Sinopse: O escritor James
Baldwin escreveu uma carta para o seu agente sobre o seu mais recente projeto:
terminar o livro Remember This House, que relata a vida e morte de alguns dos
amigos do escritor, como Medgar Evers, Malcolm X e Martin Luther King Junior.
Com sua morte, em 1987, o manuscrito inacabado foi confiado ao diretor Raoul
Peck.
Por mais que a “Era
de Ouro do Cinema” represente o melhor da sétima arte americana, sempre me
incomodei com o fato de muitos daqueles filmes (com exceção de Vinhas da Ira de
John Ford) não retratassem a verdadeira realidade do período, mas sim uma
fantasia plástica e vendida para todos que vivessem por lá e que comprassem
essa ideia cegamente. “A terra da liberdade”, ou “da oportunidade”, era vendida
a exaustão, tanto no cinema como na TV, mas camuflando o lado mais cru sobre o
que realmente acontecia nas ruas, principalmente nas décadas de 60 e 70. Em Eu
Não Sou Seu Negro, o lado plástico dessa fantasia é posta em cheque, quando o
documentário solta na tela a realidade dura de um negro que vive em numa
sociedade que se diz livre, mas que vale somente para as pessoas belas, de pele
clara e que são de acordo com a realidade plástica que é vendida para eles pela
mídia.
Dirigido por Raoul
Peck, acompanhamos uma trama em narração off (voz de Samuel Le Jackson), onde ouvimos
as palavras que haviam sido escritas pelo escritor James Baldwin, cujo o seu
manuscrito era para ter se tornado o seu mais novo livro em solo americano e
que relataria eventos fatídicos do qual ele próprio testemunhou. Vitima de câncer
em 1987, Baldwin não viria o seu livro ganhar a luz do dia, mas o seu manuscrito
acabou parando nas mãos de Raol Peck, sendo que o cineasta já era um grande fã
do escritor quando ele havia lido o livro The Fire Next e que, segundo ele,
mudaria a sua vida. Com o manuscrito em mãos, Peck não só joga as palavras de
Baldwin na tela, como também faz com que elas se casem com registros históricos
de um período onde os EUA viviam em protestos pelos direitos civis e que a
terra de liberdade só se encontrava em palavras, mas não nas ruas.
Vivendo
na França, Baldwin decidiu retornar para os EUA quando a comunidade negra
começou a sair às ruas e protestar pelos seus direitos e viverem como iguais ao
lado dos brancos. Como observador, o escritor testemunhou avanços, como no caso
de uma jovem negra se tornando a primeira a ir numa escola formada por brancos,
mas também retrocessos, como, por exemplo, vendo a mesma aluna negra sendo hostilizada
por jovens brancos que se dizem donos da terra onde eles pisam. No decorrer de
sua encruzilhada, Baldwin foi conhecendo os que viriam a ser seus amigos, sendo
justamente Medgar
Evers, Malcolm X e Martin Luther King Junior, sendo homens com ideias diferentes,
mas que no fim da trincheira começaram a lutar pelo mesmo ideal.
Num trabalho de quase
dez anos, Raol Peck conseguiu material de arquivos valiosos, cujas fotos, cenas
de vídeo e depoimentos sintetizam um período onde a sociedade americana era praticamente
dividida unicamente pela diferença da cor da pele e gerando então protestos, prisões,
mortes e revelando a verdadeira cara intolerante e hipócrita dos homens brancos
da América. É assustador, por exemplo, ver cenas de pessoas da época pregando a
liberdade, mas diziam que, a ideia da união das raças, vinha de comunistas e
que desejavam a ruína do povo americano. É um momento significativo e que ecoa nos
dias de hoje, principalmente aqui no Brasil, onde a guerra entre as classes
devido aos últimos eventos da política colocam para fora um grau de intolerância
em pleno século 21.
Mas o ápice do filme se
encontra nos momentos em que James Baldwin surge em cena. Com cenas de arquivos,
onde o escritor deu palestras e entrevistas pela TV, Baldwin passa um olhar doce,
mas que não esconde as marcas da dor, não física, mas emocional, por testemunhar
os horrores que o preconceito causou, não só contra a sua pessoa, como também de
pessoas próximas a ele. Ao testemunhar a queda de Medgar Evers, Malcolm X e
Martin Luther King Junior, Baldwin se vê numa encruzilhada como observador, crítico,
talvez um tanto cético, mas que no fundo não perde as esperanças por um futuro
melhor.
Um dos melhores
momentos do documentário, por exemplo, é dele cita em uma palestra a possibilidade
de que em quarenta anos, mesmo com a ideia sendo remota para aquele período, de
que um negro assumisse a presidência dos EUA. Se estivesse vivo, o escritor com
certeza ficaria maravilhado se tivesse testemunhado Barack Obama assumindo a presidência
em 2009, mas ao mesmo tempo, se entristecendo ao ver Donald Trump assumindo
posteriormente e soltando discurso retrógrado e intolerante. Sendo assim, o
documentário de Raol Peck é um retrato de um passado nebuloso, mas que,
infelizmente, certas mazelas daquele período ainda persistem em sobreviver nos
dias de hoje.
Assim
como o recente 13ª Emenda, Eu não sou o seu negro é um filme obrigatório para
ser visto e revisto, independente de sua cor, crença ou partido político.
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