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Sapucaia do Sul/Porto Alegre, RS, Brazil
Sócio e divulgador do Clube de Cinema de Porto Alegre, frequentador dos cursos do Cine Um (tendo já mais de 100 certificados) e ministrante do curso Christopher Nolan - A Representação da Realidade. Já fui colaborador de sites como A Hora do Cinema, Cinema Sem Frescura, Cinema e Movimento, Cinesofia e Teoria Geek. Sou uma pessoa fanática pelo cinema, HQ, Livros, música clássica, contemporânea, mas acima de tudo pela 7ª arte. Me acompanhem no meu: Twitter: @cinemaanosluz Facebook: Marcelo Castro Moraes ou me escrevam para marcelojs1@outlook.com ou beniciodeltoroster@gmail.com

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segunda-feira, 12 de outubro de 2020

Cine Dica: 'Acossado’, de Godard, é homenageado no Festival Varilux de Cinema Francês

 FILME FUNDADOR DA NOUVELLE VAGUE COMPLETA 60 ANOS E SERÁ EXIBIDO NOS CINEMAS NA PROGRAMAÇÃO DO FESTIVAL

O clássico homenageado na 11ª edição do Festival Varilux de Cinema Francês completa 60 anos em 2020: “Acossado”, filme de estreia de Jean-Luc Godard, um dos integrantes da Nouvelle Vague. Lançado em 1960, o longa foi protagonizado pelo estreante Jean-Paul Belmondo e pela atriz norte-americana Jean Seberg, que se tornaria uma das musas do movimento.  O Festival Varilux acontece entre 19 de novembro e 3 de dezembro em cinemas de todo o Brasil.

Na trama, o anti-herói Michel Poiccard (Belmondo), um jovem de 26 anos, rouba um carro e mata um policial durante a fuga de Marselha para Paris. Ele se apaixona por Patricia Franchini (Seberg), uma linda garota americana que vende jornais na Champs-Élysées. Poiccard tenta persuadi-la a fugir com ele para a Itália, sem lhe contar que é foragido da justiça. No entanto, por ter matado o policial, Michel passa a ser procurado pela polícia e seu rosto acaba estampado em todos os jornais. Acuado, se esconde enquanto tenta traçar um plano que o levará até Roma, onde acredita que estará seguro.

Além das cenas que mostram o caos das ruas parisienses, o filme também centra, em boa parte, na intimidade do casal. Num quarto de hotel, os dois passam as noites juntos e dividem intensos diálogos, diversificando momentos de tédio e de paixão.

“Acossado” foi filmado em menos de quatro semanas, com cenas de rua feitas sem permissão oficial. Godard produziu o roteiro do filme enquanto as filmagens já aconteciam, e costumava a escrever as cenas na manhã do dia em que seriam filmadas. Com o objetivo de registrar uma maior espontaneidade, o cineasta só apresentava o texto aos atores conforme o andamento das gravações, revolucionando os paradigmas do cinema da época.


O Festival Varilux de Cinema Francês 2020

Um clássico e 16 longas-metragens inéditos e recentes (2019/2020) da cinematografia francesa integram a seleção do Festival Varilux 2020. Entre eles, um documentário e 15 longas de ficção com gêneros como comédia, drama e animação. Ainda não há um número definido de cidades e de cinemas participantes. Devido à pandemia do coronavírus, alguns cinemas terão a opção de programar o festival em datas diferentes - até o final de fevereiro de 2021. O importante, de acordo com a Bonfilm, produtora do evento, é que os filmes cheguem ao público em todo Brasil e contribuem para a retomada dos cinemas do país.

O patrocinador principal é o grupo Essilor Varilux e seu apoio se dará por meio da Lei Federal de Incentivo à Cultura. O festival conta também com o apoio da Embaixada da França, das Alianças Francesas do Brasil e da Unifrance. Outros parceiros são Ingresso.com, Club Med e Dispositiva, por meio da Lei Municipal de Incentivo à Cultura do Rio de Janeiro.


Sobre a Bonfilm

Produtora e distribuidora, a Bonfilm é realizadora do Festival Varilux de Cinema Francês, que completou dez anos em 2019. Sucesso de público e mídia, o evento esteve no ano passado em 86 cidades e 23 estados brasileiros. Nesses dez anos foram realizadas cerca de 35 mil sessões e somou um público de mais de um milhão de espectadores (1.064 milhão).  Desde 2015, a Bonfilm realiza também o festival de filmes ópera "Ópera na Tela" ao ar livre no Rio de Janeiro e em cinemas de todo Brasil. Em 2019 promoveu uma primeira edição em São Paulo.


