Sinopse: Em Turim, em 3 de
janeiro de 1889, o filósofo Friedrich Nietzsche sai do imóvel da Via Carlo
Albert, número 6. Não muito longe dali, o condutor de uma carruagem de aluguel
está tendo problemas com um cavalo teimoso. O cavalo se recusa a sair do lugar,
o que faz com que o condutor, apressado, perca a paciência e comece a
chicoteá-lo. Nietzsche aparece no meio da multidão e põe fim à cena brutal,
abraçando o pescoço do animal, em prantos. De volta à sua casa, Nietzsche então
permanece imóvel e em silêncio durante dois dias estendido em um sofá, até que pronuncia
as definitivas palavras finais (“Mãe, eu sou um idiota”) e vive por mais dez
anos, mudo e demente, sendo cuidado por sua mãe e suas irmãs. Não se sabe que
fim levou o cavalo.
Será mesmo O Cavalo de
Turim o filme derradeiro do húngaro Béla Tarr? Oxalá não, que o Cinema precisa
dele. Mas se assim for terá sido este o seu melhor testamento ao Cinema. Um
filme que é um grandioso épico, que nos dá conta da vã e inglória luta pela sobrevivência
que um pai, uma filha e um cavalo de carga, teimam em levar por diante, contra,
simplesmente, a ira de Deus pelo que os homens de mal fizeram. Um filme belo
como poucos, feito do silêncio, que vale ouro, das personagens, e do imenso
barulho do vento e do pó que tudo sufoca. Feito também de um
ritornello musical, onipresente, mas também feito e sempre daquela
extraordinária fotografia a preto e branco, que praticamente só os maiores do
Mudo nos souberam dar (tirar). Um filme que remete imediatamente para o
universo de Dovjenko e para a sua, nossa, Terra. Os grandes-planos, as mesmas
cenas fotografadas de ângulos diferente. Os pormenores no detalhe, de um olhar
(o pai que interroga a filha com o olhar), de uma encenação (o pai deitado,
morto?). A mesma batata comida de forma diferente. O poço que seca sem
explicação, as lamparinas que não deitam luz apesar de cheias. Por fim a
escuridão, sem hipótese de recurso. E a morte. Nada que o cavalo não tivesse
pressentido antes (a recusa em trabalhar, em comer, o semi-cerrar dos olhos),
nada que o vizinho não tivesse avisado a pai e filha, e nada a que os ciganos
não fugissem (pérolas, a referência “não queres vir conosco para a América?”,
seguida da oferta da Bíblia à filha). O melhor plano? O rosto da filha à
janela, entre cá e lá, de que Lang teria gostado. Melhor seqüência? A inicial,
em que cavalo e camponês, regressando a casa, em esforço, são acompanhados pela
câmara ondulando, ao sabor do vento, também ela em esforço, abrindo e fechando
o diafragma, nunca parando, conseguindo durante largos minutos a proeza de
nunca nos cansar, filmando que está as mesmas personagens, sempre, mas sempre
de forma diferente, ora aproximando-se, ora afastando-se, subindo e descendo,
avançando, recuando. É uma seqüência sublime, de um filme tão sublime quanto
pessimista, crú e conformista. É o Zaratustra de Nietzche, só que em vez de 10
anos, em 6 dias. E Deus descansou ao sétimo dia… ou terá Ele morrido?
Mais informações sobre a
mostra de Béla Tarr, você encontra na pagina da sala P.F Gastal clicando aqui.
2 comentários:
fotografia brilhante!
Foi uma das coisas que mais me chamou atenção no filme.
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