Sinopse: Os Eternos são uma raça de seres imortais que viveram durante a antiguidade da Terra, moldando sua história e suas civilizações enquanto batalhavam os malignos Deviantes.
Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Denis Villeneuve e até recentemente Ridley Scott começaram a bater forte contra o estúdio Marvel, sendo que na opinião deles os filmes criados pelo império de Kevin Feige não passam de obras ruins, ou que simplesmente aquilo não é cinema. Embora em parte eu não concorde é preciso levar em consideração ao que eles estão dizendo, já que até o próprio fã que se preze se incomoda em alguns momentos com a "fórmula Marvel", da qual o estúdio persiste em piadas inseridas em última hora, ou na obrigação dos filmes serem interligados desde sempre. Essa fórmula fez com que alguns filmes perdessem a sua própria identidade e exemplos é o que não faltam, desde ao "Doutor Estranho" (2016) como também "Vingadores - A Era de Ultron" (2015), sendo que esse último é o pior exemplo do estúdio a ser analisado.
Porém, os irmãos Russo provaram que poderiam fazer um cinema autoral dentro da fórmula, desde que conseguissem obter lucro para o império. Com "Capitão América - Soldado Invernal" (2014) eles não somente fizeram um filme mais maduro, como também incrementaram sua visão própria, ao inserir questões políticas e que remetessem aos filmes policias e de espionagem como eram feitos antigamente nos anos setenta. Isso fez com que se abrisse um leque para vinda de novos diretores que conseguiram obter carta branca para fazer o que bem entender dentro do estúdio, como no caso de James Gunn com o seu "Guardiões da Galáxia" (2014) e Taika Waititi com o seu "Thor: Ragnarok" (2017).
Após "Vingadores - Ultimato" (2019) coube o estúdio renovar de vez o seu cardápio para não perder o público que havia adquirido com tanto esforço. Essa tendência por mudanças é sentida nas séries de tv, como no caso de "WandaVision" (2021) e "Falcão e o Soldado Invernal" (2021), sendo que essa última possui temas adultos e até mesmo corajosos dentro do estúdio. Essa coragem por mudanças é sentida agora em "Eternos" (2021), filme que sofre em alguns momentos nas mãos da fórmula Marvel, mas escancarando um enorme passo feito pelo estúdio.
Dirigido pela cineasta Chloé Zhao, vencedora do Oscar de melhor direção e filme pelo seu "Nomadland" (2021), o filme nos apresenta aos novos super seres que habitam a nossa terra. Originários dos primeiros seres a terem habitado o planeta, Os Eternos fazem parte de uma raça modificada geneticamente pelos deuses espaciais conhecidos como Celestiais. Dotados de características como imortalidade e manipulação de energia cósmica, eles são frutos de experiências fracassadas de seus próprios criadores, que também foram responsáveis por gerar os Deviantes, seus principais inimigos.
Escolher Chloé Zhao para dirigir uma super produção como essa foi realmente uma aposta arriscada, pois a cineasta estava mais do que acostumada a fazer pequenos filmes, mas dos quais possuem uma visão autoral da mesma. Isso é repetido em "Eternos", pois a fotografia e a edição de arte do filme não são muito diferentes do que foi visto em seu "Nomadland", mas tudo de uma forma muito maior, com mais recursos e dos quais ela consegue explorar com mais exatidão a riqueza do nosso planeta através de várias cenas monumentais e exóticas. Diferente dos demais filmes, "Eternos" se passa em diversas partes do globo, desde Irã, Amazonia, Londres e nos passando a questão de que o poder desses super seres não pertencem a somente a um lugar, mas para todo o globo.
Curiosamente, são personagens conhecidos nossos, dos quais nós crescemos ouvindo através de histórias da mitologia grega e que acabaram influenciando o avanço da humanidade com relação a tecnologia, assim como também os seus erros e desastres que os mesmos cometeriam. Embora sendo super seres Chloé Zhao procura humanizar essas figuras coloridas, ao ponto de que cada um tem os seus dons como também os seus defeitos e fazendo com que até mesmo alguns fracassem devido aos seus próprios sentimentos. Para ter esse efeito era necessário obter um super elenco e foi exatamente isso que a cineasta conseguiu ao longo do percurso.
Se por um lado Angelina Jolie fica devendo ao interpretar a sua poderosa Thena, do outro, Salma Hayek surpreende como Ajak, a voz da razão do grupo e cuja as suas escolhas definirão o futuro dos demais. Porém, é Gemma Chan que acaba roubando a cena ao interpretar a sua Sersi, pois o fato dela amar os seres humanos é o que fará dela a peça principal desse jogo de xadrez e que definirá o futuro da terra. Os demais do elenco cada um tem o seu espaço necessário e é preciso parabenizar o estúdio pela escolha da atriz surda e muda Lauren Ridloff para fazer a eterna velocista Makkari.
Infelizmente é justamente a fórmula Marvel que acaba prejudicando o resultado final do filme em alguns momentos. A impressão que me deu é que em alguns minutos eu estava assistindo a um filme autoral de Chloé Zhao, para logo depois as piadas do estúdio serem inseridas em última hora e fazendo com que a obra quase perdesse a sua identidade própria. Ao menos a mão da cineasta pesou mais no resultado final, mesmo ela não ter dado conta muito bem do uso de alguns efeitos visuais, mas cujo o ato final belíssimo compensa todos esses defeitos sentidos.
"Eternos" é o filme mais autoral da Marvel, mesmo quando o estúdio se prejudica ao insistir na sua famigerada fórmula de sucesso.