Nota: Filme exibido para associados no último sabádo (16/04/2022).
Sinopse: Tommaso Buscetta, o primeiro arrependido da máfia, permitiu que os juízes Falcone e Borsellino compreendessem a organização da Cosa Nostra e levassem seus líderes ao tribunal.
Existe uma infinita lista de filmes sobre a máfia dentro da história do cinema, sendo que no princípio começou apenas como filmes baratos de entretenimento dos anos 30, para mais tarde se tornar um subgênero que acabou atraindo cada vez mais o público e a crítica. No filme "O Irlandês" (2019), por exemplo, vemos a construção da máfia irlandesa, sendo ao mesmo tempo interligada pelo lado de dentro da política e tendo papel fundamental nos principais pontos da história dos EUA. "O Traidor" (2021) vai pôr um caminho ainda mais pessoal, onde a fidelidade é posta à prova em meio a alianças duvidosas e poderes que a qualquer momento irão se partirem ao meio.
Dirigido por Marco Bellocchio, o mesmo de "A Bela Que Dorme" (2013), o filme conta a história de Tommaso Buscetta (Pierfrancesco Favino), que vivia no início dos anos 80, em meio a uma guerra generalizada entre os chefes da Máfia Siciliana pelo controle do tráfico de heroína. Sendo Tommaso, um integrante de alto escalão, ele foge para se esconder no Brasil. Na Itália, os acertos de contas acontecem enquanto Buscetta assiste de longe seus filhos e irmãos sendo assassinados em Palermo, sabendo que poderá ser o próximo. Preso pela polícia brasileira e extraditado para a Itália, Buscetta toma uma decisão que irá mudar os rumos da máfia italiana: ele decide se encontrar com o Juiz Giovanni Falcone e trair o voto eterno que fez à Cosa Nostra.
Eu conheci Marco Bellocchio anos atrás através do maravilhoso "Vincere" (2009), do qual se destaca pelo seu teor épico que o diretor incrementou naquela obra e que posteriormente faria o mesmo nos seus filmes seguintes. Aqui, Bellochio cria uma super produção caprichada, da qual reconstitui as duas décadas que mostram os principais eventos da trama e aproveitando ao máximo os cenários naturais como no caso, por exemplo, o Brasil quando surge no primeiro ato. As cores quentes de uma época cheia de oportunidades vão dando lugar a cores acinzentadas e revelando tempos turbulentos para os principais personagens da trama.
Neste último caso, os personagens são diversos, sendo que cada um se tornou uma peça fundamental nesta verdadeira teia moldada por dinheiro, sangue e até mesmo influência política. Porém, o filme pertence todo a figura de Tommaso Buscetta, personagem que transita entre a fidelidade e o medo de perder a sua família. Por conta disso, a fidelidade vai, aos poucos, definhando e revelando uma outra face dessa pessoa até então desconhecida.
Pierfrancesco Favino, visto recentemente em um papel similar em "Irmãos a Italiana" (2021), carrega todo o filme nas costas, sendo que a sua atuação se sobressai principalmente nos momentos em que o seu personagem dá o seu depoimento, sendo para o juiz Falcone (Fausto Russo Alesi) ou perante ao júri em que os ânimos ficam a flor da pele. Neste último caso, isso se torna ainda mais forte principalmente com a presença dos principais acusados e fazendo de Buscetta um alvo onde será descarregado toda a raiva e ódio vinda dos mesmos.
Embora um tanto longo, o filme nos prende para sabermos sobre o destino de Buscetta, pois embora tenha se metido em uma realidade em que há consequências, o roteiro se encarrega em simpatizarmos com ele até o último minuto da trama. Aceitando as consequências dos seus atos, o destino do personagem se assemelha com a cena final de Robert De Niro no filme "O Irlandês" sendo que em ambos os casos os personagens tem a total consciência que se tornaram alvos e aguardam para alguém vir mata-los. Um destino mórbido, porém, coerente para figuras como essa que se aventuram em uma cruzada sem volta.
Com uma ótima participação de Maria Fernanda Cândido como esposa do protagonista, "O Traidor" mostra a jornada de um homem em busca da redenção, muito embora isso não faça dele um herói, mas sim somente alguém que deseja sobreviver.
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