Sinopse: O cartunista Rafael Corrêa foi diagnosticado com esclerose múltipla em 2010. Em busca de respostas e um pouco de aventura, o artista decide fazer um filme para organizar suas memórias.
Quando o animador Otto Guerra foi diagnosticado com câncer ele decidiu inserir essa sua pior fase da vida no seu longa "A Cidade dos Piratas" (2018) como uma forma de exorcizar os seus temores. A arte de fazer cinema, pintura, desenhar ou escrever são na minha opinião uma maneira para mantermos as nossas mentes ocupadas e fazendo com que os nossos problemas de saúde não se tornem um grande obstáculo na vida. "Memórias de um Esclerosado" (2025) segue esse meu raciocínio, ao vermos o cartunista Rafael Corrêa lutando para manter o que havia construído através do seu talento e para que assim possa se sentir ainda vivo.
Dirigido por Thais Fernandes e pelo próprio Rafael Correa, o documentário nos mostra o Corrêa decidindo documentar sua vida a partir do momento em que recebe o diagnóstico de esclerose múltipla em 2010. Contando sua história, ele relembra quando matou um sapo com suas próprias mãos durante a infância. Para ele, seria esse o karma da sua vida, mas ao mesmo tempo ele luta para continuar desenhando e ao mesmo tempo procurando registrar tudo antes que perca todos os movimentos.
Eu me lembro que eu cheguei apreciar as tirinhas do Rafael Correa quando ele trabalhava na Zero Hora. Infelizmente eu fiquei sabendo sobre o seu problema de saúde somente agora pelo documentário, mas ao mesmo tempo foi uma grande satisfação ver a sua obra na tela e da qual transita por imagens documentadas pelo desenhista, sendo desde a sua infância, como também em sua fase adulta e os problemas que começaram devido a sua doença. O documentário também desperta certa nostalgia, principalmente para aqueles que nasceram durante a década de oitenta, pois a maioria das cenas foram registradas em VHS e despertando em mim certas lembranças.
Mas o maior atrativo do documentário está no fato de Rafael Correa colocar a sua difícil cruzada em tirinhas de sua própria autoria. Portanto, vemos diversas HQ sendo protagonizadas pelo artista, tanto nos momentos em que ele cria os seus principais personagens, como também ele mesmo se desenha para contar a sua história. O resultado é um casamento perfeito entre as HQ e o cinema, sendo que neste último caso o realizador sempre tinha interesse pela sétima arte.
Assim como o já citado Otto Guerra no texto acima, eu acredito que Corrêa não tenha somente criado um documentário para falar sobre a sua vida, como também exorcizar as suas dores e talvez até mesmo culpa. A figura do sapo, por exemplo, seria uma representação de um certo erro do passado, mas do qual faz parte da vida de toda criança cuja infância não se tem uma noção sobre o bem e o mal, mas somente termos cometido tais ações é que teremos uma noção posteriormente do que havíamos feito. Uma vez que o artista encara o seu fantasma do passado é então que ele coloca em prática ao fazer as pazes consigo mesmo.
Embora com pouco mais de uma hora o documentário me conquistou facilmente, pois me identifiquei com Rafael Correa pela forma como ele lida com o seu problema ao colocar em prática o que sabe fazer melhor em vida. Seja escrita, desenhar ou filmar, a arte de se fazer histórias é uma forma de manter a nossa mente ativa e para que assim a gente possa deixar algo para ser contado e para sermos sempre lembrados. Rafael Correa provou que a partir de sua primeira e simples tirinha seria o princípio para criação de sua principal obra e que o fará sempre ser lembrado com carinho por aqueles que apreciam uma boa história.
"Memórias de um Esclerosado" não é somente sobre a luta particular de um artista, como também uma declaração de amor para todos aqueles que exercem a sua maior paixão na vida.
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