Sinopse: O escritor Guima
tem prazo para entregar um livro. Mas ele não consegue trabalhar por causa do
intenso calor de Salvador. Ele sente medo, raiva e dor por causa do calor que
vem de dentro e de fora. Tudo piora quando o ar condicionado da casa pifa e ele
precisa desesperadamente de um novo aparelho.
Mesmo num calor
escaldante, o verão é a estação associada às férias e praias no Brasil. Porém,
o trabalhador, seja ele braçal ou intelectual, sofre com o calor infernal, da
qual, por vezes, pode causar delírios, principalmente na falta de recursos ou
no nascimento do estresse vindo da própria rotina. Tropykaos de Daniel Lisboa, em seu primeiro
projeto como diretor realiza algo em torno disso e, mesmo com trama se passando
em Salvador/Bahia, cujo calor alto é rotineiro, é fácil nos identificarmos, pois
o calor sócio – climático nos visita sem aviso e nos faz botar para fora o
nosso pessoal conflito.
Uma das ideias mais
criativas que Lisboa inseriu na trama é exatamente essa: refletir sobre o
direito do personagem principal pelo ar condicionado para sair do seu sufoco físico
e mental, do qual o calor infernal pode causar, se tornando, então, uma síntese
dos direitos políticos frente a um governo corrupto e que trata o seu cidadão
com desdém. Embora o filme não se posicione explicitamente sobre qualquer causa
dos males contemporâneos, é muito mais interessante o retrato caricato e
crítico contra a mídia que tenta manipular o cidadão comum por meio de um
jornal sensacionalista em busca de somente audiência.
Mas independente de
qual forma de mídia, somos atingidos por propagandas desenfreadas, capitalistas
e se criando da vida do dia a dia uma realidade plástica, mas pronta para implodir.
O carnaval, por exemplo, se torna uma válvula de escape, para o cidadão comum saciar
as suas necessidades, mesmo que de uma forma passageira, assim como alienação
pelo futebol. Não é a toa que o protagonista se encontra num estado
conflituoso, ao receber um valor adiantado pelo governo para entregar um
trabalho de abertura das festas, mas se não concluí-lo, terá que devolver o
dinheiro e o calor, então, se torna o seu calvário.
Daniel Lisboa consegue com
poucos recursos elaborar um retrato da queda física e mental do protagonista,
do qual é defendido por uma interpretação assombrosa do ator Gabriel Pardal
(Futuro Junho). Essa tensão da trama se cria um verdadeiro suspense psicológico,
onde o sol se torna uma espécie de olho maligno, pronto para deixar o
protagonista em total desequilíbrio. A fotografia, aliás, se torna um dos
pontos altos da produção, pois mesmo num cenário cheio de luz, as sombras se
tornam um lugar acolhedor devido ao extremo calor.
Contudo, embora Gabriel
Pardal seja a alma do filme, é Manu Santiago que rouba a cena ao interpretar a
namorada dele. Sua personagem surge de forma discreta, mas se destacando ao
inserir poesia em suas palavras e questionando situações sobre a moral e os
bons costumes contemporâneos: a cena em que ela enfrenta um machista na rua, mesmo
num curto espaço de tempo, é um dos melhores momentos do longa.
Dando ares de um cinema
autoral, Daniel Lisboa aponta para um cinema perfeccionista, onde as cenas se
casam com versos poéticos e reflexivos. As tomadas do apartamento do
protagonista, por exemplo, mesmo sendo um refugio se tornam claustrofóbicas
quando o ar condicionado do local se torna ausente e tornando o seu buraco um
refugio, mesmo com o sol forte no lado de fora atingindo. Os minutos finais são
puramente filosóficos, onde tiremos nossas próprias conclusões perante uma situação
inverossímil, mas ao mesmo tempo, fazendo todo o sentido.
Tropyakos é mais do que um
filme que demonstra o fortalecimento da “nova onda do cinema baiano”, como também
sintetiza o lado saturado do homem perante o capitalismo desenfreado desse
mundo contemporâneo.
Onde assistir:
Cinebancários: R. Gen. Câmara, 424 - Centro Histórico, Porto Alegre. Horário:
15horas.
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