhos costumes daquela comunidade do qual ele se encontra, sendo que quanto mais ele se impõe e não atende os desejos deles mais há uma certa tensão no ar acontecendo a todo o instante. O diretor, ou sendo ele mesmo dentro da ficção, procura compreender as regras impostas por aquelas pessoas, ao ponto de querer registrar os fatos, mas sendo logo interrompido. Portanto, vemos o diretor dentro da ficção em querer arriscar tudo, mas será que ele não estava realmente correndo esse risco?
Além disso, realizador nos coloca frente a frente com a questão das fronteiras, não somente entre o Irã e da Turquia, como também de diversas famílias pelo mundo que fogem da guerra para conseguir obter uma nova vida, mas correndo um sério risco de vida. Portanto, não há exatamente um final feliz dos dois lados retratados na história, pois essa questão dificilmente acabará tão cedo um dia. Nos segundos finais vemos Jafar Panah se encontrando impotente e fazendo com que tenhamos diversas interpretações, não somente sobre o seu futuro no Irã, como também de todos aqueles que enfrentam governos autoritários.
"Sem Ursos" é o filme mais transgressor de Jafar Panah, onde ele não se limita em arriscar e nós somente temos que agradecer.
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