Sinopse: Na Chicago de 1927, a protagonista interpretada por Davis trava um tenso duelo com executivos brancos e com um dos membros de sua banda formada por negros, durante uma sessão de gravação em estúdio.
A união do cinema com o teatro tende a gerar um filme sem personalidade ou uma obra que desafia o talento do elenco dentro dele. "Um Limite Entre Nós" (2016), por exemplo, é baseado em uma peça de teatro, mas sabendo se expandir em sua adaptação cinematográfica e gerando assim uma pequena joia como um todo. É então que chegamos "A Voz Suprema do Blues" (2020), que segue para um mesmo caminho, onde a direção segura e atuações poderosas faz com que a obra se torne maior e cujo o palco não seria o suficiente.
Dirigido por George C. Wolfe, "A Voz Suprema do Blues" acompanha Ma Rainey (Viola Davis) em Chicago, 1927, numa sessão de gravação de álbum mergulhada em tensão entre seu ambicioso trompista Levee (Chadwick Boseman) e a gerência branca que está determinada a controlar a incontrolável "Mother of the Blues". Porém, uma conversa no local revela verdades que irão abalar a vida de todos.
Baseado na peça do vencedor do Prêmio Pulitzer, August Wilson, o diretor George C. Wolfe aproveita para expandir a ideia principal da obra já em sua abertura, onde testemunhamos uma Chicago de 1927 cheia de detalhes e rico em sua reconstituição. Ao mesmo tempo, essa abertura possui ecos do que está por vir, onde não esconde o prelúdio de um EUA em decadência e não preparada para entrar na depressão dos anos trinta. Além disso, abertura também escancara o lado hipócrita de um país que se diz terra das oportunidades, mas não para todos e principalmente para o povo negro que mais sofreu ao longo do percurso.
É aí que o elenco brilha neste quesito. Vemos personagens que lutam pelo seu dia a dia, que mantém o seu talento pela música acima de tudo, mas não obtém o retorno como esperado. O resultado é vermos personagens colocando para fora o seu passado sem glamour, onde horror vindo do homem branco se tornou o único ensino para dizer o quanto essa terra das oportunidades é gananciosa, corrupta e muito racista. O peso dessa dramaticidade não poderia ser carregado por qualquer um e é aí que dois intérpretes se sobressaem de uma forma genial.
Conhecido mundialmente pelo ótimo "Pantera Negra" (2018), Chadwick Boseman entrega o papel de sua vida, ao interpretar um jovem trompetista cheio de sonhos, mas cujo os mesmos são sempre interrompidos por aqueles que comandam o dinheiro, ou pelo seu próprio talento que não cabe o suficiente em seu único corpo. Os discursos que ele dá no vestiário onde se encontra os músicos está entre os melhores momentos do filme e cuja as suas ações imprevisíveis irão selar o seu destino. Isso tudo faz a gente somente lamentar o recente falecimento do ator e do qual o mesmo não me surpreenderia se fosse indicado ao Oscar deste ano pelo seu incrível trabalho.
Mas como se isso já não bastasse, temos também uma Viola Davis quase irreconhecível e cuja a sua personagem Ma Rainey é uma espécie de entidade da natureza da qual não pode ser controlada. Sendo pisada na vida por tudo e a todos, a personagem Ma Rainey usa a sua personalidade forte para obter os seus reais propósitos, mesmo que isso lhe faça ser abandonada em um futuro próximo. Todas as cenas da atriz são poderosíssimas, mas o seu olhar em sua última cena nos diz tudo sem nenhuma palavra e sintetizando a sua dor interior mesmo quando a própria tenta escondê-la.
"A Voz Suprema do Blues" é uma pequena jóia cinematográfica, da qual retrata uma época em que era preciso saber jogar para sobreviver, mas cujo esse jogo até hoje não encontrou o seu derradeiro fim.
Onde Assistir: Netflix.