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Sapucaia do Sul/Porto Alegre, RS, Brazil
Sócio e divulgador do Clube de Cinema de Porto Alegre, frequentador dos cursos do Cine Um (tendo já mais de 100 certificados) e ministrante do curso Christopher Nolan - A Representação da Realidade. Já fui colaborador de sites como A Hora do Cinema, Cinema Sem Frescura, Cinema e Movimento, Cinesofia e Teoria Geek. Sou uma pessoa fanática pelo cinema, HQ, Livros, música clássica, contemporânea, mas acima de tudo pela 7ª arte. Me acompanhem no meu: Twitter: @cinemaanosluz Facebook: Marcelo Castro Moraes ou me escrevam para marcelojs1@outlook.com ou beniciodeltoroster@gmail.com

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segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Cine Dica: Durante a Quarenta Assista: 'Clipe Express Yourself' (1989)

Sinopse: Em uma grande metrópole, poderosa mulher seduz operário de seu maior interesse.  


Nos tempos em que diria videoclipes nos anos oitenta “Express Yourself” foi a produção de maior sucesso do qual David Fincher havia dirigido, foi baseado no longa-metragem Metrópolis (1927) e estreou em 17 de maio de 1989 na MTV. Foi o vídeo musical de maior custo da época, com 5 milhões de dólares sendo gastos em sua produção; atualmente, é o terceiro vídeo mais caro de todos os tempos. O vídeo apresenta Madonna como uma mulher glamorosa e masoquista chefe de grande uma empresa, onde trabalham homens musculosos. No final do vídeo musical, ela escolhe um deles — interpretado por Cameron Alborzian — como seu parceiro. Análises da mídia especializada aclamaram o vídeo e concluíram que a imagem masculina de Madonna refere-se à igualdade. Entretanto, outros comparam a cena em que Madonna coloca a mão em sua virilha com o passo similar feito por Michael Jackson. Consequentemente, a gravação foi nomeada para cinco prêmios nos MTV Video Music Awards de 1989, vencendo nas categorias de Best Cinematography, Best Direction e Best Art Direction.

Embora todos apontem Madonna como a alma do clipe, por outro lado, é notório todo lado autoral que David Fincher inseri aqui e que, posteriormente, iria exercer quando ingressasse para o cinema no início dos anos noventa. Com um clima sombrio, bem típico para época, o clipe é uma bela homenagem ao clássico de Fritz Lang, do qual falava sobre o conflito entre as classes dominantes e operárias. Se nota que em alguns momentos o cineasta construiu os cenários similares ao clássico do expressionismo alemão e cuja a semelhança é o grande chamariz da obra.  

Com "Express Yourself", David Fincher teria passe livre para obter a sua primeira chance na direção de um longa metragem para o cinema com o filme “Alien 3” (1992), mas ganharia status de respeito a partir do seu grande filme “Seven” (1996).   


Curiosidade: Confira abaixo as comparações entre o clássico "Metropolis" e o clipe "Express Yourself" dirigido pelo cineasta.




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sexta-feira, 14 de agosto de 2020

Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: 'Shirley'

Sinopse: Dois jovens decidem abrigar em sua casa um casal de jovens estudantes por um período. Shirley encontra nessa rotina peculiar a inspiração que precisava para sua mais nova obra. 

