Sinopse: Um ator e diretor de teatro é convidado a encenar O Tio Vânia de Tchécov num festival de teatro em Hiroshima. No carro em que se desloca, conduzido pela discreta jovem Misaki, Kafuku confronta-se com o passado e o mistério sobre a sua mulher.
O diretor Ryusuke Hamaguchi gosta de explorar sobre personagens solitários, cuja a principal busca dos mesmos está em querer ser ouvido além de ouvir o próximo. No seu recente filme "Roda do Destino" (2022), por exemplo, assistimos a três histórias distintas, mas que ambas falam sobre pessoas em busca de um significado na vida, além de fazer as pazes com o passado através de outras pessoas. "Drive My Car" (2021) é poderoso em todos os sentidos, ao aproximar os personagens centrais através de suas dores e necessidades, mas que no final irão se completarem.
Adaptado de um conto de Haruki Murakami, o filme segue duas pessoas solitárias que encontram coragem para enfrentar o seu passado. Yusuke Kafuku (Hidetoshi Nishijima) é um ator e diretor de sucesso no teatro, casado com Oto (Reika Kirishima), uma mulher muito bonita, porém também uma roteirista com muitos segredos, com que divide sua vida, seu passado e colaboração artística. Quando Oto morre repentinamente, Kafuku é deixado com muitas perguntas sem respostas de seu relacionamento com ela e arrependimento de nunca conseguir compreendê-la completamente. Dois anos depois, ainda sem conseguir sair do luto, ele aceita dirigir uma peça no teatro de Hiroshima, embarcando em seu precioso carro Saab 900. Lá, ele conhece e tem que lidar com Misaki Watari (Toko Miura), uma jovem chauffeur, com que tem que deixar o carro. Apesar de suas dúvidas iniciais, uma relação muito especial se desenvolve entre os dois.
Com três horas de duração, Ryusuke Hamaguchi não tem pressa em apresentar e desenvolver os seus personagens principais, mas sim deseja que a gente embarque na história e que sejamos levados por ela. Se em um primeiro momento o diálogo do casal central na abertura da trama possa soar estranho, aos poucos, as respostas vêm à tona e sendo tudo moldurado com relação ao universo do teatro e que serve de energia de impulso para os personagens centrais. Quanto Oto sai de cena a melancolia domina Yusuke, pois a culpa lhe corrói, mas cuja a dor ameniza quando surge uma nova forma de redenção.
Redenção essa que vem não somente pelo fato dele conseguir a oportunidade de dirigir uma peça de teatro, como também a partir do momento em que conhece a motorista Misaki Watari. A personagem, aliás, talvez seja a melhor e a mais enigmática personagem da trama, pois pelo seu olhar profundo e cicatrizes no seu rosto constatam o fato dela possuir um passado nebuloso e que somente aos poucos será revelado. Ambos acabam se alinhando com relação a dores e perdas e cujos os sentimentos serão colocados para fora em momentos em que os dois revisitam os seus passados não resolvidos.
Curiosamente, a relação entre os dois é construída a partir de ótimos diálogos e cuja a maioria acontecem dentro do carro. Um artificio que foi muito utilizado, por exemplo, pelo cineasta iraniano Abbas Kiarostami, cuja as suas maiores obras os protagonistas dirigem um carro e dialogando com personagens ao lado. Curiosamente, neste filme há um diálogo revelador que acontece no banco detrás do veículo em um determinado momento do filme, sendo que dois personagens se revelam não somente através de palavras, como também de olhares que tem mais a dizer do que se possa imaginar.
No final das contas, é um filme que fala sobre a solidão cada vez mais acentuada na vida das pessoas hoje em dia, cujo os sentimentos na maioria das vezes não são revelados por medo, quando na verdade é preciso ser revelados no momento certo. Ao final da projeção, os personagens centrais obtiveram a sua redenção, mesmo que para isso tenha sido necessário revirar certos escombros do passado e cuja as revelações não podem as vezes serem encaradas sozinho. "Drive My Car" é sobre uma cruzada humana cheia de dor, porém, de grande recompensação em sua reta final.
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