Sobre a Essilor 

Líder mundial em lentes oftálmicas para óculos, a Essilor International cria desenhos, produz e comercializa uma vasta gama de lentes corretivas.  Sua missão é melhorar vidas através da visão. Para cumprir esta missão, a empresa investe anualmente 200 milhões de euros em pesquisa e desenvolvimento e seu espírito inovador foi atestado pela revista norte americana Forbes onde figurou por oito anos consecutivos, até 2018, no ranking das 100 Empresas Mais Inovadoras do Mundo. Além disso, em 2015 a companhia foi listada entre as 50 empresas da FORTUNE's Change the World List. As marcas mais emblemáticas da Essilor International são: a lente multifocal Varilux®, a fotossensível Transitions®, o antirreflexo Crizal®, a lente solar polarizada Xperio®, a antiembaçante Optifog™, a lente Eyezen™ que reduz o esforço ocular na leitura em telas, e, lançada em 2019, a lente com proteção dupla contra raios UV e luz azul-violeta nociva Blue UV Filter™. 

A empresa também desenvolve e comercializa equipamentos, instrumentos e presta serviços aos atuantes no mercado óptico.  



Fonte: Curta!

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sexta-feira, 9 de outubro de 2020

Cine Especial: Revendo 'Fim dos Tempos' Nestes Novos Tempos

Pode-se dizer que o clássico "O Sexto Sentido" (1999) se tornou uma dádiva e ao mesmo tempo uma maldição para a carreira de M. Night Shyamalan. Devido ao estrondoso sucesso, cujo seu final pegou todo mundo desprevenido, muitos cinéfilos começaram a exigir algo que superasse tudo aquilo. Porém,  Shyamalan foi por um caminho inverso.

Navegando no universo de HQ em "Corpo Fechado" (2000), para invasão de alienígenas em "Sinais" (2002), o cineasta foi cada vez mais experimentando outros gêneros, mas que falasse um pouco sobre o que acontecia no mundo de tempos em tempos. "A Vila" (2004), por exemplo, pode ser interpretado como uma representação da paranoia norte americana após os eventos do 11 de Setembro, mas muitas pessoas da época não se deram conta disso.

Devido ao fato de o público não compreender as suas ideias criativas, Shyamalan foi cada vez mais decaindo e se enveredando na realização de Blockbuster descartáveis. Felizmente o cineasta deu a volta por cima no seu pequeno projeto "A Visita" (2015) e nos surpreendendo com "Fragmentado" (2016) e "Vidro" (2019) que encerra uma espécie de trilogia iniciada em "Corpo Fechado". Porém, antes de tudo isso, Shyamalan havia lançado o que talvez seja o seu filme mais incompreendido que foi "Fim dos Tempos" (2008), mas que merece ser revisto principalmente nestes tempos atuais em que vivemos.

O filme começa com estranhas mortes que ocorrem em várias das principais cidades dos Estados Unidos. Elas coincidem em dois pontos: desafiam a razão e chocam pelo inusitado com que ocorrem. Sem saber o que está ocorrendo, o professor Elliot Moore (Mark Wahlberg) apenas quer encontrar um meio de escapar do misterioso fenômeno. Apesar dele e sua esposa Alma (Zooey Deschanel) estarem em plena crise conjugal, os dois decidem partir para as fazendas da Pensilvania juntamente com Julian (John Leguizamo), um professor amigo de Elliot, e Jess (Ashlyn Sanchez), a filha dele de 8 anos. Lá eles acreditam que estarão a salvo, mas logo se revelando um grande erro.

O grande problema do cinemão norte americano é fazer com que público cinéfilo se acostume mal com o óbvio, ou seja, tudo mastigadinho e previsível. Naqueles tempos era comum ter filmes apocalípticos de zumbis, invasões espaciais ou fim do mundo causado por alguma catástrofe natural. Porém, o grande vilão do filme de Shyamalan é algo invisível, que pressentimos sua presença somente pelo vento das folhas e deixando as pessoas enlouquecidas e com o desejo de se matarem. Simples e direto, mas que não caiu no gosto do público acostumado com show de luzes a todo momento.

