Sinopse: Raúl é um peão desempregado e pai de família. Na escuridão das noites, junta-se a um bando de ladrões de gado. Ao retornar de mais uma madrugada, encontra sua casa vazia. Sua mulher e filhos desapareceram.
O gênero faroeste não se limita somente em território norte-americano, sendo que o próprio cinema brasileiro possui o seu bang e bang, mas de uma forma que se difere dos gringos. "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), por exemplo, falava sobre a luta do ser humano em meio as mudanças e cuja luta por um pedaço de terra perdura até nos dias de hoje. "Casa Vazia" (2021) lança uma visão curiosa sobre o Sul do Brasil, onde a luta não é mais entre o bem e mal como nos faroestes de antigamente, mas sim quem possui mais poder é o que vence.
Dirigido por Giovani Borba, o filme acompanha o peão desempregado e pai de família, Raúl, interpretado pelo ex-peão Hugo Noguera, que vive isolado numa residência campesina. Sua mão de obra não é mais de tanta serventia aos donos da terra e as paisagens estão sendo desoladas pelo avanço das plantações de soja.
Segundo a revista Variety o filme é um verdadeiro neo-western, o que não foge muito da verdade, já que a obra possui ingredientes familiares que moldam o gênero a décadas, mas não escondendo um teor mais sombrio e pesado na medida certa. O filme começa de uma forma inquietante, onde ouvimos os gritos dos bovinos sendo massacrados e nos dando uma dimensão maior do horror que não é visto, porém, sentimos por dentro. É nesse cenário peculiar que temos então Raúl, do qual procura o seu lugar neste cenário que ele começa a desconhecer, já que os ventos da mudança ocorrem fortes e fazendo com que ele não saiba ao certo onde parar.
Giovani Borba procura criar através do seu protagonista um reflexo sobre a situação do pobrecimento da população em áreas agrícolas marcadas pelo avanço da tecnologia e das desigualdades sociais. Se nas grandes cidades a luta perante os avanços e a tecnologia já é sentida algum tempo aqui o problema está bem mais embaixo, mas que já acontecia há um bom tempo. Foi-se o tempo de muitas famílias ainda viviam no interior, sendo que a maioria atualmente mora agora nas grandes cidades enquanto as terras são tomadas por donos desconhecidos e fazendo os pastos infinitos serem somente territórios de cabeças de boi que são proibidos de serem tocados.
O protagonista, por sua vez, caminha em duas direções, tanto em ajudar aqueles que saqueiam os campos, como também ficando ao lado daqueles que se dizem cidadãos do bem e que não excitam ao atirar em qualquer vulto no escuro para evitar determinado roubo. Raúl, portanto, fica vagando como um fantasma pelas redondezas, se tornando uma mera sombra de um passado mais dourado, mas que acabou desaparecendo aos poucos. Por não ser um ator profissional Hugo Noguera nos dá uma interpretação ainda mais verossímil, pois nos dá a entender que através das marcas do seu rosto possui inúmeras histórias para se contar cuja ficção vista aqui não está muito longe da verdade.
Ao mesmo tempo, Giovani Borba nos surpreende com um filme quase documental, principalmente quando a sua câmera passeia sem menor dificuldade em meio aquela sociedade do interior com poucos recursos, mas cuja sua cultura os fortalecem para continuarem existindo. Ao mesmo tempo é surpreendente o seu plano-sequência em um determinado momento da trama que ocorre na noite, sendo tremida, inquietante e nos dando uma sensação maior de realismo deslumbrante. Um momento de poucos segundos, mas que representa o potencial de um futuro cineasta autoral para dizer o mínimo.
Vencedor de 5 Kikitos e um Troféu Redentor, "Casa Vazia" é um faroeste contemplativo que se passa no sul do Brasil, mas cujo velho bang e bang não mais existe e sim pessoas comuns na sua luta pela busca de sua própria identidade.
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