sexta-feira, 24 de maio de 2024

Cine Especial: Revisitando 'A Queda da Casa de Usher'

Quando se pensa em Roger Corman logo vem em nossa mente o nome Edgar Allan Poe. Corman era fascinado pelos contos que o escritor havia escrito em sua curta vida, mas que foram os suficientes para entrar na história. Coube então ao realizador tomar um passo importante de sua carreira e que daria um papel relevante no cinema de horror norte americano.

No final dos anos cinquenta o estúdio inglês Hammer começou a se destacar ao levar para o cinema produções baseadas em contos clássicos de horror, começando por "A Maldição de Frankenstein" (1957) e "O Vampiro da Noite" (1958) e o resto é história. O estúdio deu novo fôlego ao gênero de horror, ao inserir cores, sangue e um grau de violência até então inédito para aquela época. Não demorou muito para que algum estúdio entrasse nesta briga para obter uma fatia desse sucesso e neste caso foi o estúdio norte americano "American International Pictures".

Conhecida por produções em preto e branco e de baixo orçamento, o estúdio obteve revitalização quando Roger Corman se tornou um dos seus produtores, mas a intenção do realizador era também roteirizar e ao mesmo tempo dirigir algumas produções. Tendo uma predileção pelos livros de Edgar Allan Poe, o realizador e o estúdio decidiram investir todas as suas fichas em "A Queda da Casa de Usher" (1960), talvez a primeira e grande produção do estúdio, contendo todo um cuidado perfeccionista e que somente Corman poderia idealizá-lo. Sucesso de público e crítica, o filme foi o primeiro de muitas produções que Corman levou ao cinema baseado nas obras de Edgar Allan Poe.

A trama é sobre um jovem chamado Philip Winthrop (Mark Damon), que viaja até a Casa dos Usher, uma mansão sinistra e isolada em um grande pântano. Lá, ele pretende encontrar a sua noiva Madeline Usher (Myrna Fahey), para levá-la de volta a Boston e se casarem. Porém, o irmão de Madeline chamado Roderick (Vincent Price), insiste para que ela se mantenha na mansão, já que ela se encontra doente, mas há um segredo que envolve a sua família além da mansão e resultando em situações sinistras.

Rodado em apenas 15 dias, Roger Corman demonstra total paixão pela obra de Poe em cada cena em que ele dirige, cujo perfeccionismo é sentido, mesmo tendo sido tudo rodado em pouquíssimo tempo. Com cores dos tempos de technicolor, o filme ganha um patamar maior visualmente, como se o vermelho, por exemplo, visto nas roupas exalasse sangue e fazendo a gente se preparar psicologicamente. Falando nisso, por mais que visualmente o filme seja algo já visto naquela época, a produção se diferenciava dos demais, ao nos entregar uma trama em que o principal monstro poderia ser a própria mente doentia de alguns dos protagonistas.

Era o início dos anos sessenta, onde o suspense e o horror estavam mudando e revelando uma nova faceta do gênero. Era o início de tempos questionadores, onde o monstro talvez não viesse da Transilvânia, mas sim das próprias ações do ser humano. Alfred Hitchcock, por exemplo, construiu uma carreira de suspense em que o sobrenatural não tinha o seu espaço e "Psicose" (1960) foi o início dessa tendência para época e o resto é história. Pode-se dizer que "A Queda da Casa de Usher" transite para os dois lados, sendo que por um momento parece que há algo de sobrenatural naquela casa, mas o lado psicológico se sobressai logo em seguida.

O fator primordial para isso é a presença de Vincent Price, ao construir para o seu Roderick um personagem enigmático, cuja suas ações nós questionamos já de início, pois não sabemos ao certo se há alguma lógica no que ele diz referente a Mansão e a sua irmã, ou se tudo não passa de algo vindo de uma mente fragmentada. Price já era conhecido na época por estrelar filmes de horror como "Museu de Cera"(1953), mas foi a partir dessa produção de Roger Corman que ele se tornaria conhecido como astro dos filmes de horror por um longo tempo. A partir desse filme Price atuaria em quase todas as produções baseadas na obra de Edigar Allan Poe, como no caso de "O Corvo" (1963) e A Mansão do Terror (1961).

Na medida em que a trama avança tudo começa a ficar cada vez mais complexo, onde não sabemos ao certo se tudo é uma grande armação de Roderick, ou se há algo de peculiar, seja na mansão, ou com relação a sua família. O ato final se encaminha para momentos até mesmo pesados para época, onde a loucura, violência e o sobrenatural(?) se fundem como um todo e fazendo do cenário principal algo insuportável. Embora os minutos finais possam soar convencionais isso não tira o brilho do resultado da produção, mesmo quando nos passa a sensação de que ela poderia ir mais longe do que se imagina.

"A Queda da Casa de Usher" é a união inventiva e cinematográfica de Roger Corman com o lado mais sombrio e enigmático de Edgar Alan Poe e cuja união mudaria uma parte da história do cinema de horror norte americano. 

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