As vezes gostaríamos de explorar a personalidade de um determinado escritor e para assim conhecer as suas motivações que o levaram a realizar determinadas obras primas da literatura. O filme "Mary Shelly" (2017), por exemplo, serviu para descobrirmos as raízes que serviram de ideias para a escritora realizar sua obra prima "Frankenstein". "Shirley" segue um caminho inverso, mas muito eficaz sobre a vida de outra grande escritora.
Dirigido por Josephine Decker, o filme conta a história de Shirley Jackson (Elisabeth Moss), uma escritora de contos de suspense casada com Stanley Hyman (Michael Stuhlbarg), um renomado professor da Bennington College. Os dois decidem abrigar em sua casa um casal de jovens estudantes por um período. Shirley encontra nessa rotina peculiar a inspiração que precisava para sua mais nova obra.
Escritora do livro clássico "A Assombração da Casa da Colina", que por sua vez ganhou uma adaptação recente em forma de série pela Netflix, Shirley Jackson com certeza possuía uma vida e personalidade complexa, sendo que qualquer filme que adaptasse sua vida teria um resultado meramente parcial. Portanto, ao retratar somente um ponto específico de sua história, a diretora Josephine Decker obtém certo êxito em conseguir nos passar um pouco sobre como era a personalidade dessa pessoa, mas muito disso se deve ao estupendo trabalho de atuação de Elisabeth Moss.
Elogiada pela crítica, e vencedora de vários prêmios, Moss tem nos brindado com atuações poderosas, desde a série "The Handmaid's Tale", como também o recente sucesso do cinema "O Homem Invisível". Em "Shirley", atriz consegue extrair de sua personagem uma mulher que transita entre a genialidade e a loucura, mas sabendo dançar conforme a música para não se perder na estrada. A trama se passa em 1960, época em que as mulheres ainda passavam por diversos abusos vindo dos homens e o filme explicita muito bem isso, mesmo não havendo abusos físicos. mas sim psicológicos.
Aliás, isso é muito bem representado pelo marido de Shirley, o professor Stanley e interpretado pelo ótimo ator Michael Stuhlbarg, visto recentemente pelo filme "Me Chame Pelo seu Nome" (2018). Aqui, o jogo de Stanley é persuadir Shirley a se manter em casa e formando assim um mito para a sociedade sobre a real saúde mental dela. Embora não seja explicado no princípio os motivos que a levam a não querer sair de casa, aos poucos, logo isso vai ficando esclarecido em peças chaves que vão nos sendo apresentadas aos poucos.
Porém, o jovem casal de hóspedes, Fred (Logan Lerman) e Rose (dessa Young), se tornam uma espécie de protótipos para que a escritora busque inspiração para o seu próximo livro. Shirley e Rose, por exemplo, compartilham de uma dor similar, onde ambas percebem a vida dura de uma mulher perante uma sociedade machista e da qual faz da vida delas um verdadeiro inferno a cada dia que passa. Porém, tudo se encaminha para um jogo de gato e rato, onde um manipula o outro e cabe cada um deles saber onde deverá parar para não cair no precipício literalmente falando.
Com uma belíssima fotografia e edição de arte caprichada, "Shirley" não é somente sobre a vida de uma escritora, como também a voz de várias mulheres do passado e presente e que se sentem enclausuradas como um todo.  

Onde Assistir: Em Breve.   

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quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Cine Especial: 'Redescobrindo No Coração do Mar'


Se há um ponto positivo com relação a Netflix é no fato da plataforma guardar para si algumas pérolas esquecidas, mas que acabam sendo redescobertas pelo público em geral hoje em dia. Bom exemplo disso é o filme "Contágio" (2011), de Steven Soderbergh, do qual teve apenas um relativo sucesso na época do seu lançamento, mas sendo redescoberto pelo público graças pelas suas semelhanças com esses tempos em que vivemos com o coronavírus. Em uma época em que muitas pessoas se mantém em casa isso acaba gerando a procura de filmes para serem degustados e "No "Coração do Mar" (2015) acabou sendo alguns desses escolhidos.  

Dirigido por Ron Howard, do filme "Rush - No Limite da Emoção" (2013), acompanhamos a jornada do baleeiro Essex, cuja missão da tripulação é caçar baleias e retirar delas o óleo que dá luz as cidades daquele tempo. A tripulação é comandada pelo capitão George Pollard  (Herman Melville), mas liderada pelo primeiro almirante Owen Chase (Chris Hemsworth) e se criando assim uma rixa entre ambos ao longo da viagens. As desavenças entre eles começam a se desfazer, no momento que precisam unir suas forças, para que a viagem tenha sucesso, mas ao mesmo tempo quando precisam sobreviver perante aos ataques de uma imensa baleia branca. 

O filme é baseado no livro de  Nathaniel Philbrick que, por sua vez, é baseado em fatos verídicos e que serviu de inspiração para a criação do clássico da literatura "Moby Dick" de  Herman Melville. Embora eu jamais tenha até hoje lido a obra, o nome Moby Dick é algo que me soava sempre familiar, já que meus pais haviam assistido antigamente a versão cinematográfica de 1956 estrelada por Gregory Peck e sempre me contavam como o filme havia marcado eles. Portanto, eu tinha grandes expectativas para assistir na época "No Coração do Mar" e do qual não havia me decepcionado.  

Infelizmente isto é cinema e as vezes alguns filmes acabam não ganhando o reconhecimento que merecia na época de sua estreia. Felizmente o tempo faz justiça para todos e "No Coração do Mar" agora é visto e revisto pela Netflix e ganhando fãs que na época não havia adquirido. Para conferir a minha crítica da época cliquem aqui. Por fim, "No Coração do Mar" é um belo filme de aventura, onde a humanidade abraça as suas limitações, mas ao mesmo tempo se fortalece perante os seus erros e obstáculos que surgem nesse imenso mundo de mistérios. 