Porém, revisto hoje, é interessante como o filme acaba obtendo certa similaridade com os tempos de coronavírus que todos nós estamos enfrentando. O mal que acontece contra as pessoas na trama, por exemplo, somente ocorre se muitas se encontram aglomeradas em determinado ponto e causando então as mortes iminentes. Soa familiar?

Curiosamente, o filme retrata uma sociedade norte americana meio que imbecil perante uma situação que não consegue compreender, mas que logo vai abraçando a primeira teoria de conspiração que se tem a vista.  Pode-se se dizer então que M. Night Shyamalan criou uma espécie de filme premonitório sobre uma sociedade que abraça a mentira ao invés de usar o raciocínio para compreender sobre o que realmente ocorre no mundo em volta. A primeira cena de Eliot, por exemplo, onde ele explica para os seus alunos sobre as principais mudanças que ocorrem na natureza, nos faz imediatamente pensar sobre o ocorre hoje em dia.

Mas, embora o tempo tenha ajudado para que o filme fosse melhor compreendido, ele ainda possui alguns defeitos e um deles é justamente Mark Wahlberg. Elogiado por alguns e odiados por muitos, Wahberg não escapa aqui de sua inevitável canastrice, mesmo quando ela não atrapalha o desenvolvimento da trama. Os demais coadjuvantes também não são lá essas coisas, mas que neste caso destaco Betty Buckley, que voltaria a trabalhar com o cineasta em "Fragmentado" e que aqui interpreta uma mulher eremita assustadora devido a sua presença.

Em suma, reveja "Fim dos Tempos" com um novo olhar e perceba que M. Night Shyamalan estava muito mais a frente de nós do que a gente podia imaginar. 


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quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Cine Dica: Próximo Cine Debate: 'MULHER'

 

O documentário Mulher (2020) será comentado  por Camila Groch no dia 13.10.2020 das 19h  30min às 21h na Plataforma do Google Meet.  

O documentário entrevistou duas mil mulheres em cinquenta países. Um retrato de milhares de vozes que representam metade da população mundial. Um filme sobre amor, respeito e lugar no mundo. O documentário está disponível em: https://www.filmelier.com/pt/br/film/10159/mulher (escolha a plataforma que deseja assistir e faça o pagamento).

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

Cine Especial: 'Buster Keaton' - humor e perfeccionismo

Os primórdios do cinema foi uma época em que não se tinha grandes recursos na elaboração de gêneros como, por exemplo, aventura ou ficção científica. Porém, o mago Georges Méliès usando recursos que ele mesmo usava em seus espetáculos, se tornou pioneiro ao elaborar histórias mirabolantes e inserindo nelas efeitos visuais até então inéditos para o cinema. Isso serviu de pontapé inicial para o surgimento de cineastas que se arriscaram na elaboração de cenas, por vezes, impossíveis de serem feitas e desses pioneiros se encontra Buster Keaton.

Embora esteja ao lado dos grandes comediantes da época como, por exemplo, Charles Chaplin e Harold Lloyd, Keaton se diferenciava pela sua obsessão pelo perfeccionismo, para que as cenas não se tornassem meramente engraçadas, como também pudessem se casar com a proposta principal da obra. A proposta, aliás, não era somente nos fazer rir, como também desafiar as nossas expectativas. O resultado foi na realização de curtas e longas metragens que, na maioria dos casos, o público não estava preparado com o que seria visto na tela e se tornado obras até mesmo a frente do seu tempo.

O que torna essas obras indispensáveis para qualquer olhar cinéfilo, é o fato de Keaton ter, em alguns casos, se arriscado na execução de determinadas cenas. Pegamos, por exemplo, o seu primeiro longa metragem intitulado "As Três Idades" (1923). Na tentativa de saltar entre dois edifícios com uma placa de madeira tornou-se uma acrobacia ainda mais curiosa depois de um desvio quase mortal de percurso. Keaton errando a distância do teto chocou-se feio contra a parede de tijolos e caiu em uma rede de proteção que não impediu o ator de se machucar e ficar em repouso por alguns dias.

