Era uma questão de lógica que o estúdio Warner estivesse interessado em manter os seus ovos de ouro intactos, ou seja, lançar um terceiro filme com o casal da época Humphrey Bogart e Lauren Bacall. Após os sucessos "Uma Aventura na Martinica" (1944),"À Beira do Abismo" (1946) o público com certeza estava aguardando uma trama que cumprisse com as suas expectativas. Com isso, temos "Prisioneiro do Passado" (1947), filme que não é melhor e nem pior se comparado aos títulos anteriores, mas ganha pontos através do seu modo até então incomum na apresentação do personagem central.
Dirigido por Delmer Daves, o filme conta a história de Vincent Parry (Humphrey Bogart), um prisioneiro que escapa de San Quentin, pois quer provar sua inocência. Logo após a fuga ele tem que pegar uma carona, mas o motorista começa a fazer várias perguntas. Quando no rádio do carro informam a descrição de Parry este é obrigado a atacar o motorista, que fica desacordado. Vincent ainda não sabe o que fazer, até que surge Irene Jansen (Lauren Bacall), uma pintora amadora, que se oferece para levá-lo até São Francisco. Vincent fica no apartamento de Irene, que acompanhou o julgamento e nunca ficou convencida da sua culpa. Após deixar o apartamento de Irene, pois acha arriscado ficar ali, Vincent pega um táxi. Ele decide procurar um cirurgião plástico, pois Vicente precisa mudar seu rosto, que está estampado em todos os jornais.
Após assistir ao filme eu li alguns críticos dizendo que esse é o primeiro filme do qual assistimos vários minutos de cenas através da perspectiva do protagonista, ou seja, a câmera se torna olhar dele. Na verdade essa observação é um erro, pois em 1931 foi lançado a versão cinematográfica de "O Médico e o Monstro", onde o protagonista, interpretado por Fredric March, somente é apresentado alguns minutos depois, já que nestes minutos iniciais somente observamos o que ele enxerga, até o momento em que ele se olha no espelho e assim conhecemos o seu verdadeiro rosto. Porém, é preciso dar crédito a criatividade do diretor Delmer Daves na apresentação do personagem.
Por mais de meia hora somente assistimos tudo pela perspectiva do personagem de Borgart, sendo que somente ouvimos a sua voz, enquanto truques de câmera e sombras cobrem o seu rosto. Até lá, conhecemos alguns personagens importantes que irão cruzar no seu caminho, desde o caronista, como também um taxista, o cirurgião plástico e a personagem de Bacall. Pelo fato da atriz nos ser apresentada de frente temos então uma dimensão maior de sua beleza da época, sendo que os seus olhos falam por si e enchendo a tela como um todo.
Já o filme transita entre o subgênero "noir" para um filme policial convencional. Muito embora a edição permita que a obra vá mais além, principalmente em cenas em que se testa o lado psicológico do personagem central e do qual se encontra a beira da loucura. A cena em que ele adormece na mesa de cirurgia e começa a enxergar diversos rostos de pessoas que ele havia encontrado anteriormente me lembrou do clássico "Um Corpo que Cai" (1958) do mestre Alfred Hitchcock, além desse momento possuir um clima bem "Salvador Dali" que já havia sido explorado no cinema através do clássico "Quando Fala o Coração" (1945) também do mestre do suspense. Curiosamente, a trama se passa em São Franscisco, sendo cenário de diversos clássicos do cinema, como o já citado "Um Corpo que Cai".
Nota-se também que o rosto de Humphrey Bogart enfaixado devido a cirurgia para mudar o seu rosto me lembrou alguns clássicos da literatura policial e até mesmo de HQ que seriam publicadas vários anos depois. Nestes momentos me lembrou o clássico "Sin City - A Dama Fatal" de Frank Miller e um dos arcos da genial série "100 Balas de Brian Azzarello, sendo que ambos os casos os personagens centrais são obrigados a trocarem de rosto em meio a uma trama policial cabeluda. O mesmo acontece aqui com o protagonista e mesmo ele trocando o seu rosto as adversidades não diminuem ao longo da trama.
O arco final é uma verdadeira montanha russa de tensão, sendo que Humphrey Bogart, por mais que seja acusado de ter sido um verdadeiro ator canastrão ao longo da carreira, ele aqui conseguiu transmitir toda a tensão que o seu personagem estava passando, principalmente na cena em que o mesmo é interrogado em uma cafeteria. O final pode até possuir soluções fáceis para solucionar o conflito em que o personagem estava passando, mas isso não diminuiu o potencial do filme como um todo. "Prisioneiro do Passado" é, portanto, um filme a frente do seu tempo e sendo justamente por isso que talvez não tenha sido um verdadeiro sucesso.
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