NOTA: Filme exibido para os membros do Clube de Cinema de Porto Alegre no último sábado (17/02/18)
Sinopse: Jean sente-se preso na lógica de longevidade e decide planejar sua morte conscientemente. Para isso, ele convida Helena para um suicídio a dois, e mesmo hesitante, ela o ajuda em seus planos. Juntos eles preparam todos os detalhes para o funeral, mas enquanto seguem em direção à morte se dão conta de que antes do fim ainda há uma vida inteira.
Cristiano Burlan é um tipo de cineasta que usa o seu cinema para exorcizar as suas dores que o assombram internamente. Em Mataram o Meu Irmão, por exemplo, ele criou um verdadeiro mosaico sobre os fatos que levaram a morte do seu irmão e até onde se insere a violência dos bairros do subúrbio de São Paulo. E se a cidade serve como um cenário, por vezes, mórbido no genial Fome, em Antes do Fim o local serve como pano de fundo para colocar em pauta as questões sobre a vida e a morte e de como devemos lidar com elas.
Assim como em Fome, o filme é estrelado pelo crítico Jean-Claude Bernardet, onde aqui ele faz um senhor de idade, com boa saúde, mas que decide acabar com a sua vida para não cair na decadência de possíveis doenças e da inevitável agonia da morte. Ele pede então ajuda a sua própria esposa, interpretada por Helena Ignez (Mulher de Todos), que aceita então ajudá-lo, mas tenta então compreender as suas motivações do seu marido em dar cabo de sua vida e quem sabe até então persuadi-lo. Se inicia então uma jornada em que ambos juntos irão desbravar em meio a uma cidade de luz e sombras.
Assim como em Fome, São Paulo não há brilho, cores, mas somente um clima mórbido onde a vida só se encontra numa luz de prata e pouco reconfortante. Os personagens então caminham em determinados lugares, seja num cemitério, seja em uma farmácia e relembrando fatos de suas vidas. Curiosamente, o filme começa com fotos reais dos atores, onde sentimos o ápice de suas juventudes e para então se chocar com as marcas de suas velhices. É aí que, assim como em suas obras anteriores, Cristiano Burlan decide transitar entre a ficção e realidade, fazendo com que ambos os atores interpretem na maioria das vezes eles mesmo e gerando situações da quais eles botam para fora os seus reais desejos e medos.
Se do primeiro, até a metade do segundo ato, o filme possui uma trama que aparenta começo meio e fim, mais adiante percebemos que ele se torna algo experimental, como se o cineasta entrasse num labirinto em que o espaço e tempo deixam de ser regras, mas com o intuito de que a via cruz dos personagens não se torne um fardo mas sim algo mais lírico. É aí que entram em cena Ana Carolina Marinho e Henrique zanoni, colaboradores dos filmes anteriores do cineasta. Aqui eles atuam, ora como contra partes jovens do casal de protagonistas, ora como seus ouvintes e fazendo com que eles ultrapassem a linha entre a ficção e realidade e fazendo com que ambos revelem suas verdadeiras facetas na frente das câmeras.
Em seu ato final, o filme se encaminha por diversas passagens, onde elas tornam a ideia da morte menos penosa e mais reconfortante. Não que o cineasta propõe em aceitá-la de bom grado, mas que aceitemos uma transição em que deixemos o melhor de nós para ser contado. Aliás, é preciso dar os parabéns pela elaborações de algumas passagens da obra, já que elas fizeram me lembrar o melhor da filmografia de Ingman Bergman, principalmente o Sétimo Selo que trata assunto semelhante.
Antes do Fim é um exemplo de uma bela obra experimental, em que a transição entre a ficção e a realidade tornam um filme criativo e muito bem vindo.
Nota: O filme está em cartaz no Cinebários de Porto Alegre. R. Gen. Câmara, 424 - Centro Histórico. Horário: 15h e 19h.
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