Após o vergonhoso "Batman e Robin" (1997) que sepultou a carreira cinematográfica do herói no cinema, o estúdio Warner sempre teve o desejo de se redimirem e lançar um novo filme que, no mínimo, respeitasse os fãs de carteirinha. Porém, a tarefa de relançar o personagem novamente no cinema não foi das mais fáceis, principalmente que um projeto para a retomada era sempre anunciado, mas logo engavetado. Após muita dança das cadeiras, onde até mesmo Darren Aronofsky (Cisne Negro) ficou envolvido no projeto por um certo tempo, o estúdio deu luz verde para a retomada do personagem no cinema no momento que Christopher Nolan aceitou a árdua tarefa.
Com roteiro de David S. Goyer (na época se recuperando do fiasco na direção em Blade: Trinity), o projeto de levar Batman novamente às telas começou com a intenção de fazer um filme de baixo orçamento e focando a trama no primeiro ano do herói na ativa, ou seja, começando tudo do zero. Contudo, o estúdio decidiu injetar um orçamento maior, chamando um grande elenco e dando certa liberdade a Nolan em fazer o que bem entendesse durante a produção. Com mais dinheiro na mão, Nolan não só decidiu fazer um filme de origem, como também fazer com que esse personagem sim se tornasse possível em nosso mundo real.
Para começar, o filme não é sobre Batman, mas sim sobre Bruce Wayne, que ainda criança vê os seus pais sendo mortos durante um assalto e despertando nele o desejo de vingança. Porém a questão vai muito mais além, pois o cineasta e o roteirista não quiseram ir para um caminho comum, mas fazer com que o personagem trilhasse uma fina linha sobre responsabilidade e fazer justiça de uma forma mais coerente. O resultado é vermos então o protagonista testemunhando o verdadeiro mal que assola a cidade, mas não criado por simples ladrões de rua, mas sim justamente por uma polícia corrupta, políticos gananciosos, juízes vendidos e gângster que usam todos eles para obter benefício próprio.
Nolan cria então uma minuciosa trama de ficção, mas com altas doses de temas vindos do mundo real. Sua Gotham City está anos luz de distância da visão autoral criada por Tim Burton em 1989, mas ela não deixa de ser sombria, suja, violenta, caótica e sintetizando sobre os males das grandes metrópoles que sofrem no mundo real de hoje em dia. Portanto é chocante, por exemplo, ao vermos numa sequência em que as questões sobre o que é vingança e justiça se casarem com um cenário desolador, onde os becos de um bairro há um grande aumento de moradores de rua devido à crise e a corrupção que assolam na cidade e não sendo muito diferente do que acontece, por exemplo, em São Paulo como um todo.
A verossimilhança é, portanto, a palavra de ordem dentro do filme, onde não só há uma preocupação em tornar aquele mundo fictício como algo crível, como fazer a gente crer que apenas um homem pode sim mudar os rumos de uma cidade como um todo. Tudo aqui é criado de uma forma bem pensada, ao vermos o personagem principal (Christian Bale) no fundo do poço, mas tendo então a chance de obter um novo caminho e alcançar o que está então procurando. Não há como negar que aqui há uma referência que Nolan faz com relação a Jesus Cristo quando ele fez a sua peregrinação de quarenta dias e quarenta noites no deserto, só que aqui o protagonista recorre então ao Diabo para obter o poder para fazer a diferença que tanto deseja.
Embora seja um projeto maior e diferente do que já havia feito antes, Nolan novamente usa alguns artifícios para testar a percepção do cinéfilo que assiste. A questão sobre a identidade de Ras Al Ghul, não é muito diferente do que havia sido visto, por exemplo, em "Amnésia" (2001), onde o protagonista acredita que conhece o rosto do seu oponente, mas ele se torna então uma cortina de fumaça e ocultando as verdadeiras intenções do seu verdadeiro antagonista. Esse artifício acaba se tornando muita mais crível do que é visto nas HQ, onde o vilão usa o poço de lázaro para ser então imortal. A verossimilhança é então imposta nos dois lados da moeda do conflito, principalmente pelo fato que só temos o primeiro vislumbre do herói uniformizado após mais de uma hora de filme. Até lá, cada treino, desafio, recursos em que o protagonista busca para combater o crime, são então construídos minuciosamente para serem vistos e aceitos de uma forma fácil pelo público.
Não me admira, por exemplo, se essa forma gradual na construção do herói ter servido de inspiração para o estúdio rival Marvel na elaboração do seu primeiro filme do "Homem de Ferro" (2008). Com um teor mais adulto, o filme foi recebido de uma forma bem positiva, mas não escapando de alguns detratores que não entenderam a proposta na época. O filme foi conquistando somente 100% da aprovação da crítica e do público nos meses que foram passando e sendo até mesmo considerado por alguns como um dos melhores filmes do ano de 2005.
Embora tenha faturado somente R$ 370 milhões mundialmente, o filme passou a ser cultuado, ganhando adeptos e incentivando o estúdio a dar continuidade aquele universo crível que Nolan havia criado para o personagem. Nolan somente voltaria a Gotham City em 2008, mas antes disso experimentaria alguns toques de magia que tanto almejava experimentar.
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