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quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: 'Rede de Ódio'

Sinopse: A trama gira em torno de um estudante expulso da universidade de Varsóvia que tenta comandar a Internet, causando ódio e violência generalizados. 

Tanto o governo de Trump como de Bolsonaro chegaram ao poder a partir da rede de informações falsas virtuais, os temíveis fake news, dos quais deram origem a uma alienação sobre os verdadeiros fatos do mundo real e assim germinando a receita perfeita do ódio contra aqueles que se opõem contra eles. No documentário "Privacidade Hackeada" (2019), por exemplo, testemunhamos como são as reais engrenagens dessa rede ilícita, do qual é criada para gerar lucro e tendo a capacidade de derrubar até mesmo governos poderosos. Embora seja uma ficção, "Rede de Ódio" surpreende ao saber dialogar com o nosso mundo real, principalmente em um momento que nos encontramos em plena a falta de boa informação e envenenados por mentiras criadas com o intuito de nos persuadir até o fim.    

Dirigido por Jan Komasa, o filme conta a história de um jovem chamado Tomasz (Maciej Musialowski) que passa a fazer sucesso incitando o ódio em campanhas nas redes sociais, atacando desde influenciadores virtuais a políticos renomados. O que ele não contava é que toda essa crueldade no mundo virtual cobraria seu preço no mundo real, complicando sua vida. Cabe então ele jogar pelos dois lados da mesma moeda. 

Em seu primeiro ato da trama, o cineasta Jan Komasa já nos deixa claro que o protagonista é alguém especial, mas que é menosprezado por aqueles que um dia ele admirava. Com isso, temos a construção do indivíduo comum para se tornar um perito na criação de fake news e com intuito de ser especial pelos olhos que o cercam. Na medida em que ele avança nas casas deste jogo perigoso, mais ele chega um ponto sem volta e desencadeando uma bola de neve virtual através de seu talento incomum.  

Curiosamente, o filme trata de um assunto universal, mesmo ele se passando na Polônia, pois ao vermos o cenário político do longa sendo mudado através do poder de fake news criado por uma única pessoa, isso faz com que a história se torne assustadoramente verossímil perante aos nossos olhos. Ao mesmo tempo, a origem desse mal não se encontra no colo de uma pessoa maquiavélica, mas sim carente de amor e sendo facilmente seduzida pela violência, seja ela vinda dos games ou das próprias armas a venda no outro lado da esquina. Não é preciso ser adivinho para imaginar que isso pode acabar gerando uma grande tragédia, mas até lá nos damos conta que tudo isso poderia ser evitado se essas pessoas tivessem recebido atenção como realmente mereciam.  

Em tempos de Coronavírus em que as pessoas se encontram cada vez mais impacientes, assim como sendo cada vez mais influenciadas por informações falsas, o filme acaba se tornando assustador pelo seu teor realista e que nos bate fortemente na cara. Ao vermos os minutos finais em que o protagonista adquire o que desejava através da mentira, constatamos que há milhares de pessoas iguais por aí, seja elas comuns ou com poder suficiente para esmagar nações desinformadas infelizmente. "Rede de Ódio" mostra como nasce a desinformação e desencadeando assim um veneno mortal e que pode mudar o curso da história de todos nós. 

Onde assistir: Netflix. 

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terça-feira, 11 de agosto de 2020

Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: 'Privacidade Hackeada'

Sinopse: Tudo sobre o  escândalo de dados do Facebook – Cambridge Analytica, produzido e dirigido por Jehane Noujaim e Karim Amer.

