Nos dias 01 e 02 de setembro eu estarei na Cinemateca Capitólio
Petrobras de Porto Alegre, onde irei participar do curso Pasolini: Intelectual e Cineasta
Maldito, criado pelo Cine Um e ministrado pela professora e crítica de cinema
Fatimalei Lunardelli. Enquanto os dias dessa atividade não chegam, eu estarei
por aqui falando um pouco dos filmes desse perfeccionista e polêmico cineasta.
Accattone - Desajuste
Social (1961)
Sinopse: Ao som da musica sublime de Bach, Pasolini nos apresenta a
miserável periferia de Roma, onde vive Vittorio, mais conhecido como Accattone,
um jovem cafetão que explora a prostituta Maddalena. Quando ela é presa, ele
fica sem rumo até se apaixonar pela ingênua Stella, que tenta fazê-lo mudar de
vida.
Esse inesquecível retrato poético do lumpem-proletariado e primeiro
filme do cineasta talvez também seja um dos seus melhores, pois é dotado por um
poder vindo de suas imagens que trai o
caráter, por vezes, impulsivo e intempestivo de seu protagonista, vivido
magistralmente por Citti, encontrado pelo cineasta e estreando igualmente no
cinema nesse filme. O acerto do filme advém de seu agridoce retrato do meio
social dos miseráveis subúrbios romanos em que se mesclam a sordidez movida
pela sobrevivência a qualquer preço: Accatone não apenas entrega sem pestanejar
sua mulher quando se vê pressionado quanto rouba uma pulseira do próprio filho
quando lhe pede para beijá-lo e uma solidariedade entre companheiros de
infortúnios igualmente repleta de pequenos golpes. Constrói um Accatone extremamente humano, expresso para além de seu cinismo nos raros momentos de
carinho que demonstra para com Stella. Tudo isso tendo como fundo sonoro a música de Bach que
ajuda a construir uma moldura épica e cristã, além de irônica,
a partir da marginalidade mais banal nesse retrato rumo a morte desses
personagens condenados por serem
portadores de uma sensibilidade “maior que a própria vida”, tal e qual o
adolescente de Mamma Roma, seu filme seguinte.
Mamma Roma (1962)
Sinopse: Mamma Roma (Anna Magnani), uma prostituta que se consegue
libertar de Carmine, o seu chulo, e montar um posto público de vendas para
poder proporcionar uma educação decente ao seu filho Ettore (Ettore Garofolo).
Apesar do terrível esforço de Mamma Roma, as coisas não correm pelo melhor.
Mamma Roma é o segundo filme de Pier Paolo Pasolini, com
argumento original da sua autoria e um dos primeiros filmes deste cineasta a
retratar os marginais da sociedade italiana. A partir de uma história
melodramática de uma prostituta de Roma que tenta dar uma vida digna ao seu
filho, Pasolini constrói um filme com uma extraordinária dimensão poética e
social. Na altura da sua estreia, Mamma Roma foi proibido em Portugal,
ressurgindo nos circuitos comerciais apenas em 1992.Com este filme, Pasolini
foi nomeado para o Leão de Ouro do Festival de Veneza de 1962.
O Evangelho Segundo
São Mateus (1964)
Sinopse: A história de Jesus Cristo, do nascimento à ressurreição, a
partir do texto de São Mateus. As parábolas, os primeiros discípulos, a
revolta, a determinação, os milagres, a intolerância, a solidão e a
impaciência. Assim Jesus conseguiu uma legião de seguidores e também muitos
inimigos.
Certamente, o cinéfilo do Evangelho Segundo São Matheus (1964) tem
grandes chances de se surpreender, mesmo quando a obra vai contra suas expectativas.
Afinal, não se trata de um filme de religião convencional: o relato da vida de
Cristo conforme os textos originais da bíblia poderia simplesmente significar
mais uma obra que vai ao sentido de exaltar Jesus, reverenciar o cristianismo,
fazer proselitismo religioso e assim por diante. O curioso é que, mesmo se
valendo exclusivamente de citações do evangelho, o filme interessa menos por
suas eventuais implicações religiosas e mais por suas possibilidades políticas,
além de sua rara beleza plástica.
O fato é que o Evangelho, por ter sido filmado por alguém como Pasolini, é igualmente uma obra política que destaca, sem subterfúgios e por meio de uma linguagem realista e poética, aspectos dos conflitos de classe que perpassam o evangelho. Assim, mais do que implicações práticas dos enunciados religiosos, interessa notar a forma como os enunciados são igualmente o resultado de conflitos sociais entre pobres e ricos, classe dominante e classe dominada.
O fato é que o Evangelho, por ter sido filmado por alguém como Pasolini, é igualmente uma obra política que destaca, sem subterfúgios e por meio de uma linguagem realista e poética, aspectos dos conflitos de classe que perpassam o evangelho. Assim, mais do que implicações práticas dos enunciados religiosos, interessa notar a forma como os enunciados são igualmente o resultado de conflitos sociais entre pobres e ricos, classe dominante e classe dominada.