Com a chegada do aguardado filme Azul
é a cor mais quente nos cinemas brasileiros, vamos nos relembrar um pouco dos principais grandes
vencedores de anos anteriores no Festival de Cinema de Cannes e que levaram a cobiçada
Palma de Ouro.
A DOCE VIDA(1960)
Sinopse: Roma, início dos anos
60. O jornalista Marcello (Marcello Mastroianni em desempenho memorável) vive
entre as celebridades, ricos e fotógrafos que lotam a badalada Via Veneto.
Neste mundo marcado pelas aparências e por um vazio existencial, freqüenta
festas, conhece os tipos mais extravagantes e descobre um novo sentido para a
vida
O filme “La Dolce
Vita”, do famoso Federico Fellini é um clássico na história do cinema: além de
ter se tornado quase um sinônimo da Itália, um neologismo que nos remete a uma
época na rua Veneto em Roma, entre mesas dos cafés e os paparazzi a procura da
estrela da vez para ser fotografada.
Mas no começo o filme
não foi um sucesso, aliás: na estréia o diretor e os atores foram vaiados e
insultados pelo público, para o Marcello Mastroianni, por exemplo, um
espectador gritou “Vilão, vagabundo, comunista!”, outro até cuspiu no Federico
Fellini. Era o dia 5 de fevereiro de 1960, no cinema Capitol, em Milão.
Um filme que naquela
época era visionário, inimaginável, sem moralismo, só podia escandalizar as
hierarquias vaticanas e moralistas. Na Itália o ‘Osservatore Romano’, o jornal
da Santa Sé se posicionou contra o filme e o diretor, na Holanda, por exemplo,
foi censurado, apesar das bilheterias estarem arrecadando uma quantia recorde
em toda a Europa.
Na verdade, A Doce
Vida, não tinha mais nada de estranho: eram apenas sonhos em celulóides.
VIRIDIANA(1961)
Sinopse: Pouco antes
de ser ordenada freira, Viridiana faz uma visita ao seu solitário tio, que está
à beira da morte. O homem, pervertido e obcecado pela sua beleza, tenta
seduzi-la de todas as formas, antes de morrer repentinamente. Com a sua morte,
acaba desistindo de ser freira, passando a morar na casa deixada pelo tio.
Decide transformá-la em um albergue, movida pelo seu sentimento cristão de
piedade e solidariedade, mas os mendigos que lá abriga, acabam lhe mostrando as
verdadeiras facetas dos seres humanos.
Sempre dizendo que
era ateu “graças a Deus" Buñuel não poupou em nada em escandalizar com
esse filme na época. No governo Franco na Espanha, o filme foi proibido por
vários anos, sendo somente exibido em 1977, dois anos após a morte de Franco.
No geral, é um filme sobre a quebra de valores perante as tentativas
frustradas na ajuda ao próximo, que aqui na visão do diretor, não rende
exatamente frutos, principalmente se for seguindo as leis de Deus.
Apesar de tudo, a
polêmica não foi o suficiente para o filme deixar de ser um grande sucesso de critica
na época e ganhar a Palma de Ouro em Cannes naquele período. Destaco a ótimo
desempenho de Silvia Pinal como Viridiana.
O Leopardo(1963)
Sinopse: Sicília,
durante o período do "Risorgimento", o conturbado processo de
unificação italiana. O príncipe Don Fabrizio Salina (Burt Lancaster) testemunha
a decadência da nobreza e a ascensão da burguesia, lutando para manter seus
valores em meio a fortes contradições políticas.
Em 1963, data do
filme, estamos num ano em que se pode finalmente discutir o cinema italiano
como dos mais importantes no mundo inteiro. Após a revitalização do cinema que
foi o neo-realismo, surgiram ao longo da década de 50, e nos primeiros anos da
seguinte, várias fitas e realizadores-autores que se impuseram como verdadeiros
vanguardistas do cinema ou excelentes contadores de histórias, colados à
tradição italiana. Aqui encontramos nomes como Michelangelo Antonioni e a sua
fantástica trilogia L'Avventura (1960), La Notte (1961) e L'Eclisse (1962),
Federico Fellini com I Vitelloni (1953), La Strada (1954), e sobretudo La Dolce
Vita (1960) e Otto e Mezzo (1963), Roberto Rossellini e Vittorio de Sica,
mestres do neo-realismo, já a servirem de inspiração, e finalmente Luchino
Visconti, com obras como Senso (1954), Le Notte Bianche (1957) e Rocco e i suoi
Fratelli (1960).
A obra seguinte de
Visconti é exatamente Gattopardo, um épico de três horas sobre o momento
mais marcante da história da Itália - naturalmente, a sua libertação e
unificação. Ao longo do filme seguimos este evento visto pela família, e
sobretudo, pelos olhos do príncipe Don Fabrizio Salina, numa interpretação
fantástica de Burt Lancaster. Podemos ver como, apesar de tantas lutas, tantos
gritos, tanta vontade, o essencial fica na mesma. Os nomes continuam, a
essencial rotina da nobreza, como explica o genial padre Pirrone, não muda, as
classes não vão acabar, as ideias são ideias, mas o povo italiano, os seus
modos e tiques, e acima de tudo, o siciliano, esse, não quer mudança, ou
melhor, quer mudar tudo para ficar tudo na mesma - escondidos no seu cantinho,
lamentando-se diariamente pela tarefa inevitável do viver pesado.
E pela história de um
país, das suas personagens e cenas típicas genialmente interpretadas, vemos
cenários fabulosos, dignos da arte mais impressionista ou da arte mais
ricamente realista. Desde o forrado da sala, aos vestidos das senhoras, aos
pratos servidos, à disposição de cada um pelo ecrã scope, cada plano
aparece-nos como um quadro eterno, uma imagem digna de um sonho, vindo da maior
sensibilidade do belo de todas - a de Visconti.
Mesmo os choques
encaixam-se na fluidez da filmagem, as aparições geniais como a de Don Calogero
Sedara, novo burguês tosco pinto-calçudo, que se diverte ao calcular tanta
riqueza antiga que o rodeia por equivalências em hectares e propriedades, a
entrada da fabulosa Angelica, Claudia Cardinale no seu papel mais carnal e
fatal, ou as barulhentas tropas e o seu general de botas por dentro de um
último baile da mais alta e exclusiva classe. A mesma atriz é protagonista, com
Alain Delon, de uma das cenas mais eróticas da história do cinema, ao se
"passear", com o seu noivo, pela casa abandonada, já demasiadamente
vazia para poder controlar tanto desejo.
E no fim, o que temos, é a
morte do Leopardo, genialmente filmada por Visconti através, desta vez, de um
verdadeiro quadro, e de uma valsa, a pontuar o auge da decadência mais bela do
cinema. É ele que segue sozinho por entre os tiros de uma guerra inacabada, que
ele próprio aceitou naturalmente, uma guerra que já não travará totalmente, nem
precisará. Segue o seu sobrinho (Alain Delon), financeiramente equivalente a
uma suposta classe média, que protege a sua noiva burguesa, bela, e rica
(Claudia Cardiale) dos brutos sons vindos do exterior do seu coche.
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