Sinopse: Dois faxineiros surpreendem um ao outro durante o almoço: um diz que fez sexo com um homem, enquanto o outro se preocupa com um sonho vívido no qual David Bowie o vê como uma mulher.
Em tempos atuais certos tabus da sociedade têm sido quebrados, principalmente quando o tema é o sexo e sendo discutido de forma mais aberta nos últimos tempos. Porém, a questão ainda é difícil de ser dialogada, principalmente entre casais que ainda mantêm certos valores do passado intactos, mas que nem sempre corresponde com os seus verdadeiros sentimentos. "Sex" (2024) fala sobre intimidades, segredos e até que ponto é preciso ser sincero com relação a esse assunto.
Dirigido por Dag Johan Haugerud, acompanhamos a história de dois colegas de trabalho na meia-idade, ambos em casamentos heterossexuais, que, após duas experiências recentes e inusitadas, passam a questionar suas sexualidades e identidades de gênero. Enquanto um revela que teve a sua primeira experiência homossexual, o outro revela que anda tendo sonhos estranhos com o cantor David Bowie. Uma vez que ambas as versões de suas histórias são ouvidas pelos seus familiares é então que cada um deverá lidar com as suas sinceridades.
Dag Johan Haugerud já pode facilmente ser observado mais de perto pelos críticos e cinéfilos de plantão, principalmente para aqueles que apreciam um cinema mais autoral. O Filme é o primeiro capítulo de uma trilogia que o realizador desenvolveu, sendo que o papel do sexo é usado como motor pulsante nas tramas, mas que, curiosamente, são através dos diálogos que o assunto se torna mais interessante do que qualquer ato carnal visto em cena. O trunfo está na naturalidade dos personagens em falar sobre o assunto, ao ponto dos dois amigos se surpreenderam com a revelação um do outro, mas jamais recuarem com relação ao que haviam sentido em suas experiências distintas uma da outra.
Nota-se, por exemplo, que há uma preocupação da parte do cineasta em fazer um enquadramento cada vez mais fechado a partir da conversa da dupla principal da trama. É como se o cineasta procura se focar na ação e reação dos personagens, sendo que boa parte dessa passagem quase não há corte e fazendo com que a conversa se torne ainda mais interessante. Isso se intensifica ainda mais quando um deles volta para casa e é revelado que ele havia confessado a sua esposa que havia feito sexo com outro homem.
Por vários minutos Dag Johan Haugerud não opta em mostrar a expressão da esposa, sendo que somente isso ocorre quando há corte brusco e revelando uma expressão cansada da mulher uma vez que passou o dia inteiro pensando no assunto. Enquanto o marido procura explicar que isso foi uma forma natural de isso acontecer, por outro lado, a esposa representa aquele lado mais conservador que não aceita facilmente a questão, mas que não esconde certa dor e uma paixão ainda pulsante pelo marido. É através dos dois que o filme nos leva há bastante questionamentos sobre até que ponto é realmente necessário ser aberto sobre determinados assuntos, pois por mais que quebremos certos tabus, sempre haverá aqueles que nunca aceitam de modo tão fácil.
Embora delicado em alguns momentos, Dag Johan Haugerud procura construir uma narrativa que transite entre momentos dramáticos, para um humor mais refinado, principalmente quando o outro protagonista começa a ser cada vez mais assombrado pelos sonhos onde se encontra o cantor David Bowie. Vale destacar a divertida química entre ele e o seu filho, sendo que o último está à frente do seu pai com relação a certos assuntos e fazendo com que ambos protagonizem os momentos mais divertidos do filme como um todo. Atenção para passagem em que eles visitam uma médica, sendo que ela conta uma história que sintetiza todos os dilemas que os personagens convivem dentro da trama.
Os intérpretes Jan Gunnar Røise e Thorbjørn Harr se saem muito bem em seus respectivos papéis, sendo que a primeira rodada de conversa de ambos juntos em cena é o que faz o filme nos conquistar de forma imediata. Siri Forberg, porém, não fica muito atrás, ao interpretar a esposa do primeiro e carregando o peso de não saber como processar essa informação vinda do marido. Ambos em cena fazem com que o filme gere até mesmo certa tensão, já que eles se defrontam com o posicionamento distinto de cada um.
Ainda não assisti aos demais títulos que formam essa trilogia, mas essa desperta já a nossa curiosidade e isso graças aos diálogos afiados e uma incrível direção que faz a gente desejar observá-la mais de perto. O sexo, portanto, não precisa necessariamente ser discutido com cenas da ação, mas sim através de diálogos bem construtivos e que nos levam as mais diversas reflexões durante a sessão. Nada mal para um cineasta que ainda tem muito a nos oferecer nos próximos anos.
"Sex" é mais do que aparenta ser, ao colocar em pauta um assunto de forma aberta, mesmo sendo um tabu para aqueles que ainda não sabem como encará-la.
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