Querendo ou não, estamos todos conectados nas redes sociais da internet, ao ponto de nos tornarmos dependentes dessas ferramentas devido as suas inúmeras possibilidades infinitas.  Mas até que ponto elas são realmente úteis para nós e qual a possibilidade de haver algo negativo por detrás das cortinas? Infelizmente a resposta vem através de um veneno virtual por detrás disso tudo e "Privacidade Hackeada" (2019) escancara que estamos sendo manipulados e tendo nossas identidades violadas para algo muito maior e escuso.
Dirigido por Karim Amer e  Jehane Noujaim, o documentário fala sobre o escândalo da empresa de consultoria Cambridge Analytica e do Facebook, onde é recontado através da história de um professor americano. Ao descobrir que, junto com 240 milhões de pessoas, suas informações pessoais foram hackeadas para criar perfis políticos e influenciar as eleições americanas de 2016, ele embarca em uma jornada para levar o caso à corte, já que a lei americana não protege suas informações digitais mas a lei britânica sim.
O documentário faz com que a gente assista com a sensação de medo a todo momento, principalmente ao fazer com que testemunhamos esse emaranhado de eventos através do olhar dos três protagonistas principais da obra: a jornalista Carole Cadwalladr, que investigou e reportou o escândalo no The Guardian; o professor David Carroll, um cidadão comum que entrou na justiça para descobrir quais dados pessoais seus foram compartilhados pelo Facebook com a Cambridge Analytica, sem sua autorização; e Brittany Keiser, a curiosa profissional que começou na campanha de Obama e acabou no centro da divulgação do escândalo da CA, anos depois.
Embora possa parecer complexo, os realizadores foram gênios ao elaborar uma edição ágil e que não dificulta o compreendimento da maioria que for assistir a obra. Além disso, é perfeito o uso de símbolos conhecidos das redes sociais que são inseridos para dentro da narrativa, fazendo com que as pessoas possam se identificar, mas ao mesmo tempo fazendo elas pensarem sobre até que ponto estava sendo persuadidas através das redes sociais. É aí que a obra nos desvenda que, da maneira pura e simples, acabamos nós mesmos passando as nossas informações através de aplicativos, notícias parciais e de propagandas em tempos de eleições por meio das redes sociais como a gigante Facebook.
Se hoje há uma batalha contra as fakes news, muito se deve ao fato que tudo isso acabou explodindo após uma eleição até hoje suspeita e que deu vitória a Donald Trump. Porém,  Cambridge Analytica  foi somente a ponta desse grande Iceberg, pois se de um lado foi comprovado que eles colaboraram pela disseminação das fake news através do facebook, do outro, isso acabou não sendo o suficiente para que fosse impedido em ser usado em outros países e que acabou gerando uma avalanche de ódio e separação entre os povos que perdura até hoje. O resultado das eleições do Brasil em 2018, por exemplo, se originou das fake news que foram disparadas pelo WhatsApp para pessoas que fossem facilmente manipuladas por uma rede de mentiras e o resto a gente já conhece muito bem a história.
Do começo ao fim do documentário, se comprova que fomos todos envolvidos em uma bola de neve que cada vez mais vai crescendo e fazendo a gente se perguntar qual o melhor meio para que possamos derrete-lo. A obra termina em aberto, mas fazendo a gente desejar que a justiça, por mais viciada que ela hoje se encontra, dê para nós a chance de não nos tornarmos meras marionetes do universo digital, mas sim que possamos ter controle de nossas próprias escolhas e sem nenhuma manipulação.
"Privacidade Hackeada" é um documentário para ser visto e revisto por todos, mesmo para aqueles que ainda se prendem e se alimentam da mentira, pois a verdade parece que nunca é o suficiente para elas. 

Onde Assistir: Netflix.  

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Cine Especial: 'Domicílio Conjugal' - Relacionamentos Após Maio de 68


Este é o quarto filme protagonizado pelo personagem Antoine Doinel, o alter-ego do cineasta François Truffaut. "Domicílio Conjugal" revela o olhar terno, engraçado e inteligente de Truffaut sobre o casamento e a paternidade. Sendo um cineasta que sempre amou o cinema como um todo, declarou ter-se inspirado nas "comédias americanas sobre os casais, de Leo McCarey e de George Cukor, sem esquecer a influência de Lubitsch, que é decisiva quando se trata de concatenar acontecimentos familiares para fazer rir o público, mas de modo a que tudo fosse tratado, evidentemente, com espírito francês".

Com 100 minutos de duração, direção de arte e figurino bem trabalhados, "Domicílio Conjugal" tem como um dos pontos mais interessantes o painel histórico em que a narrativa está mergulhada. Seguindo o lema do pensador Frederic Jameson, “historicizar sempre”, percebemos que muito do contexto político e cultural da França na época está inserido no filme. Neste período, a França estava imbuída do espírito de mudanças: marcada pelo maio de 1968, pelas manifestações do movimento feminista e por uma crise econômica, a nação passou a ser governada pelo então ministro das finanças Giscard, representante político simpático do movimento feminista, que tratou de, entre tantas reformas, impulsionar a economia, bem como implementar medidas de estatais de modernização.

