Sinopse: Atormentado pela morte de seu único filho, Hamnet, o dramaturgo William Shakespeare luta para consertar relações desfeitas com sua esposa e filhas. Mas, ao fazê-lo, é forçado a analisar suas falhas como marido e pai.
Kenneth Branagh vive o que talvez seja o melhor momento de sua carreira, tanto na direção como na atuação. No primeiro caso, por exemplo, ele veio a ganhar neste ano um Oscar de melhor Roteiro Original pelo seu incrível trabalho por "Belfast"(2022) e logo em seguida dando continuidade ao universo literário de Agatha Christie no filme "A Morte no Nilo" (2022). Com relação a literatura, Branagh possui uma predileção pelas obras de William Shakespeare e tendo conseguindo o feito de levar algumas adaptações para o cinema.
Em 1989 ele dirigiu e atuou na produção "Henrique V", mas não satisfeito ele conseguiu dirigir o que talvez seja uma de suas maiores produções que foi "Hamlet" (1996). De lá pra cá o realizador fez de tudo um pouco, ao ponto de até mesmo dirigir alguns blockbusters para Hollywood como no caso de "Thor" (2011), mas jamais se esquecendo do seu namoro shakespeariano. Por conta disso, não é de se espantar ao velo dirigindo e atuando em "A Pura Verdade" (2018), filme que retrata os últimos anos da vida de William Shakespeare e do qual revela histórias até mesmo surpreendentes.
A trama começa logo após o desastroso incêndio no The Globe, onde o célebre escritor William Shakespeare decide se aposentar e retorna para Stratford, sua cidade natal. A volta para o ambiente da sua infância conturbada o remete a profundas reflexões sobre as relações familiares estabelecidas ao longo de sua vida. O dramaturgo relembra da morte de seu filho de apenas onze anos e questiona seus erros e acertos no desempenho do papel de pai e marido em meio ao frenesi do seu sucesso.
Ao retratar e interpretar o ilustre escritor, Kenneth Branagh faz com o maior carinho e cuidado a todo momento, mas ao mesmo tempo passando para nós o lado mais humano daquela pessoa e que não escondia as suas mais profundas falhas. Ao retratar a sua fase de ainda luto pela perda do seu filho, o realizador constrói para nós a imagem de um Shakespeare lutando contra os seus próprios demônios e tentando compreender o seu caminho e seu papel dentro de sua própria família. Neste último caso, por exemplo, ele não foge de certos atritos, desde a sua reaproximação com a sua esposa, interpretada pela sempre competente Judi Dench, como também a falta de carinho pelas suas filhas, em especial a personagem Judith e que é interpretada pela jovem atriz Kathryn Wilder.
Vale destacar que o filme explora o papel das mulheres daqueles tempos longínquos através da esposa e das filhas do escritor. Em tempos em que o patriarcado era a força dominante de tempos mais conservadores, não é de se estranhar, por exemplo, que muitos talentos femininos foram silenciados unicamente por serem mulheres e sendo que a maioria eram esquecidas através da história. Um fato que é, infelizmente, triste de ser constatado e que se aqui já nos choca isso é ainda mais potencializado no filme "Mary Shelley" (2017) do qual eu também recomendo.
Tecnicamente o filme é um outro ponto positivo da obra como um todo, já que tanto a sua fotografia como a edição de arte parecem que foram extraídas de alguma pintura daquela época. A própria figura de Shakespeare, por exemplo, construída pelo Kenneth Branagh remete as inúmeras pinturas que retrataram o escritor ao longo dos séculos, sendo que o diretor e ator está quase irreconhecível na sua maquiagem simples, porém, mais do que eficaz. Vale destacar também as lentes grande-angulares extremas nos primeiros minutos de projeção do filme, ao fazer de Shakespeare em cena algo quase monumental, mas não escondendo a sua pior fase da vida.
Neste último caso, o as lembranças do filho e dos motivos que o levaram a sua morte são algo que são dissecados gradualmente ao longo da trama. Se por um momento achamos que tudo foi colocado na mesa sobre o assunto, eis que o ato final revela algo surpreendente e sintetizando ainda mais o quanto era pesado o fardo de algumas pessoas daqueles tempos em tentar agradar ou até mesmo superar o seu ente querido ao invés de seguir o seu próprio rumo. Curiosamente, antes de eu assistir ao filme, eu tive conhecimento do filho de Shakespeare na clássica HQ "Sandman - Sonhos de Uma Noite de Verão" e que poderá ser adaptada pela Netflix muito em breve.
Com uma ilustre participação monumental do veterano Ian McKellen, "A Pura Verdade" é visão delicada, porém, cheia de riqueza sobre um dos maiores dramaturgos do mundo e que somente Kenneth Branagh poderia fazer com tamanho carinho.
Onde Assistir: Netflix.
Faça parte:
Facebook: www.facebook.com/ccpa1948
Nenhum comentário:
Postar um comentário