Sinopse: Em uma cidade do interior, dois amigos começam a ouvir estranhos ruídos na rádio e fazendo com que ambos investiguem algo bem imprevisível.
Os tempos de Guerra Fria durante os anos cinquenta fizeram com que o cinema norte-americano se rendesse aos filmes de ficção científica e que dos quais, vistos hoje, mais parecem metáforas sobre os medos que os americanos tinham com relação a uma possível invasão comunista. "Guerra dos Mundos" (1953), por exemplo, talvez seja o melhor exemplo que sintetize aqueles tempos em que todos viviam paranoicos com uma possível invasão e isso, claro, provocado pela propaganda do governo para que o norte-americano jamais participasse ou fosse um dia do partido comunista. Não é à toa que a versão narrada pelo cineasta Orson Welles pela rádio anos antes, em 1938, deixou todos desesperados, pois a paranoia já estava começando naqueles tempos.
Esse cinema de ficção dos anos cinquenta serviu de modelo para muitos cineastas que que formariam as suas carreiras se inspirando em alguns desses clássicos. George Lucas e Steven Spielberg talvez sejam os melhores representantes desse meu pensamento, sendo que esse último lançou obras primas de grande sucesso e que bebiam da fonte de conhecimento que ele havia acumulado durante a sua juventude. Suas obras como, por exemplo, " Contatos Imediatos de 3º Grau" (1978) e "ET" (1982) possuem inúmeras referências do cinema de ficção dos anos cinquenta e quem for cinéfilo de carteirinha pode muito bem pegar inúmeras homenagens em diversas cenas.
Nos últimos dez anos, tanto o cinema como a música vivem uma espécie de nostalgia, como se aquela geração dos anos oitenta, que cresceu vendo filmes como aqueles criados por Steven Spielberg, aclamassem pelo retorno dessa época. Não é à toa que filmes como "Guardiões da Galáxia" (2014), ou a série "Stranger Things" iniciada em 2016, resgatam um pouco dessa aura mais colorida, inocente e recheada de cultura pop que serviria de modelo para futuros novos talentos cinematográficos. É aí que chegamos ao filme "A Vastidão do Mundo" filme que bebe da fonte de duas épocas distintas, mas que se entrecruzam e formando assim um grande ar de nostalgia.
Dirigido pelo desconhecido Andrew Patterson, o filme se passa durante a Guerra Fria. Enquanto acontece a corrida espacial entre os Estados Unidos e a União Soviética, dois adolescentes de uma cidadezinha americana são obcecados pelo rádio. Quando eles descobrem uma estranha frequência de ondas aéreas, suas vidas e o mundo inteiro podem estar prestes a mudar drasticamente.
Assim como Steven Spielberg, Andrew Patterson parece ter uma predileção pelo plano-sequência, já que ele apresenta o primeiro ato de uma forma quase ininterrupta e fazendo com que quase nos percamos sobre o que está realmente acontecendo na tela. Isso só não acontece porque começamos a focar somente nos dois jovens protagonistas e assim começamos a compreender melhor a história. Ela, aliás, só engrena de vez quando cada um faz o seu serviço na área da comunicação e é aí que tudo começa a vir à tona.
Com um orçamento de pouco mais de um milhão de dólares, Andrew Patterson dá uma verdadeira aula de como se faz cinema de suspense com poucos recursos, pois basta uma ideia na cabeça e uma câmera na mão para nos envolver com relação ao que irá acontecer em seguida. Essa expectativa se estende em vários momentos do filme, principalmente quando ambos os protagonistas ficam ouvindo no outro lado da linha uma voz misteriosa e da qual pertence ao ator Bruce Davis.
É por sua voz, aliás, que é construída toda uma aura de suspense, pois é por ela que começamos a construir mentalmente toda a sua história, como se estivéssemos ouvindo uma novela de rádio e fazendo com que soltemos a nossa imaginação a todo momento. Curiosamente, mesmo em um pequeno espaço de tempo, não deixa de ser curioso que é por ele que há uma certeira crítica social sobre aqueles tempos longínquos, mas que soa mais atual do que nunca nestes tempos nebulosos que nós vivemos. Ponto para o realizador que soube muito bem dosar e sincronizar momentos de tensão e fazendo com que se criasse um momento de grande reflexão.
Após isso, o filme entra em uma ação frenética, mas tudo moldado de uma forma verossímil com uma edição de cenas muito bem dirigidas. Embora com uma fotografia escura, ficamos em grande tensão com relação ao que acontece na tela, mesmo quando não enxergamos o que realmente está acontecendo em determinados momentos da trama. Qualquer semelhança desses momentos com o já clássico "A Bruxa Blair" (1999) não é mera coincidência.
E as referências aos outros filmes não param por aí, pois há uma clara homenagem aos clássicos recentes como "Sinais" (2002), do diretor M. Night Shyamalan, sendo que esse último é outro que sempre se inspirou no veterano Steven Spielberg. Em sua reta final, o filme ainda nos brinda com uma intensa interpretação da atriz Gail Cronauer e cuja a história de sua personagem não só nos revela algo de surpreende, como também é carregado de uma dura crítica ao sexismo que as mulheres sofriam naqueles tempos. Novamente o realizador surpreendendo com a sua crítica social em um filme que já valeria o ingresso no cinema com toda sua bagagem cinematográfica.
Em seus minutos finais, o filme com certeza fará com que muitos se dividam, mas a maioria não ficará indiferente com relação ao fato que assistiu algo muito bem dirigido. Em tempos em que muitos optam em ficarem isolados devido ao coronavírus, é sempre bom assistir a uma obra que consegue resgatar um pouco de nossas memórias e nos lembrar de uma cultura pop mais inocente e colorida. "A Vastidão da Noite" é o filme do momento por saber exatamente o que nós queremos e para assim desfrutarmos de algo que nos deixa mais nostálgicos.
Onde assistir: Amazon Prime.