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Sapucaia do Sul/Porto Alegre, RS, Brazil
Sócio e divulgador do Clube de Cinema de Porto Alegre, frequentador dos cursos do Cine Um (tendo já mais de 100 certificados) e ministrante do curso Christopher Nolan - A Representação da Realidade. Já fui colaborador de sites como A Hora do Cinema, Cinema Sem Frescura, Cinema e Movimento, Cinesofia e Teoria Geek. Sou uma pessoa fanática pelo cinema, HQ, Livros, música clássica, contemporânea, mas acima de tudo pela 7ª arte. Me acompanhem no meu: Twitter: @cinemaanosluz Facebook: Marcelo Castro Moraes ou me escrevam para marcelojs1@outlook.com ou beniciodeltoroster@gmail.com

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segunda-feira, 10 de novembro de 2025

Cine Dica: Em Cartaz - 'O Agente Secreto'

Sinopse: Em 1977, Marcelo trabalha como professor especializado em tecnologia. Ele decide fugir de seu passado violento e misterioso se mudando de São Paulo para Recife com a intenção de recomeçar sua vida.   

No ano de 1977 os meus pais saíram do interior para morar em Porto Alegre. Segundo eles, era comum naquela época pegar um ônibus para logo em seguida ser parados por policiais militares que vinham com a desculpa que estavam procurando determinado meliante, mas a realidade era bem diferente. Assim era o Brasil do final dos anos setenta, onde se fazia tudo do jeitinho brasileiro, mas de um modo para ocultar um país em declínio moral e civilizado.

Kleber Mendonça Filho viveu boa parte de sua vida em Recife e por lá testemunhou as metamorfoses do país como um todo. Isso é sentido, por exemplo, no seu documentário "Retratos Fantasmas" (2023), longa que não somente fala sobre a juventude do diretor, como também sobre uma Recife que estava mudando aos poucos e cujo certos símbolos culturais foram ficando no passado. "O Agente Secreto" (2025) não é somente um dos melhores filmes do diretor, como também sintetiza o calor do momento de um Brasil sem rumo em tempos incertos.

A trama se passa no Brasil de 1977 onde Marcelo (Wagner Moura), que trabalha como professor especializado em tecnologia, sai da movimentada São Paulo e vai para Recife. Ele tenta fugir de algo que, em um primeiro momento, não sabemos ao certo e tendo como objetivo de recomeçar a sua vida. Em Recife ele chega em pleno calor do Carnaval, onde a calmaria dá lugar ao mistério e investigações sobre o seu passado e fazendo se perguntar se Recife se tornou um refúgio ou um beco sem saída.

Abertura do filme já é simbólica, onde o cineasta joga na tela fotos sobre tudo que estava acontecendo naquele período, desde aos filmes, como também a música, televisão e a cultura geral como um todo. Com uma fotografia de cores quentes, alinhada com uma edição de arte que impressiona, é como se voltássemos no tempo ao nos depararmos com um Brasil onde a terra sem lei não era vista nos noticiários, mas que rolava constantemente fora de nossa vista. A figura do corpo vista nos primeiros minutos do filme simboliza muito bem isso, onde o protagonista se torna o nosso guia para nos levarmos em uma realidade opressora nas entrelinhas.

Kleber Mendonça Filho não tem pressa para revelar a premissa principal da trama, sendo que nem precisa, pois, essa realidade vista na tela já nos encanta e desperta a nossa curiosidade sobre o que acontecia nela. Além disso, o diretor presta uma bela homenagem com relação a uma determinada sala de cinema de Recife, da qual exibia filmes de sucesso da época como "A Profecia" (1976), "Tubarão" (1975) e "Dona Flor e Seus Maridos" (1976). É curioso, por exemplo, ver as reações das pessoas diante do filme, assim como também os seus determinados comportamentos e que sendo colocados em prática hoje seriam politicamente incorretos.   

Falando em "Tubarão", é notório que o clássico de Steven Spielberg talvez seja um dos filmes favoritos de Kleber, pois só mesmo desta forma para explicar a aparição de um Tubarão em uma determinada cena e que trazia consigo uma perna decepada. Aliás, esse membro decepado é simbólico, pois pertence a uma época que os jornais usavam histórias surreais para tentar fugir da censura. Portanto, a sequência que mostra a perna atacando pessoas em plena madrugada sintetiza o folclore que havia se enraizado naquele período através de um jornalismo picareta e cujo sistema ditatorial somente agradecia por isso.

Curiosamente, essa sequência da perna sintetiza o quanto Kleber sabe explorar elementos de horror do gênero fantástico. Porém, o sangue jorrando em momentos que representam a violência que ocorria naquele período simboliza uma realidade muito mais assustadora do que qualquer filme de terror da época. E se determinada cena por sua vez não é explícita, por outro lado, a sugestão se torna algo ainda mais angustiante, principalmente na cena de um camburão que diz tudo mesmo não mostrando nada diante dos nossos olhos.

O horror que não se vê acaba se tornando um elemento relevante do filme como um todo, principalmente nas passagens que é revelado que a trama é apresentada através de duas estudantes do nosso tempo atual que estão ouvindo relatos de Marcelo através de fitas cassetes. É neste momento, portanto, que não só descobrimos a cruzada em que o protagonista está enfrentando, como também é o momento em que Wagner Moura mais brilha na tela como um todo. Vale destacar que neste flashback dentro de flashback é que conhecemos uma personagem importante dentro da trama que é a esposa do protagonista e que mesmo em pouco tempo de cena a atriz Alice Carvalho dá um verdadeiro show de atuação e digno de nota.

O filme é uma visão autoral de Kleber Mendonça Filho, onde cada cena moldura uma parte íntima de sua pessoa, mas que realmente funciona também graças ao seu grande elenco. Maria Fernanda Cândido, Hermila Guedes, Thomas Aquino, Carlos Francisco Udo Kier e dentre outros brilham em seus respectivos papéis, mesmo quando seus momentos são de pequenas passagens da trama, mas de grande relevância. Mas da ala de coadjuvantes se destaca realmente Tânia Maria, Artesã potiguar que começou atuar ao fazer uma rápida, porém, significativa participação em "Bacurau" (2019) e que aqui rouba a cena ao interpretar uma personagem não muito diferente de sua pessoa, mas sendo o suficiente para nos conquistar de forma imediata.

A maioria dos personagens centrais da história acabam por sua vez se cruzando em um ato final digno de nota, onde o cineasta dá uma verdadeira aula de como se faz um verdadeiro filme de suspense e culminando em elementos imprevisíveis. Tudo se direciona para minutos finais simbólicos, onde nos diz que todo o começo tem o seu final, mas o que foi de relevante a história nunca apagará. Resta, porém, saber se essa geração atual está disposta a conhecer a verdade dos fatos como é visto na tela, pois assim como os livros de história o cinema também é uma janela para o conhecimento e que é preciso abri-la para abraçarmos os fatos.

"O Agente Secreto" não é somente a obra prima de Kleber Mendonça Filho, como também uma representação genuinamente histórica de um Brasil que não existe mais, mas que é necessário essa geração atual conhecer. 

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