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Sapucaia do Sul/Porto Alegre, RS, Brazil
Sócio e divulgador do Clube de Cinema de Porto Alegre, frequentador dos cursos do Cine Um (tendo já mais de 100 certificados) e ministrante do curso Christopher Nolan - A Representação da Realidade. Já fui colaborador de sites como A Hora do Cinema, Cinema Sem Frescura, Cinema e Movimento, Cinesofia e Teoria Geek. Sou uma pessoa fanática pelo cinema, HQ, Livros, música clássica, contemporânea, mas acima de tudo pela 7ª arte. Me acompanhem no meu: Twitter: @cinemaanosluz Facebook: Marcelo Castro Moraes ou me escrevam para marcelojs1@outlook.com ou beniciodeltoroster@gmail.com

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quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Cine Especial: Neorrealismo Italiano: Parte 8


Nos dias 24 e 25 de novembro, estarei participando do curso Neorrealismo Italiano, criado pelo Cena Um e ministrado  pelo jornalista Franthiesco Ballerini. Enquanto os dois dias não chegam, estarei por aqui escrevendo sobre os principais filmes, desse movimento que é considerado um dos mais importantes da historia do cinema mundial.
  
A Terra Treme
  
Sinopse: Logo após a Segunda Guerra, num pequeno porto da Catania, uma família de pescadores tenta escapar dos patrões (canotieri) que os exploram. Hipotecam a casa para se estabelecerem por conta própria, mas acabam arruinados.

No elenco, estão exclusivamente atores não profissionais. Aliás, Visconti convidou os próprios moradores de Trezza. Os créditos iniciais desta obra, em vez de listar o nome dos intérpretes, anuncia apenas que o elenco é formado por “pescadores sicilianos”. Até porque seria impossível imaginar aquela pobre gente interpretando outra coisa.
Em Trezza, os habitantes são castigados pelo sol, pela areia, pelo vento. As mulheres estão sempre de preto, ocupando-se dos afazeres domésticos, procuradas pelos namorados como uma espécie de “refúgio sentimental”. De dia, os homens preparam os barcos e as redes; à noite, saem para trabalhar. Lá, até as crianças ajudam no sustento da casa, pescando com os seus familiares ou vendendo frutas de porta em porta. Uma vida dura e sofrida.
Visconti quis apontar em A Terra Treme um ciclo de desigualdade e injustiça que perdura até hoje em diversos países africanos, latino-americanos e asiáticos (e até, sim, em nações desenvolvidas): a exploração dos pobres pelos ricos. Os trabalhadores do mar, à beira da miséria, são obrigados a vender o seu pescado aos comerciantes por preços baixíssimos. Obviamente, isso ajuda na prosperidade dos comerciantes, que revendem a mercadoria em outras cidades a preços elevados, mas não altera em nada a vida dos pescadores... Um deles resolve se rebeliar. O herói chama-se ‘Ntoni (abreviação de Antonino) Valastro.
Assim como faria em Rocco e Seus Irmãos anos mais tarde (contudo com menos brilho), Visconti toca num assunto delicado: a desintegração de uma família devido à escassez de recursos. Coca, um dos irmãos Valastro, foge da vila aparentemente para trabalhar com tráfico de cigarros (basta lembrar que muitos clãs de mafiosos e traficantes surgiram naquela mesma ilha italiana durante a primeira metade de século 20).
A Terra Treme promete deixar muita gente com um nó na garganta, assim como quase todo o bom filme produzido em Itália entre as décadas de 40 e 60. A Terra Treme e as demais fitas neo-realistas daquele período, como Europa ’51, Umberto D., etc., são muito pesadas e sérias para qualquer tipo de público. Contudo, são testemunhos de uma época que não pode ser esquecida.
  
O Leopardo

Sinopse: Sicília, durante o período do "Risorgimento", o conturbado processo de unificação italiana. O príncipe Don Fabrizio Salina (Burt Lancaster) testemunha a decadência da nobreza e a ascensão da burguesia, lutando para manter seus valores em meio a fortes contradições políticas.

Em 1963, data do filme, estamos num ano em que se pode finalmente discutir o cinema italiano como dos mais importantes no mundo inteiro. Após a revitalização do cinema que foi o neo-realismo, surgiram ao longo da década de 50, e nos primeiros anos da seguinte, várias fitas e realizadores-autores que se impuseram como verdadeiros vanguardistas do cinema ou excelentes contadores de histórias, colados à tradição italiana. Aqui encontramos nomes como Michelangelo Antonioni e a sua fantástica trilogia L'Avventura (1960), La Notte (1961) e L'Eclisse (1962), Federico Fellini com I Vitelloni (1953), La Strada (1954), e sobretudo La Dolce Vita (1960) e Otto e Mezzo (1963), Roberto Rossellini e Vittorio de Sica, mestres do neo-realismo, já a servirem de inspiração, e finalmente Luchino Visconti, com obras como Senso (1954), Le Notte Bianche (1957) e Rocco e i suoi Fratelli (1960).
A obra seguinte de Visconti é exatamente Il Gattopardo, um épico de três horas sobre o momento mais marcante da história da Itália - naturalmente, a sua libertação e unificação. Ao longo do filme seguimos este evento visto pela família, e sobretudo, pelos olhos do príncipe Don Fabrizio Salina, numa interpretação fantástica de Burt Lancaster. Podemos ver como, apesar de tantas lutas, tantos gritos, tanta vontade, o essencial fica na mesma. Os nomes continuam, a essencial rotina da nobreza, como explica o genial padre Pirrone, não muda, as classes não vão acabar, as ideias são ideias, mas o povo italiano, os seus modos e tiques, e acima de tudo, o siciliano, esse, não quer mudança, ou melhor, quer mudar tudo para ficar tudo na mesma - escondidos no seu cantinho, lamentando-se diariamente pela tarefa inevitável do viver pesado.
E pela história de um país, das suas personagens e cenas típicas genialmente interpretadas, vemos cenários fabulosos, dignos da arte mais impressionista ou da arte mais ricamente realista. Desde o forrado da sala, aos vestidos das senhoras, aos pratos servidos, à disposição de cada um pelo ecrã scope, cada plano aparece-nos como um quadro eterno, uma imagem digna de um sonho, vindo da maior sensibilidade do belo de todas - a de Visconti.
Mesmo os choques encaixam-se na fluidez da filmagem, as aparições geniais como a de Don Calogero Sedara, novo burguês tosco pinto-calçudo, que se diverte ao calcular tanta riqueza antiga que o rodeia por equivalências em hectares e propriedades, a entrada da fabulosa Angelica, Claudia Cardinale no seu papel mais carnal e fatal, ou as barulhentas tropas e o seu general de botas por dentro de um último baile da mais alta e exclusiva classe. A mesma atriz é protagonista, com Alain Delon, de uma das cenas mais eróticas da história do cinema, ao se "passear", com o seu noivo, pela casa abandonada, já demasiadamente vazia para poder controlar tanto desejo.
E no fim, o que temos, é a morte do Leopardo, genialmente filmada por Visconti através, desta vez, de um verdadeiro quadro, e de uma valsa, a pontuar o auge da decadência mais bela do cinema. É ele que segue sozinho por entre os tiros de uma guerra inacabada, que ele próprio aceitou naturalmente, uma guerra que já não travará totalmente, nem precisará. Segue o seu sobrinho (Alain Delon), financeiramente equivalente a uma suposta classe média, que protege a sua noiva burguesa, bela, e rica (Claudia Cardiale) dos brutos sons vindos do exterior do seu coche.


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