Ao apresentar os conflitos amorosos sem o modelo prosaico do cinema hollywoodiano, mas como uma caricatura deste, Truffaut toca nas cordas sensíveis da liberdade sexual, um tema ainda tabu nesta época, mas já debatido sem tantas delongas, haja vista que no governo de Giscard, atitudes como a mudança da maioridade penal de 21 para 18 anos de idade, a liberação do aborto e a campanha para uso de contraceptivos marcaram a época.

Por isso a importância do que se seguirá após o aparecimento de Doinel em "Domicílio Conjugal". Ele está casado com Darbon, cuja conquista presenciaremos em "Beijos Proibidos". O amor - tema ao qual o nome do diretor será vinculado - encontra aqui um momento decisivo no casamento e na rotina.  A paternidade, registrada em bela cena, e a estabilidade econômica, conseguida através de um emprego estranho em que cuida de maquetas de navios, darão cores ambivalentes ao progresso de um dos nomes mais importantes da Nouvelle Vague.

Curiosidade: Profundamente apaixonado pelo cinema, Truffaut não consegue deixar de falar de filmes em seus filmes. Antoine passa em frente a um grande cinema parisiense em que um cartaz descomunal anuncia o filme Cheyenne, de John Ford – um dos grandes ídolos do realizador. Num texto de 1974, Truffaut diria: “John Ford era um desses artistas que jamais pronunciam a palavra arte e um desses poetas que jamais mencionam a palavra poesia”. E finalizaria assim: “E como John Ford acreditava em Deus, Deus abençoe John Ford”.


NOTA: Nova live de Tânia Cardoso e que será sobre 'Domicílio Conjugal'. Confira:     

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segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Cine Dica: Mostra online de cinema reúne obras da vinda ao Brasil de Orson Welles em 1942

 Histórias descontinuadas, brasilidade e cinema: próxima mostra da Sala Redenção reúne tudo isso em quatro filmes

Entre os anos 1960 e 1990, um diretor brasileiro buscou retratar a inacabada tentativa de outro diretor, norte-americano, em apresentar ao mundo a complexidade do que é Brasil e do seu povo. A mostra de agosto da Sala Redenção, Nem tudo é Orson Welles, reúne histórias dentro de histórias, que, nesse emaranhado, remonta fragmentos de quem foram Rogério Sganzerla, Orson Welles e Grande Otelo.

A partir do dia 7, estará disponível, no perfil do Facebook da Sala Redenção, os links para acessar a tetralogia de filmes dirigidos por Sganzerla, se estendendo até o dia 21 deste mês – confira clicando aqui. Ainda no dia 13 de agosto acontecerá uma conversa virtual sobre as exibições, no canal do Youtube do Departamento de Difusão Cultural com a equipe da Sala Redenção e um convidado especial.

O fio começa em 1942, quando o cineasta Orson Welles partiu para territórios tropicais com a missão de introduzir o país de dimensões continentais aos outros continentes. Para personificar com esmero a brasilidade (ainda que de forma minúscula se posta ao lado da imensa realidade), o ator Grande Otelo é convocado – para Welles, não haveria escolha melhor. Não contava o diretor de Cidadão Kane, no auge da sua carreira, que seria impossibilitado de cumprir a missão. 

Fascinado por esse feito-não-feito, talvez por identificação pessoal, Rogério Sganzerla percebeu na impossibilidade de Welles sua possibilidade. Distribuiu em quatro produções a história da visita do cineasta ao Brasil, um misto de especulações e fatos. Quem sabe a única certeza que se mantém intacta nas duas tramas – a real e a ficcional – é a excelência de Grande Otelo. Ou melhor, Sebastião Bernardes de Souza Prata. Também é sinônimo de riso, drama, cor, calor e intensidade.

As histórias de Grande Otelo e Orson se misturam tanto na vida, quanto nos documentários encenados de Sganzerla. Deixe-se envolver por essas descontinuidades históricas – dos homens, do cinema e do país. Acompanhe a tetralogia através do link.


Nem Tudo É Orson Welles

Era meados da Segunda Guerra Mundial quando Orson Welles visitou o Brasil em uma missão diplomática disfarçada de filmagem para um documentário sobre a América Latina, sob o título It’s All True, em português, é tudo verdade. Portanto, independentemente das intenções, não era um filme de mentira, principalmente para Welles, que talvez acreditasse no cinema mais do que em qualquer outra coisa. Welles se entregou de corpo e alma, segundo dizem, para essa produção que acabou interrompida na metade, seus rolos foram encontrados anos depois no porão de um estúdio, depois de ter-se acreditado que haviam sido jogados no mar. Um filme que tornou-se eternamente incompleto. E a vinda de Welles é, de certa forma, uma história sobre interrupções.

