John Huston pegou gosto ao trabalhar com Humphrey Bogart em "Relíquia Macabra" (1941) e, portanto, não demoraria muito para que ambos trabalhassem juntos novamente. Vieram então "Garras Amarelas" (1942), "O Tesouro de Sierra Madre" (1948) e "Uma Aventura na África" (1951). Embora esses sejam os títulos mais lembrados é preciso destacar "Paixões em Fúria" (1948), do qual possui uma grande carga de tensão psicológica dentro da trama.
A história é sobre Frank McCloud (Humphrey Bogart), que viaja para um velho hotel em Key Largo, na Flórida, para honrar a memória do seu amigo que foi morto em sua unidade durante a Segunda Guerra Mundial. A viúva do seu amigo, Nora Temple (Lauren Bacall), e o pai do soldado, James Temple (Lionel Barrymore), são responsáveis pelo hotel e o recebem calorosamente, mas os três acabam reféns de uma gangue de marginais liderada por Johnny Rocco (Edward G. Robinson), que espera a passagem de um furacão.
Em uma entrevista com Christopher Nolan, Quentin Tarantino disse que "Paixões em Fúria" foi uma inspiração para seu filme "Os Oito Odiados" (2015). Assistindo agora esse clássico percebo que realmente ele serviu de grande fonte de inspiração para que Tarantino criasse o seu faroeste e não me surpreenderia também se caso tenha servido de modelo para outros cineastas. Baseado em uma peça de teatro, boa parte da trama ocorre dentro do hotel, sendo que quanto mais a situação aperta, seja devido a gangue estar no controle, ou pelo fato de um furacão do lado de fora estar devastando tudo pelo caminho.
Vale destacar que esse foi o quarto e último filme que o casal Humphrey Bogart e Lauren Bacall trabalhariam juntos, pois embora continuassem casados na vida real cada um seguiu os seus próprios projetos ao longo dos anos, até que, infelizmente o ator veria a falecer aos 57 anos devido ao câncer no pulmão. Bacall continuaria firme e forte nos seus trabalhos e vindo somente a falecer em 2014 aos 89 anos. Neste filme, embora estejam bem em seus respectivos papeis, pode-se dizer que ambos juntos possuem menos cenas marcantes se formos comparar aos outros longas que haviam trabalhado, mas isso não diminuiu o impacto da obra como um todo.
Quem rouba a cena do filme é realmente Edward G. Robinson, ator romeno que começou a carreira já nos anos em que o cinema estava em transição entre o cinema mudo para o falado. Se destacou em papeis em que os seus personagens eram rudes e, por vezes, chefe de gangues e dentre eles se destaca "A Alma do Lobo" (1931), onde ele interpretava o mafioso Enrico Bandello. Aqui, o seu personagem é ainda mais complexo do que foi apresentado no último filme citado, sendo que ele possui uma fúria contida, mas da qual pode explodir a qualquer momento e revelando um grande desempenho.
O filme se destaca também pela presença da atriz Claire Trevor, que aqui interpreta uma ex cantora e agora amante do vilão e que aqui ela rouba a cena em que ela é forçada a cantar. Essa que é uma das cenas mais impactantes do filme, o diretor John Huston informou Claire Trevor que eles gravariam sua música naquele dia. Trevor não era uma cantora treinada e ainda não tinha ensaiado a canção. Ela também se sentiu intimidada pelos atores famosos sentados diante dela. O resultado foi uma versão hesitante, nervosa e desconfortável, exatamente o que Huston queria e sendo o suficiente para que ela levasse o Oscar de melhor atriz secundário na premiação de 1949.
O filme ganha ainda mais a nossa atenção principalmente pelo fato de que a cada minuto a tempestade lá fora piora, assim como os ânimos dos protagonistas. Curiosamente, o filme me lembrou também do clássico "Floresta Petrificada" (1936) estrelado por Bette Davis, o próprio Humphrey Bogart e cuja trama também conta sobre um local isolado e que os bandidos mantêm os personagens como reféns. Porém, é interessante observar que naquele filme Borgart era o próprio bandido, sendo até tão cruel quanto esse defendido por Edward G. Robinson e não me surpreenderia se o personagem teria servido de inspiração para o ator romeno.
O final possui minutos até mesmo reconfortante para aqueles que esperam um refresco após momentos de grande tensão. Porém, o arco final se destaca ao se tornar também claustrofóbico e cujo ápice dos eventos ocorrem dentro de um barco em que o personagem Edward G. Robinson tenta fugir com o seu contrabando. Ponto para John Huston ao filmar momentos em que sintetiza todo um clima sufocante e até mesmo indefinido com relação ao destino real dos personagens.
"Paixões em Fúria" é um filme de suspense incrível e que serviria de modelo para outros filmes que viriam a se tornarem também ótimos clássicos.
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