Quando Keaton viu a cena, já que os operadores de câmera recebiam instruções de nunca parar de filmar, independente dos acidentes que pudessem ocorrer, Keaton decidiu deixar o problemático salto na versão final do longa e acrescentar a seqüência em que ele cai por toldos e se agarra em um cano solto para ser arremessado por uma das janelas. O resultado impressiona até mesmo nos dias de hoje e nos faz lembrar do recente caso em que Tom Cruise quebrou o pé ao pular de um prédio para o outro no recente Missão Impossível – Efeito Fallout.

Portanto, é notório que Buster Keaton se tornou, não só um perfeccionista na realização de suas cenas, como também pioneiro ao participar delas sem ajuda de um dublê nas cenas perigosas. No meu entendimento, o cineasta/intérprete queria que as cenas não provocasse somente um riso fácil, como também transmitir uma verossimilhança que nenhum outro recurso de ponta na época pudesse obter, então, o mesmo resultado. Através desse pensamento, chegamos as duas de suas maiores obras primas: "Sherlock Junior" (1924) e "A General" (1926).

No primeiro, Keaton está projetando um filme numa tela do cinema. O mesmo dorme e começa a sonhar que está se dirigindo na tela e entrando dentro dela. Aqui, Keaton usa os recursos da câmera como ninguém, ao usar imagens sobrepostas uma na outra e obtendo um resultado extraordinário. Ao vermos o próprio entrar na tela do cinema não me surpreenderia, por exemplo, se Woody Allen tivesse se inspirado em Buster Keaton na realização do seu filme A Rosa Púrpura do Cairo.

Mas sua obra prima realmente  é "A General". No filme, Keaton é apaixonado por sua locomotiva chamada General, e também por Annabelle Lee (Marion Mack). Durante a Guerra da Secessão, General e Annabelle são raptados por espiões da União e Johnnie tentará salvá-las em uma aventura através da ferrovia.

Orson Welles (Cidadão Kane) jamais escondeu o seu entusiasmo com relação A General. Em sua opinião, “é o filme de guerra mais incrível já feito”, assim como afirma que “Keaton é o melhor e mais importante diretor e ator”.  Mesmo a gente estando em pleno século 21, o filme impressiona por seqüências mirabolantes, cujos planos abertos sintetizam a grandiosidade da obra como um todo e servindo de inspiração até mesmo para George Miller realizar a sua obra prima "Mad Max: Estrada da Fúria" (2015).

Por ser uma obra a frente do seu tempo, A General foi um fracasso de público e crítica na época, já que ambos os casos queriam ir ao cinema para rir e não para assistir um filme sobre a Guerra Civil Americana. Infelizmente isso foi o começo de uma derrocada que faria com que sua reputação não tivesse o mesmo prestígio por quase 20 anos. Porém, a justiça tarda, mas não falha.

No ano de 1962, no festival na França, Keaton recebeu uma homenagem, onde as suas obras foram recuperadas e tendo suas versões restauradas. Entre o final dos anos 50, e o início dos anos 60, o público francês possuía um gosto cada vez mais apurado pelo cinema e enxergando em diversas obras um conteúdo autoral e do qual nem mesmo os americanos conseguiam enxergar. Esse mesmo público viu nas obras de Buster Keaton um cinema autoral a frente do seu tempo, onde os movimentos de câmera, a qualidade de fotografia, edição e montagem encantaram uma nova geração que não o conhecia até então.

Buster Keaton viria a falecer 1 de fevereiro de 1966 aos 71 anos. Antes disso ele viria a retornar em algumas produções para o cinema e programas de TV, onde ele estrelaria como ele mesmo, ou melhor, com seu personagem “o homem sério”. Desses retornos eu sempre me lembrarei com carinho de sua participação no clássico “Luzes da Ribalta”(1952), de Charles Chaplin, onde os dois grandes mestres do cinema contracenaram juntos em uma cena inesquecível.

Buster Keaton se foi há muito tempo, mas a sua obra continuará eterna como um todo.



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terça-feira, 6 de outubro de 2020

Cine Especial: 'O Outro lado do Vento' - Um acontecimento cinematográfico atemporal.


Nos primeiros anos do cinema nem se falava no termo “cinema autoral”, já que, para a maioria dos engravatados dos estúdios, filmes são mais para entretenimento e gerar um bom lucro. Claro que, aos poucos, foram surgindo cineastas que se destacam por cenas elaboradas, perfeccionistas e ganhando até mesmo respeito daqueles produtores que se achavam os donos do jogo. Orson Welles foi um rebelde com uma causa pessoal que emergiu em meio às engrenagens do sistema hollywoodiano e do qual fez questão de criar uma visão autoral em seus filmes, mesmo a contra gosto dos donos dos estúdios.

