Sinopse: Recife
1978. Com a ditadura militar ainda atuante mas mostrando sinais de esgotamento
um grupo de artistas provoca a moral estabelecida com seus espetáculos de
cabaré ensaiando a resistência política a partir do deboche. Fininha um soldado
de 18 anos do interior de Pernambuco se apaixona por Clécio dono de uma trupe
anarquista.
Hilton Lacerda saiu
consagrado nos festivais de Gramado e Rio com o seu filme Tatuagem, obra que se
tornou rapidamente uma das mais elogiadas do ano, cujo seus criadores não se importam nenhum pouco em incomodar um
publico mais conservador e hipócrita. Mas é para isso que veio Tatuagem: cutucar, incomodar e trazer um frescor de maior ousadia que por vezes faz falta
no nosso cinema atual. Antigamente (anos 70 e 80) sexo e outros temas pesados
eram bem mais vistos, e olha que estamos falando de um período que ainda
existia a Ditadura que ditava as regras da cultura.
Esse clima mais sujo
e ousado de antigamente começou a renascer a partir de obras como Amarelo
Manga, Febre do Rato e Baixio das Bestas, que embora sejam dirigidos pelo
genial Claudio Assis, as tramas foram roteirizadas por Hilton Lacerda, que
agora estréia com estilo neste filme que deu o que falar no festival de cinema gaúcho. Embora lembre alguns elementos vistos nos filmes citados
(principalmente Febre de Rato), Lacerda optou por criar um clima mais
romântico, mas não menos sensual e em meio a ditadura do final dos anos 70. Tatuagem
acompanha um grupo de artistas itinerantes que se apresenta de maneira ousada,
sendo boa parte deles travestidos e formados por gays, cujo líder do grupo
denominado Chão de Estrelas é Clécio, vivido por Irandhir Santos. Em meio
àquele mundo estranho para os olhos da grande maioria, surge um jovem soldado
que se torna á menina dos olhos de Clécio, Fininha, vivido por Jesuíta Barbosa.
Não é preciso ser
gênio para saber que ambos irão se apaixonar, mas que acabaram vivendo um
conflito, com o fato de que Fininha possa ser ou não um espião infiltrado no
grupo de artistas. Curiosamente, Clécio tem um filho com uma mulher e ambos
continuam sendo amigos, além do primogênito gostar de assistir os shows que
rolam a noite. Sinceramente, não me lembro de cenas tão ousadas de sexo entre
homossexuais do nosso cinema, desde Madame Satã e também lembra bastante as
primeiras obras de Pedro Almodóvar como A Lei do Desejo.
Acima de tudo, o
filme bate na tecla sobre questões liberdade, direito de ir e vir e expressar a
opinião dos personagens através da arte da interpretação. Talvez a passagem que
melhor represente essas caracteriza, é no momento da cena Polka do Cu que faz
parte da peça deles. Chocante, engraçada e corajosa, diga-se de passagem.
Fora isso, o filme é
recheado de boa musica que embala os momentos românticos da trama: em “Volta”,
cantada por Johnny Hooker; a versão de Esse Cara, de Caetano Veloso, cantada
por Irandhir; A Noite de Meu Bem, de Dolores Duran, tocada na primeira dança do
casal de protagonistas, entre outras canções selecionadas e/ou compostas por DJ
Dolores.
Como não poderia ser
diferente, Irandhir Santos rouba o filme como um todo e coloca muito bem no seu
bolso. Interprete de imenso talento, Santos, havia chamado atenção em Tropa de
Elite 2, se consagrado em Febre do Rato e mais recentemente interpretando um
misterioso vigilante no já clássico O Som ao Redor.
Apesar de ser um
filme fora do convencional, Tatuagem é uma produção que merece ser vista por todos,
pois embora seja um retrato de um grupo de pessoas perante aos últimos anos da
sombra da Ditadura, não há como não comparar com a situação de algumas partes
de nossa política conservadora atual, que possui uma mentalidade atrasada e
muito falsamente correta.
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