Nos dias 26 e 28/Março; 02 e
03/Abril, estarei participando do curso "O que é um Documentário?",
criado pelo Cena Um e ministrado pelo jornalista Rafael Valles. Enquanto os
dias da atividade não chegam, por aqui, estarei postando sobre últimos documentários
nacionais e internacionais que eu assisti nos últimos anos.
“Anna Pavlova Vive em Berlim'
Sinopse: Perdida num limiar de
insanidade e lucidez poética, a "party queen" russa Anna Pavlova
perambula pelas ruas de Berlim em uma crise de identidade.
O subtítulo acima faz uma referencia
a uma das principais frases da protagonista, ditas para o cineasta que fica
atrás dela o tempo todo durante quatro meses de filmagens. A frase pode ser
muito bem usada como exemplo do que está por vir na tela, pois o jovem cineasta
Theo Solnik segue a jornada de dias e noites da jovem russa amalucada nas ruas
de Berlim, mas jamais se intromete em suas aventuras onde tudo pode então
acontecer. Com o objetivo de mostrar o lado utópico desse clima constante
felicidade, que aparece ser comum em Berlim, “uma cidade onde é possível viver
com pouco dinheiro e se divertir muito”, segundo as próprias palavras do
cineasta.
Com essa intenção, Solnik pega
carona com Ana nas ruas da cidade, onde tudo que vemos na tela nada é ensaiado,
sendo tudo bem cru, realista, por vezes deprimente, mas não menos que
espetacular. A bela fotografia em preto e branco, aliás, se casa muito bem com
os momentos, tanto sombrios da protagonista, como também os momentos de muita
luz e vida que ela passa para a câmera. Além de claro servir muito bem em
mostrar um lado um tanto obscuro da cidade, que por vezes, de nada lembra as
belas imagens dos cartões postais que tantos os alemães vendem por lá. Muito
embora ajam momentos de mais pura beleza, principalmente quando surgem as
verdadeiras pessoas naquelas ruas, e tornam elas muito mais interessantes.
Mas embora a fotografia, montagem e
á idéia principal que o cineasta quis passar, tenham se cruzado no momento
certo e na hora certa para a criação desse filme, nada disso funcionaria se
não fosse pela energia magnética de sua protagonista. Ao assistir Ana na tela,
imediatamente me identifiquei com ela, pois ela é uma jovem, cheia de vida e
que pretende (a todo custo) viver ao máximo. Essa característica via sempre aos
montes quando era mais jovem, sendo que me lembrou bastante umas colegas de
escola, mas elas não tinham essa força tão destrutiva como à dela, na qual, com
certeza ninguém conseguiria sempre acompanhar suas aventuras naquelas ruas.
Existem momentos, inclusive, que Ana para na frente da câmera, e passa tamanha
força em seus olhos, que cria um verdadeiro contraste, se comparado nos
momentos no qual seu corpo se entrega a bebedeiras e drogas, mesmo ela estando
consciente que tais fraquezas são prejudiciais a ela. Embora pequena, é uma
verdadeira entidade imprevisível, onde ela se arrisca a noite ao falar mal e
cuspir em uma pessoa de uma danceteria em que ela estava devendo dinheiro.
Momento esse, aliás, um dos mais tensos, pois nada daquilo é armado, onde até
mesmo Theo, por pouco não é agredido.
São esses momentos dela que nos
fazem ficar tão fascinados pela sua pessoa, que até chegamos a duvidar em
certos momentos, se aquilo tudo foi realmente real. Não é a toa que a própria
Ana Pavlova foi mencionada em alguns prêmios de melhor atriz no mundo a fora,
mesmo ela não estando atuando em momento algum na tela, pois ela é aquilo e
isso é o que mais fascina. Sendo que não sentimos tanta energia de vida e
naturalidade em outras pessoas, quando as vemos atuando como elas mesmas em
determinados documentários. Pelo menos no meu caso, não me lembro de algo
parecido como isso que eu vi na tela.
Com um ato final em que Ana revela novas
camadas de sua personalidade para a câmera, o filme deixa no ar certas
duvidas, sobre o futuro da protagonista e o que é mais importante, nos faz
desejar em não querer largar do ombro da protagonista, e desejar passar mais
algumas noites com ela nas ruas de Berlim.
NOTA: Infelizmente o filme teve
somente duas sessões na Usina do Gasômetro, na mostra de Documentários Artdoc.,
que complementa o seminário recém realizado RODA-Rodada de Debates sobre a
Arte, que abrigou na capital encontros entre artistas, críticos e curadores.
Tive o maior prazer de participar de uma das sessões, com a participação do
próprio cineasta Theo Solnik, que contou em um debate após a sessão, sua
experiência de rodar esse filme e do seu dia a dia junto com Ana, nos quatro
meses de filmagem.
Para um
filme cheio de qualidades (e um dos melhores que vi desse ano), merece uma
segunda vinda em nossa capital.