Quando "Cidadão Kane" (1941) foi lançado, Welles tinha somente 29 anos, mas parece um veterano, ao ponto de realizar um conteúdo até mesmo imprevisível naquele momento. Além de movimentos de câmera até então inéditos naquele ano, o jovem cineasta teve a capacidade de até mesmo elaborar um início de trama que transita entre o documental e a ficção. A frente do seu tempo, o filme viria a ganhar somente um Oscar de melhor roteiro, mas não demorou em se tornar um dos melhores filmes de todos os tempos.

Porém, Welles jamais teve novamente uma liberdade na realização de suas obras, ao ponto de sempre brigar com os produtores e gerando danos irreversíveis. "A Dama de Xangai" (1947), por exemplo, foi um fracasso na época do seu lançamento, mas se tornando melhor apreciado nos anos seguintes. E se por um lado o 3º Homem (1949) ele se destacou somente pela sua bela atuação, "A Marca da Maldade" (1958) ele voltaria a ter o vislumbre do gosto de realizar uma obra prima, mesmo tendo as famigeradas desavenças com os produtores na área.

Após anos vivendo na Europa e longe da ditadura do sistema hollywoodiano, Orson Wells embarcaria no seu mais complexo projeto no início dos anos 70, intitulado "O Outro lado do Vento", mas do qual ele próprio jamais iria ver a sua obra ser lançada nos cinemas. Com um tempo de produção de um total de seis anos, o cineasta levou mais um par de anos durante a sua pós-produção e tendo obtido na montagem somente 40 minutos de projeção. Há quem diga que ele rodou mais de 100 horas de filme, mas nunca estando satisfeito com o que ele via e despertando a ira dos produtores.

Iniciou-se uma disputa legal pelos direitos do projeto, o que forçou Welles em armazenar todo o material bruto num cofre em Paris e o filme, enfim, acabou sendo esquecido. Orson Welles viria a morrer em 10 de outubro de 1985 e acreditando que For Fake – "Verdades e Mentiras" (1974) seria a sua última obra a ser lançada no cinema. Porém, a justiça tarda, mas não falha.

A toda poderosa Netflix viria a conseguir os direitos de exibição do filme em sua plataforma. Com 100 horas de material farto, os produtores obtiveram ainda os 40 minutos de montagem que o próprio Welles havia feito. No total, o filme acabou sendo lançado na plataforma com um corte final de 2h02min e, para alguns, foi o mais próximo da visão que o cineasta queria obter para o seu projeto.

Verdade seja dita: "O Outro lado do Vento" é tão complexo quanto à maneira em que ele foi desenvolvido. Se formos simplificar, o filme acompanha um dia da vida do cineasta J.J. Jake Hannaford (John Huston) e que embora tenha grande talento, ao mesmo tempo, enfrenta problemas para concluir seu último projeto, “O Outro Lado do Vento”, devido ao abandono repentino do protagonista, John Dale (Robert Random). Com o orçamento estourado e a pressão de executivos de Hollywood, Hannaford comemora seu aniversário em meio a amigos e detratores, exibindo aos presentes o que já filmou até aquele preciso momento.

Observasse aqui, então, que estamos diante de uma obra que transita entre a ficção e o real, já que o cineasta da trama é, obviamente, o alter ego de Orson Welles. Porém, o filme vai muito mais além, pois os minutos iniciais, por exemplo, remete os primeiros minutos de Cidadão Kane, onde o teor documental surpreende pela sua verossimilhança e demonstrando uma total segurança com a sua câmera. Câmeras, aliás, é o que mais se vê no decorrer do filme, já que há repórteres, jornalistas e paparazzis surgindo a todo o momento ao querer fazer um trabalho sobre o cineasta e a sua cria.

Isso faz com que a nossa atenção fique redobrada, já que são tantos acontecimentos que ficam acontecendo na tela que corremos um sério risco de nos perdemos em meio às diversas cenas. Com uma montagem frenética, o filme também transita numa fotografia em preto e branco com as cores quentes dos tempos dos anos 70. Mas o ápice dessa salada cinematográfica é que estamos realmente diante de um filme dentro de um filme e do qual sintetiza toda a calamidade que foi para a realização dessa produção.

