Sinopse: Tereza, de 77 anos, viveu toda a sua vida em uma pequena cidade industrializada na Amazônia, até o dia em que recebeu uma ordem oficial do governo para se mudar para uma colônia de moradias para idosos.
Nos últimos tempos o cinema brasileiro tem explorado o subgênero futuro distópico, mas do qual não é muito distante da nossa própria realidade. Se em "Bacurau" (2019) é explorada a perda da humanidade perante a união das velhas tradições, por outro lado, "Medida Provisória" (2020) mostra um futuro em que o próprio governo autorizou que pessoas negras fossem levadas forçadamente para a África. "O último Azul" (2025) mostra que a idade avançada pode se tornar o próximo alvo de um futuro sombrio.
Dirigido por Gabriel Mascaro, do ótimo "Divino Amor" (2017), o filme retrata um Brasil distópico, onde existe uma política de abrigo forçado para os idoso. Com a intenção do governo em querer produzir com a mão jovem sem ter que se preocupar com o futuro dos mais velhos, eles acabam sendo transferidos para uma colônia que, segundo dizem, possam desfrutar com maior tranquilidade os seus últimos dias de vida. Porém, Tereza (Denise Weinberg) não aceita essa realidade e decide embarcar em uma viagem fluvial para realizar os seus sonhos nunca realizados.
Gabriel Mascaro havia me surpreendido com "Divino Amor" (2019), cujo futuro é controlado pela igreja evangélica e alinhada com uma tecnologia não muito distante da nossa própria realidade. Já neste filme vemos uma realidade também próxima da nossa, mas cuja tecnologia avançada permite maior controle dos idosos e fazendo de sua realidade não muito diferente do que é explorado no clássico literário "1984". Portanto, é assustador testemunharmos o fato que a exclusão do idoso visto na tela não é muito diferente do que acontece hoje em dia, pois o próprio sistema capitalista se encarrega para que eles sejam deixados de lado na surdina.
Porém, Tereza é aquele tipo de força da natureza incapaz de aceitar essa realidade e disposta em enfrentar o que for necessário para seguir em frente. Interpretada com intensidade pela atriz Denise Weinberg, a protagonista decide viajar para procurar se descobrir nesta realidade formada por regras, mas que se encontra disposta a quebrar elas. É então que o primeiro tabu é rachado a partir do encontro com um piloto de um barco e interpretado por Rodrigo Santoro.
Embora a sua participação seja em pouco tempo, o intérprete rouba a cena ao interpretar um personagem que luta contra o seu próprio passado e enfrenta um presente em que as regras ele aceita, mas até certo ponto. É a partir dele, por exemplo, que é explorada a questão do caracol-baba-azul, do qual faz a pessoa encarar o seu eu verdadeiro e tenha uma visão muito além dessa realidade que nos controla como um todo. A cena em questão é uma das melhores partes do filme e muito se deve ao ator que se entrega de corpo e alma para um personagem que merecia mais tempo na tela.
Curiosamente, o filme me fez relembrar também do clássico literário "Coração das Trevas" do escritor Joseph Conrad e que serviu de base para a realização de clássicos como "Apocalypse Now" (1979). De similaridade se encontra o fato que ambos os protagonistas entram para o lado mais primitivo do ser humano, onde a perda de valores se encontra acentuada e levando cada vez mais os protagonistas à beira da loucura. Aqui, porém, a humanidade não retrocede, mas perde os seus valores mais universais a partir do momento que o sistema cheio de regras domina as suas vidas como um todo e deixando o futuro de todos inconclusivo.
Existe a questão do contato do ser humano com o lado selvagem da natureza, do qual pode ser a única forma de escape daquela realidade. Porém, o final do filme nos dá entender que não há uma escapatória plausível para aquela realidade e fazendo da trama se tornar não conclusiva diga-se de passagem. Se pode frustrar para alguns, ao menos o final se casa com perfeição com o nosso futuro real indefinido e que continua nebuloso.
"O Último Azul" é mais um filme dessa leva do cinema distópico brasileiro, mas que se encontra muito mais próximo de nós do que imaginamos.
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