Sinopse: Desde sua ascensão ao estrelato, o ícone do rock Elvis Presley mantém um relacionamento complicado com seu enigmático empresário, Tom Parker, por mais de 20 anos.
Baz Luhrmann tem poucos títulos no seu currículo, mas o suficiente para ter chamado atenção de muitos no decorrer dos anos. Em "Romeu e Julieta" (1996) ele atualizou o clássico de William Shakespeare para os tempos contemporâneos, mas mantendo as raízes shakespearianas e agradando assim diversos públicos. Já em "Moulin Rouge" (2001) ele provou que uma superprodução musical ainda tinha poder para atrair a massa cinéfila e com isso vieram na esteira outros grandes sucessos como "Chicago" (2002) de Rob Marshall e "Os Miseráveis" (2012) de Tom Hooper.
Porém, acima de tudo, Baz Luhrmann sendo um diretor autoral jamais se vendeu para os gêneros de sucesso do momento, mesmo quando os mesmos estavam fazendo barulho e trazendo lucro para os grandes estúdios. Felizmente as cinebiografias de grandes músicos do passado começaram a fazer sucesso inesperado nos últimos tempos, como no caso, por exemplo, de "Bohemian Rhapsody" (2018) e fazendo com que Luhrman se interessasse por um projeto que estava engavetado por muito tempo. Assim nasceu "Elvis" (2022), superprodução da Warner que reconta sobre a vida e a obra desse grande músico e os motivos que o levaram sair de cena de forma trágica e prematura.
A cinebiografia de Elvis Presley acompanhará décadas da vida do artista (Austin Butler) e sua ascensão à fama, a partir do relacionamento do cantor com seu controlador empresário "Coronel" Tom Parker (Tom Hanks). A história mergulha na dinâmica entre o cantor e seu empresário por mais de 20 anos em parceria, usando a paisagem dos EUA em constante evolução e a perda da inocência de Elvis ao longo dos anos como cantor. No meio de sua jornada e carreira, Elvis encontrará Priscilla Presley (Olivia DeJonge), fonte de sua inspiração e uma das pessoas mais importantes de sua vida.
Assim como foi em suas obras anteriores, Baz Luhrmann usa e abusa do lado técnico de como se fazer um filme musical, fazendo da obra um verdadeiro clipão e mantendo a nossa atenção do começo ao fim. Com uma edição frenética, o filme começa com os últimos passos do Rei do Rock, para logo em seguida voltarmos ao passado do cantor e tudo sendo narrado pela voz do empresário Tom Parker e que aqui é brilhantemente interpretado por Tom Hanks. A partir daí, vemos não somente a construção do mito da música, como também uma parte da história norte americana.
No filme, basicamente Elvis é um estranho no ninho em meio a uma realidade norte americana conservadora, da qual os líderes políticos dominam todas as áreas culturais, usando a palavra de Deus e se dizendo responsáveis pela estabilidade democrática do país. Elvis foi construído através da cultura negra, cuja a música da mesma embalava os bairros pobres de várias cidades e alinhada com as músicas gospel que fez levantar a moral de muitos que pediam por socorro. Desses elementos, surgia então um grande talento a frente do seu tempo, que desafiou várias instituições conservadoras e fazendo uma geração de jovens finalmente sair da linha reta e que sempre foram obrigados a se manterem nela.
Tanto a fotografia de cores quentes, como a edição de arte caprichada, sintetiza uma época em que a sociedade norte americana vivia em uma grande realidade plástica e coube Elvis ser um de muitos em furar essa bolha. Não deixa de ser emocionante, por exemplo, ao testemunharmos as reconstituições das primeiras apresentações do cantor, sendo que a primeira dele vista na tv foi algo que gerou um grande estardalhaço e fazendo cutucar a onça com a vara curta de muitos que exigiam uma sociedade norte americana perfeita. Em meio a esse grande circo havia a figura complexa de Tom Parker.
Acusado por muitos como o verdadeiro causador da destruição de Elvis, Tom Parker visto aqui é alguém que tenta jogar pelos dois lados, ao tentar saber agradar o grande músico, mas ao mesmo tempo conter os ânimos da ala branca conservadora de Washington. Baz Luhrmann procura não o retratar como uma figura exatamente vilanesca, porém, humana, ambiciosa e que via no cantor a sua pipita de ouro e da qual poderia mantê-lo no jogo de como se deve prosperar em território norte americano. Tom Hanks entrega aqui a sua melhor performance depois de muito tempo, onde ele consegue construir para o seu Tom Parker uma figura humana, porém, muito ardilosa em suas ações, tanto para si como para o próprio Elvis.
Falando no Rei do Rock o mesmo foi interpretado por diversos atores ao longo das décadas, tanto por Kurt Russell em um telefilme para a tv em 1979 como também pelo ator Val Kilmer em "Amor A Queima Roupa" (1993). Porém, acredito eu, que Austin Butler será por muito tempo o ator definitivo ao dar vida a esse grande talento, já que ele consegue transmitir pelo seu olhar a energia vital que o cantor tinha dentro de si, mas cujo o seu próprio corpo não era suficiente forte para conter. Portanto, tanto o seu auge como a sua queda são muito bem representados por Butler, ao ponto de que quase não conseguimos distingui-lo quando é ele ou quando é o verdadeiro Elvis na reconstituição do seu último show, do qual o mesmo cantou a canção "Unchained Melody" e fechando o filme de uma forma surpreendente e impactante.
"Elvis" é um dos melhores filmes do ano, ao retratar um grande talento em seu ápice e queda em meio a selvageria e mutação de uma sociedade hipócrita norte americana.
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