Sinopse: Hannah Arendt é o retrato do gênio que sacudiu o mundo
com sua descoberta da banalidade do mal. Depois de participar do julgamento do
nazista Adolf Eichmann em Jerusalém Hannah Arendt ousou escrever sobre o
Holocausto em termos nunca antes ouvidos. Seu trabalho instantaneamente
provocou escândalo mas Arendt continuou forte mesmo sendo atacada igualmente
por amigos e inimigos. Porém ao mesmo tempo em que os emigrantes judeu-alemães
lutam para superar suas dolorosas associações com o passado o filme expõe a
sedutora mistura de arrogância e vulnerabilidade de Hannah Arendt revelando uma
alma definida e marcada pelo exílio.
Aliando-se, mais uma
vez, a Barbara Sukowa, que havia atuado em filmes como "Rosa
Luxemburgo" (86) e "Os Anos de Chumbo" (81), a cineasta Margarethe Von Trotta
entrega-se ao desafio de retratar uma das
pensadoras políticas mais importantes e influentes do século passado, que foi
autora de livros como "As Origens
do Totalitarismo". Ignorando boa parte
da historia de sua vida, o filme somente foca num momento crucial da vida de Hannah.
Em 1961, a filósofa alemã, já radicada nos EUA, viaja a Israel para acompanhar
um dos julgamentos mais bombásticos de todos os tempos, do carrasco nazista
Adolf Eichmann, capturado pelo serviço secreto israelense na Argentina.
Mais do que um filme
baseado em fatos reais, os criadores buscaram também inspiração numa peça norte americana, sendo que alguns
momentos, a trama poderia facilmente se passar num único cenário. O roteiro se
concentra no lado mais humano de sua protagonista, sem banalizar seu pensamento
e tão pouco inventando algo novo com relação ao que aconteceu. Hannah é vista discutindo com os seus amigos
intelectuais, em seu apartamento, em que, ao lado de temas polêmicos, nunca
faltavam piadas, nem bebida ou cigarros.
O filme se concentra em dois pontos: primeiro, na atuação de Hannah, ao
cobrir o julgamento de Eichmann para a revista "The New Yorker", que
lhe permitiu criar uma das teses mais polêmicas de sua carreira, sobre a
"banalidade do mal". O segundo, menos abordado no filme, lembra seu
relacionamento com o mestre e ex-amante Martin Heidegger (Klaus Pohl), filósofo
que na realidade havia filiado ela ao Partido Nazista em 1933 e nunca se retratou,
ou tão pouco se defendeu de sua atitude após o fim da Segunda Guerra, para o desgosto de Hannah, que era judia alemã e
fugiu do país natal após a ascensão de Hitler ao poder. Enxergando em
Eichmann apenas como um cumpridor cego de ordens, Hannah atraiu a fúria dos
próprios amigos e dos círculos judaicos. Muitos nunca a perdoaram pela ousadia.
Para eles, ela estaria "defendendo" os carrascos, o que sempre negou.
Nada disso abalou à filósofa, que publicou seus artigos na "The New
Yorker", onde também sofreu pressões e, dois anos depois, um livro que
teve grande repercussão, "Eichmann em Jerusalém". Segundo os registros,
vendeu na época mais de 100 mil exemplares e, ao longo dos anos, serviu como
ferramenta para que jovens alemães contestassem seus pais, por terem
conhecimento dos desmandos nazistas e se omitirem, e também em revoltas contra
a guerra do Vietnã e o uso da energia atômica.
O filme intensifica a
coragem de Hannah que se defendeu de frente até o fim. Apoiada por amigos como
a escritora Mary McCarthy (magnífica Janet McTeer de Albert Nobbs), resistiu,
mantendo sua independência de pensamento, ainda que a um alto custo. Os ataques
sofridos, para ela, equivaleram a um "novo exílio", como salientou a
diretora Margarethe Von Trotta em entrevista ao jornal "The New York
Times".
Procurando não tomar
partido da tese defendida por Hannah nos artigos e livro sobre Eichmann, o
filme sem dúvida abraça a integridade pessoal e intelectual de sua fascinante
protagonista. Com uma bela reconstituição de época e uma belíssima fotografia
com tons pastel, o filme nos permite participar de uma envolvente discussão de idéias
e que certamente, pode despertar uma curiosidade sobre as obras da autora.