Sinopse: Um professor de inglês recluso que vive com obesidade severa tenta se reconectar com sua distante filha adolescente para uma última chance de redenção.
Darren Aronofsky não é sutil com relação ao que ele passa nos seus filmes, mas sim escancara a luta dos seus protagonistas contra os seus demônios interiores. Se em "Réquiem Para Um Sonho" (2000) vemos os personagens caindo no inferno devido as drogas, em "Cisne Negro" (2009) testemunhamos a protagonista em ter que liberar, mas ao mesmo tempo enfrentar, o seu lado sombrio para obter o seu tão sonhado desejo. "A Baleia" (2022) é sobre o ser humano arrependido pelos seus erros do passado, mas tendo coragem para tentar de todas as formas salvar o que ainda lhe resta mesmo que isso se torne impossível.
Baseado na peça escrita por Samuel D. Hunter, acompanhamos a história de um professor de inglês e seu relacionamento fragilizado com sua filha, Ellie. Charlie (Brendan Fraser) é um professor de inglês recluso, que vive com obesidade severa e luta contra um transtorno de compulsão alimentar. Ele dá aulas online, mas sempre deixa a webcam desligada, com medo de sua aparência. Apesar de viver sozinho, ele é cuidado pela sua amiga e enfermeira, Liz (Hong Chau). Mesmo assim, ele é sozinho, convivendo diariamente apenas com a culpa, por ter abandonado Ellie (Sadie Sink), sua filha hoje adolescente que ele deixou junto com a mãe Mary (Samantha Morton) ao se apaixonar por outro homem.
Hollywood não é gentil com os seus astros, principalmente quando os mesmos possuem problemas pessoais e fazendo com que aos poucos sejam descartados. Brendan Fraser é um caso de inúmeros, tendo se tornado um grande astro no final dos anos noventa, mas se isolando após ter sido assediado por um grande produtor de um determinado estúdio além de outros problemas pessoais que o deixaram extremamente abalado. O intérprete, porém, não desistiu da atuação, sendo que aos poucos foi voltando para a profissão e o filme "A Baleia" é sem sombra de dúvida a sua grande virada de mesa.
Com uma impressionante maquiagem, Fraser nos passa através do seu personagem um ser humano que acumulou diversos erros em sua vida, mas procurando alcançar a sua redenção antes que seja tarde demais. É impressionante o olhar que o intérprete nos passa, sendo uma espécie de mar profundo e do qual se mergulhássemos testemunharíamos as mais diversas histórias de um homem que carrega as suas cicatrizes emocionais e físicas desde sempre. Uma atuação digna de diversos prêmios, mas cujo desempenho será lembrado ao longo de vários anos.
Talvez alguns críticos acusem o filme de ser gordofobico, mas acredito que Darren Aronofsky optou por ser autêntico com relação a reação dos demais personagens secundários perante o protagonista ao invés de criar uma obra que poderia soar meramente hipócrita. Portanto, cada um reage de uma forma autêntica, mas isso graças aos ótimos desempenhos dos seus respectivos intérpretes e sendo que cada um cumpre com louvor as suas atuações em cena. Embora Fraser carregue o filme nos ombros, não há como negar que eles ajudam a complementar o seu desempenho.
Hong Chau, vista recentemente no filme "O Menu" (2022), se torna uma espécie de ancora para manter o seu paciente e amigo no lugar, mas não escondendo a pessoa cética e até mesmo cansada que o mundo a criou. Já Thomas, interpretado por Ty Simpkis, é uma figura curiosa, já que ele seria uma representação do lado hipócrita do ser humano que busca a religião como uma espécie de cortina de fumaça para ocultar os seus erros que acumulou na vida. Darren Aronofsky foi até suave nesta questão com relação a esse personagem, pois basta compará-lo perante a situação vista no filme "Mãe" (2017) para constatarmos que o realizador já teve tempos muito mais polêmicos.
Mas é realmente a jovem atriz Sadie Sink, famosa pela série "Stranger Things" que se torna a melhor peça do elenco secundário. Ao interpretar a filha do protagonista, Sink nos brinda com uma atuação poderosa, onde ela nos passa uma grande raiva perante os nossos olhos, além de sua personagem não esconder repulsa do seu próprio pai, não somente pelo fato da situação em que ele se encontra, como também de ter-lhe abandonado um dia. Por conta disso, o filme ganha ares até mesmo de tensão, já que devido a sua rebeldia tememos pelas suas ações.
Com relação a tensão, o filme se torna cada vez mais claustrofóbico, principalmente nos momentos em que o personagem se sente mal e se entregando aos seus vícios para tentar amenizar a dor. Sua sinceridade perante as pessoas é o que torna ele especial, pois em tempos atuais em que muitas pessoas se entregaram as mentiras das fake news, o filme se alinha aos tempos de incerteza e cuja verdades acabam ficando apenas em uma superfície fina. Ao final, a redenção que o personagem encontra não é muito diferente do que é vista em outras obras do cineasta, mas fazendo com que continuemos pensando na trama após o encerramento do longa.
Com uma bela referência ao clássico literário "Moby Dick", o filme "A Baleia" é mais um filme inquietante de Darren Aronofsky, do qual irá dividir a opinião de muitos, mas que rendera diversos debates acalorados para dizer o mínimo.
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