Embora o cinema tenha se tornado uma arte para apreciarmos diversas histórias isso não significa que ela não tenha tido também os seus diversos problemas. Na era atual dos “fake news”, por exemplo, é comum as pessoas serem facilmente manipuladas por ideias até mesmo distorcidas, mas que antigamente esse papel era através de outros meios de comunicação e o cinema, infelizmente, foi usado de forma bastante errônea. Adolf Hitler foi um que deitou e rolou dentro das salas de cinema, onde através de palavras fortes e diversos gestos com as mãos, acabou que seduzindo as plateias alemãs da época.
O cinema americano também teve uma grande parcela de culpa, ao retratar diversos períodos históricos, mas que em alguns casos, principalmente em seus primeiros anos do século 20, tratou de um jeito inverossímil e irresponsável. Pegamos, por exemplo, a quantidade de filmes de faroestes em que os índios sempre eram retratados como verdadeiros selvagens e dos quais mereciam serem mortos na tela grande. Num gesto de protesto, além de corajoso, Marlon Brando recusou o Oscar de melhor ator pela sua atuação em “O Poderoso Chefão” (1972), por se sentir muito desapontado com a forma em que a máquina de entretenimento hollywoodiano tratou o povo indígena ao longo das décadas nas telas do cinema.
Curiosamente, até mesmo os grandes clássicos do cinema foram culpados por despertar um lado adormecido do povo norte americano e do qual jamais poderia ter sido reanimado. Com “Infiltrado na Klan”, ‘Infiltrado na Klan’ – O Mal Entre Nós reacende essa polêmica fogueira de uma forma corajosa e desconcertante. Ao abrir o seu filme, testemunhamos uma cena clássica de “E O Vento Levou”(1939), onde vemos a personagem Scarlett O’Hara (Vivien Lee) caminhar em meio aos diversos soldados mortos do Sul devido a Guerra Civil Norte Americana e encerrando a cena com a bandeira dos Confederados tremulando ao vento.
A cena é feita para despertar dentro de nós uma simpatia por aqueles soldados, mas fazendo a gente se esquecer, num primeiro momento, de que eles defendiam a escravidão e que não desejavam o povo negro ser libertado. Com a cena, Spike Lee nos diz que somos facilmente persuadidos pelo conteúdo visual e fazendo a gente se esquecer sobre o que está por detrás de tal ideia idealizada. Discursos de ódio contra as minorias, por exemplo, eram aceitos quando se colocava o nome Deus no jogo e fazendo com que discursos absurdos, assim, prosseguissem ao longo dos anos.
Há, por exemplo, uma conversa em “Infiltrado na Klan” sobre os planos de um determinado político de transferir o seu discurso de ódio para o campo político e, assim, preparar o terreno para a eleição de um presidente alinhado com ideias racistas. Espantado, um outro personagem rebate: “Os americanos jamais votariam em alguém assim.” A ideia absurda, por fim, se tornou realidade, ao vermos exemplos de políticos polêmicos como Donald Trump e Jair Bolsonaro obtendo o poder através do voto do povo.
O poder das palavras alinhado com as imagens, portanto, se tornam uma arma nas mãos daqueles que possuem uma obsessão insana de oprimir aqueles que eles acham minoria e que devem ser excluídos da face da terra. Spike Lee retornou aos cinemas em um momento delicado, onde diversos países, como EUA e o Brasil, retornam com discursos vindos de políticos que se acham no direito de oprimir pessoas que eles consideram um incomodo. Portanto, por mais absurda que seja o fato do policial negro Ron (John David Washington) de “Na Batida do Amor” (2017), se infiltrar na organização Ku Klux Klan em 1978, a trama vem numa hora mais do que adequada.
Para conseguir o tal feito, Ron usou o seu parceiro Flip (Adam Driver) de Star Wars: O Despertar da Força (2015) como dublê e para assim conseguir passe livre para entrar na organização. Por mais caricatos que possam parecer os personagens dentro do Klan vistos na tela, eles também não deixam de ser verossímeis. Se há uma dúvida com relação a isso, basta testemunharmos o personagem político da trama chamado David Duke (Topher Grace) de “Interestelar” (2014), que realmente existe e ainda hoje faz discursos absurdos e fazendo com que figuras como Trump e Bolsonaro se tornem moleques mimados.
O ápice da obra de Spike Lee é sem sombra de dúvida quando o mesmo coloca em duas linhas narrativas, mas conectadas uma com a outra, as cenas do clássico “O Nascimento de uma Nação”(1915) de D. W. Griffith. Na época, o filme foi considerado a primeira superprodução norte americana, ao ponto de ter sido exibido até mesmo na Casa Branca. Logicamente, os representantes dos direitos humanos da época tacharam a obra de racista e muito perigosa, pois ela romanceia os Ku Klux Klan e os tornando os verdadeiros heróis dentro da trama.
O próprio D. W. Griffith na época pediu desculpas, ao ponto de realizar no ano seguinte “Intolerância” (1916), mas o estrago já estava feito, pois houve casos de homens negros sendo assassinados naquele período por homens brancos encapuzados. Se os realizadores do cinema atual não cometem os mesmos erros do passado, porém, as redes sociais de hoje se tornaram o novo palanque para os discursos de ódio. Os minutos finais de “Infiltrado na Klan” são poderosos, pois a trama principal desliza em linha reta para o seu imprevisível final e nos jogando para uma realidade recente, crua e desoladora.
“Infiltrado na Klan” é um tapa na cara para aqueles que se dizem “cidadãos do bem”, quando no fundo não passam de opressores e com o desejo de levar suas ideias errôneas adiante.
Onde assistir: DVD, Google Play Filmes e Youtube.
Um comentário:
Adorei o texto! Vale a pena atualizar de que o filme já está disponível na Netflix!
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