É difícil mensurar o que é verdade e o que é mentira em Orson Welles e sua visita ao nosso país, já que sua existência é formada de especulações. Jovem diretor confiante e destemido, esse tipo de personalidade acaba se retroalimentando por todos aqueles que querem contribuir com alguma especulação para a construção do mito. Rogério Sganzerla foi um desses assombrados pelo incerto. Além de companheiro de Helena Ignez, Sganzerla foi crítico, diretor de cinema e assumidamente fascinado pelo diretor norte-americano. Considerava Welles um fenômeno da comunicação do século XX e a vinda dessa figura ao país mais comunicativo das américas (quem sabe do mundo), criou uma série de incomunicabilidades que intrigaram o diretor brasileiro desde muito jovem.

Sganzerla realizou quatro filmes sobre esse episódio durante a segunda metade de sua carreira. Nem tudo é verdade (1986), Linguagem de Orson Welles (1991), Tudo é Brasil (1997) e Signo do caos (2003) são embaralhamentos de documentos e encenações que tentam de alguma forma ilustrar essa visita e a personalidade desse explorador. Investigam o desconhecido, assim como fez Welles no Brasil, que se integrou com facilidade à nossa paisagem. Não sei se por puro deslumbramento tropical, típico do explorador colonizador do bem, tentando descrever as coisas sem usar a palavra “exótico”; ou se Welles de fato se sintonizou com alguma parte transcendental do “ser” brasileiro, essa coisa de lidar constantemente com o inesperado.

Mas nem tudo é Orson Welles. Figura fundamental desse processo de abrasileiramento do diretor é Grande Otelo, ator, compositor, cantor e “cachaceiro presidente”, segundo consta na “carteirinha de cachaceiro” dada à Welles em uma das sabe-se lá quantas idas dos dois ao bar. Sebastião Bernardes de Souza Prata, o Grande Otelo, não apenas atuou em algumas cenas do incompleto It’s All True, também esteve em mais de cem filmes, produções de televisão, palcos e rodas de samba. Na época ainda não havia feito metade do que chegou a fazer, mas foi reconhecido por Welles como o maior ator brasileiro. Existiu, nessa relação, a lenda da promessa de levá-lo para Hollywood para tornar-se estrela, o que nunca se concretizou.

Sganzerla, assim como outros diretores da sua geração, admirava Grande Otelo. Deu à ele destaque nessa intermediação entre o ator brasileiro e o estadunidense. Otelo como personificação de um cinema nacional pulsante, cuja voz remonta à esse passado sempre meio próximo e meio distante demais, de um mundo que explodia numa guerra mundial enquanto o Brasil “crescia” para os padrões imperialistas e os EUA ainda tinham algum interesse em estreitar convenientemente as relações com o povo latino-americano. Mas é sabido que essa presença estadunidense em nossas terras favoreceu uma interferência no campo político, culminando, entre outras coisas, no Golpe Militar, em 1964. O resultado disso em nosso cinema foram os apagamentos, as perseguições, os exílios, as carreiras impossibilitadas. It’s All True nunca foi completado, assim como a promessa de um movimento cinematográfico extremamente rico surgido na geração de Sganzerla, nas décadas de 60 e 70. Dada as proporções, principalmente de orçamento, a frustração de uma possibilidade impossibilitada existe tanto em Sganzerla, quanto em Welles nesse sentido. 

Talvez o Brasil tenha sido arrebatador para os bolsos de seus produtores, assim como foi para Welles; ou talvez esses produtores não tenham se agradado com o olhar desse diretor diplomata voltado à um artista negro, como Grande Otelo, transbordando talento e brasilidade. Esses quatro filmes de Sganzerla investigam essas incompletudes, tendo a figura de Otelo como mediador, e esse novo ciclo da Sala Redenção pretende relembrar essa figura, cujo reconhecimento pode parecer só especulação para aqueles que dependem de mídias que monopolizam o imaginário artístico brasileiro, mas que é completamente real e verdadeiro para a história do nosso cinema. Como reflete Sganzerla sobre esse processo: “há certas verdades que surgem como blasfêmias e terminam como superstições.”

Texto: Victor Souza, bolsista da Sala Redenção e curador da mostra.

Confira a programação completa no site oficial da Sala Redenção clicando aqui.