Pegando carona com o movimento da Nova Hollywood, Orson Welles parece querer agir como um jovem cineasta daquele tempo, do qual está mais interessado em fazer uma obra experimental do que tendo a intenção de concluí-la como um todo. Isso é perceptível quando dois personagens, por exemplo, estão analisando o filme do cineasta J.J. Jake Hannaford e chegando a conclusão de que os rolos de filme parecem estar fora de ordem. É aí que alguém dispara….”isso importa?”

Depois de anos sofrendo nas mãos do sistema hollywoodiano, Orson Welles, talvez, estaria pouco interessado em apresentar uma trama linear e previsível, mas sim a moldando para se fazer uma forte crítica a própria máquina do entretenimento. Isso é perceptível na própria figura J.J. Jake Hannaford, que mais parece estar interessado em brincar contra aqueles que sempre lhe sugaram do que entregar um projeto propriamente dito. Os derradeiros minutos finais nos faz a gente se dar conta de que a trama, enfim, é o próprio Welles nos dizendo que temos a livre espontânea vontade de amar ou odiar a sua obra, pois uma vez concluída a gestação cabe o tempo julgar se toda essa encruzilhada foi realmente necessária.

"O Outro lado do Vento" é o exemplo de como Orson Welles era o típico rei fora do jogo de xadrez e nós temos mais do que agradecer.


Onde Assistir: Netflix 

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segunda-feira, 5 de outubro de 2020

Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: ' O Dilema das Redes'

Sinopse: O Dilema das Redes. Especialistas em tecnologia e profissionais da área fazem um alerta: as redes sociais podem ter um impacto devastador sobre a democracia e a humanidade. 

Devido aos inúmeros escândalos propagados pelas fake news envolvendo diversos governos ao redor do mundo era inevitável que o cinema não ficaria para trás para debater sobre isso. Se por um lado o documentário "Privacidade Hackeada" (2019) escancara os responsáveis pela armação virtual que elegeu Donald Trump para a presidência dos EUA, do outro, a ficção "Rede de Ódio" é uma síntese sobre as inúmeras nações saindo do controle unicamente por serem persuadidas pelas mentiras virtuais criadas pelo submundo do crime cibernético. "Dilema das Redes" vai ainda mais a fundo, ao entrevistar pessoas que já haviam trabalhado nas redes sociais e revelando como as mesmas interferem em nosso dia a dia.

Dirigido por Jeff Orlowski, o documentário "O Dilema das Redes" nos mostra como os magos da tecnologia possuem o controle sobre a maneira em que pensamos, agimos e vivemos. Frequentadores do Vale do Silício revelam como as plataformas de mídias sociais estão reprogramando a sociedade e sua forma de enxergar a vida. O resultado é uma "Matrix" dentro da "Matrix".

Não é muito exagero comparar esse documentário com o clássico dirigido pelas irmãs Wachowski, pois a obra escancara o fato que somos controlados por uma rede de informações a todo momento. Se por um lado as redes sociais deram um passo a frente em termos de comunicação, do outro, foram responsáveis pela disseminação de ódio que anda aumentando dia após dia nos últimos anos e desencadeando danos irreversíveis na medida em que o tempo vai passando. O grande charme da obra, por exemplo, é vermos pessoas envolvidas na criação das principais redes sociais do mundo, mas admitindo que ninguém imaginava o quanto isso teria o seu lado negativo.

Curiosamente, o documentário transita entre as entrevistas para uma ficção, onde nos é apresentado uma família que sofre com o vício dos celulares e como esse problema afeta o dia a dia de cada um deles. O grande acerto do documentário é também escancarar as principais potências do mundo terem sido afetadas pelas fake news e gerando governos que antes pareciam impossíveis de serem imaginados. O ápice da obra é vermos a lista dos principais países do mundo sendo afetados pelas redes da mentira e nem preciso dizer que o Brasil lidera esta questão com a cara de Bolsonaro saltando da tela.

Com pouco mais de uma hora e meia, "O Dilema das Redes" nos mostra os fatos, mas não nos dando uma solução fácil sobre a questão das fake news e fazendo com que a nossa visão com relação ao futuro se torne cada vez mais incerto. 


