Sinopse: Billie Holiday é investigada pela Agência Americana de Narcóticos no auge do seu sucesso.
Está fácil adivinhar o começo, meio e fim de determinadas cinebiografias de cantores famosos, pois as fórmulas são quase sempre as mesmas. Conhecemos a origem do cantor(a), testemunhamos o seu auge, vícios decadência para então, enfim, a sua redenção. Por melhor que fosse, por exemplo, "Bohemian Rhapsody" (2018) eu já sabia como iria terminar, mas não pelo fato de conhecer a carreira do cantor ou da banda em si, mas sim por já conhecer as velhas fórmulas que os roteiristas usam para a elaboração desse tipo de produção.
Mas isso não significa que defeito, mas sim uma forma mágica do cinema de nos identificarmos com esses artistas, pois por mais que sejam talentosos, eles no final das contas não deixam de serem seres humanos. Por outro lado, se torna interessante quando embarcamos sobre a vida de um artista sem ao menos saber muito sobre ela. "Estados Unidos Vs Holiday" (2021) embarquei sem muito saber sobre a cantora Billie Holiday e me surpreendi.
Dirigido por Lee Daniels, do filme "O Mordomo da Casa Branca" (2013), o filme retrata sobre a famosa cantora de jazz Holiday, interpretada pela cantora e agora atriz Andra Day durante o auge de sua carreira. No entanto, ela se torna alvo do Departamento Federal de Narcóticos com uma operação secreta liderada pelo Agente Federal Jimmy Fletcher (Trevante Rhodes), com quem ela teve um caso tumultuado no passado.
Como eu disse acima, pouco sabia sobre a cantora, muito embora tenha ouvido a música dela algumas vezes na vida. Ao embarcar na trama, testemunho uma entidade poderosa que foi esse talento, da qual usou a sua voz para fazer um forte protesto contra o racismo norte americano e do qual, infelizmente, ainda existe até hoje. Isso foi o suficiente para ser perseguida pelas autoridades, mas jamais abaixando a cabeça.
A minha surpresa principalmente fica por conta da interpretação assombrosa de Andra Day ao dar corpo e alma para Billie Holiday, pois visualmente ela está idêntica a falecida cantora. Day transmite para nós toda a dor e fúria contida da cantora, pois já nos primeiros minutos constatamos que ela é uma de inúmeras pessoas negras vítimas de um racismo insano, mas que lutou para ser ouvida mesmo lhe custando um alto preço. Embora as chances sejam pequenas, não me surpreenderia se caso atriz ganhasse o Oscar pelo seu trabalho, pois é sem dúvida inesquecível.
tecnicamente o filme possui uma incrível reconstituição de época, onde a fotografia oscila em tons de cores de uma época mais dourada, mas que não esconde também cores pálidas que sintetiza a dura a realidade certas pessoas. Assim como o recente "Judas e o Messias Negro" (2021) o filme escancara a covarde perseguição do governo contra determinados talentos, seja pela sua mensagem, ou puramente por inveja e preconceito latente. Porém, em sua reta final, percebe que todas essas pessoas poderosas foram esquecidas pelo teste do tempo, enquanto talentos como Billie Holiday continuam vivos por anos a fio.
Indicado ao prêmio de melhor atriz no Oscar 2021, "Estados Unidos Vs Billie Holiday" é sobre a força de vontade de uma única pessoa, mas que se equivale perante à de muitas.
Nota: Previsão de estreia nos cinemas brasileiros em Maio.
'Rosa e Momo'
Sinopse: Baseado no livro “A Vida Pela Frente” de Romain Gary, a trama acompanha Momo (Gueye), um adolescente órfão senegalês, que leva a vida fazendo pequenos furtos e traficando drogas. Em uma dessas situações, ele conhece Rosa (Loren), uma ex-prostituta que cuida dos filhos de suas ex-colegas de profissão.
Grandes guerras acabaram, mas a guerra particular de cada um permanece como um todo. Se por um lado há pessoas que sobrevivem mesmo carregando as cicatrizes vindas do passado, do outro, há também aquelas que enfrentam os obstáculos corriqueiros do dia a dia, mas que podem se tornar uma grande armadilha. "Rosa e Momo" (2019) é um filme que fala sobre duas pessoas distintas uma da outra, mas cuja as mesmas, com suas guerras particulares, as unem para sobrevirem ao longo do percurso.
Dirigido por Edoardo Ponti, o filme a história de uma sobrevivente do holocausto chamada Madame Rosa (Sophia Loren), que responsável por cuidar de uma creche, decide acolher uma criança de 12 anos chamado Momo (Ibrahima Gueye) que a assaltou recentemente. A partir dessa união se tem uma relação incomum.
Com um prólogo que nos faz a gente se perguntar o que está acontecendo, Edoardo Ponti procura antes de tudo em nos apresentar o cenário principal, uma cidade da Italiana bonita com cores quentes, mas não escondendo resquícios de um país que ainda carrega as suas feridas devido a Segunda Guerra. Em um determinado cenário, por exemplo, do qual se encontra escondido em um prédio, se vê ali uma pequena homenagem que o realizador faz aos tempos do Neorrealismo italiano e cujo movimento retratava uma Itália se reestruturando em meio aos escombros. Por conta disso, é mais do que natural a presença de Sophia Loren na tela.
Afastada há uma década do cinema, Sophia retorna com estilo e força na construção de uma personagem complexa, mas cuja as suas cicatrizes vistas em seu olhar, além de uma determinada tatuagem com números em seu braço, nos dá uma dimensão do que ela havia sofrido. Ao acolher crianças abandonadas de suas mães, a sua personagem Rosa procura fazer o mesmo o que haviam feito por ela no passado, mas não escondendo cansaço perante uma realidade de mudanças constantes.
Através de Momo ela enxerga uma forma de se sentir útil, mesmo quando o garoto não deseja ser acolhido. Aliás, Momo não é muito diferente da explosiva Benni do filme alemão "Transtorno Explosivo" (2020), já que ambos são jovens abandonados pela sociedade e não conseguindo o espaço que realmente mereciam. Porém, Momo desce a guarda para os adultos que tentam ajuda-lo, mesmo quando o mesmo retribui com insultos, pois é a única forma dele expressar os seus sentimentos.
Curiosamente, Edoardo Ponti procura não julgar os seus personagens que surgem na tela, mas sim retratá-las como pessoas comuns que sobrevivem com o pouco que tem, mas felizes com o que pode compartilhar. Neste último caso temos Lola (Abril Zamora), personagem secundária, mas que rouba a cena toda vez que surge na tela. Não sabemos, por exemplo, no que ela trabalha para sobreviver, mas basta ela fazer companhia para Rosa para desejarmos que ela continue na história e se tornando peça fundamental para haver um equilíbrio entre a sua amiga e Momo.
Com um final previsível, mas do qual já estávamos esperando, "Rosa e Momo" fala sobre amizades de pessoas diferentes uma da outra, mas cuja essa distinção é o que as atraem e nascendo assim laços fortes perante as adversidades.
Onde Assistir: Netflix.