Onde Assistir: Netflix  

NOTA: O filme fez parte da última Live Cinema Para Pensar. 



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quinta-feira, 1 de outubro de 2020

Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: 'Enola Holmes'

 Sinopse. O filme narra as aventuras da irmã mais nova de Sherlock Holmes, Enola. 

Basta você nascer para já conhecer Sherlock Holmes, talvez um dos personagens mais conhecidos da literatura e que nos últimos tempos teve novas adaptações para outras mídias como, por exemplo, "Sherlock Holmes" (2009) para o cinema ou a série "Sherlock" (2010) que colocava o personagem nos dias atuais. Porém, não faltam ideias criativas para trazer o personagem de volta diversas vezes, principalmente quando se pode dialogar com a gente com relação ao cenário político de ontem e hoje, mas de uma forma leve e que atraia todas as idades. "Enola Holmes" segue bem esse meu raciocínio, ao apresentar uma nova personagem dentro do universo do personagem detetivesco e conquistando assim novos fãs.

Baseado na obra de Nancy Springer, e dirigido por Harry Bradbeer, o filme conta a história de  Enola Holmes (Millie Bobby Brown),  uma adolescente cujo irmão, 20 anos mais velho, é o renomado detective Sherlock Holmes (Henry Cavill). Quando sua mãe (Helena Bonham Carter) desaparece, fugindo do confinamento da sociedade vitoriana e deixando dinheiro para trás para que ela faça o mesmo, a menina inicia uma investigação para descobrir o paradeiro dela. Ao mesmo tempo em que precisa ir contra os desejos de seu irmão, Mycroft (Sam Claflin), que quer mandá-la para um colégio interno só de meninas.

Para não repetir a fórmula de outras adaptações, "Enola Holmes" já começa diferente do habitual, ou seja, a protagonista começa a falar com a gente sobre a sua origem e quebrando assim a quarta parede. Esse momento, aliás, irá se repetir diversas vezes, mas não se tornando cansativo graças a boa atuação da jovem atriz Millie Bobby Brown. Pode-se dizer que ela vai cada vez mais se afastando da imagem da personagem Eleven "Stranger Things" e do qual ela havia obtido a sua consagração. Por aqui, ela não só carrega todo o filme nas costas, como também nos faz até mesmo esquecer da imagem do seu famoso irmão literário.

Neste último caso, Sherlock é colocado no segundo plano de forma proposital, já que a protagonista é Enola, mas isso não o torna menos importante e Henry Cavill cumpre com louvor o seu trabalho ao dar um pouco mais de humanidade ao personagem. Curiosamente, o filme não tem pressa ao apresentar a origem, tanto da protagonista, como os demais de sua família e que, curiosamente, cada um representa um pensamento diferente com relação ao mundo da política. Se por um lado Holmes jamais quis adentrar nesta questão, por outro lado, tanto a sua mãe como o seu irmão são dois lados da mesma moeda, sendo que esse último é uma representação de interesses em manter o conservadorismo da Inglaterra.

Curiosamente, o filme se economiza na ação e dando mais espaço para o debate político da época, como no caso, por exemplo, o papel do feminismo daqueles tempos, mas dialogando com o mesmo assunto sobre os dias atuais em que vivemos. Por conta disso, é fácil as jovens de hoje se identificarem com Enola, principalmente por ela ser uma personagem em busca de sua independência em uma época em que as mulheres ainda sofriam com o conservadorismo e preconceito vindo dos homens. Mas para aqueles que acham que esse debate torna o filme monótono se enganam, pois a obra possui uma edição bastante ágil, onde o passado e presente se entrecruzam a todo momento, além de uma fotografia e edição de arte caprichada e que enche os nossos olhos.

Embora seja uma trama que possua começo, meio e fim, é notório que há em seu ato final alguns elementos que nos dá uma ligeira sensação que não será a última vez que veremos Enola Holmes. Obviamente a Netflix deseja fazer uma franquia de sucesso em sua grade, mas para obter isso, basta manter o que funcionou nesta primeira aventura e que pode sim muito a nos oferecer a longo prazo. "Enola Holmes" é uma grata surpresa para quem achava que as ideias vindas do universo literário de Sherlock Holmes haviam se esgotado e provando que sempre pode se conquistar um novo público. 

Onde Assistir: Netflix. 

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