Sinopse: Em 1955, em Nova York, o detetive particular Harry Angel é contratado para encontrar um cantor desaparecido no final da Segunda Guerra Mundial. Sua investigação o leva a Nova Orleans, onde feitiçaria e assassinato seguem seus passos.
Certa vez o escritor inglês Alan Moore estava passeando pelas ruas de Londres quando de repente ele cruzou com uma misteriosa figura que lhe piscou o olho e seguiu o seu rumo. Essa figura usava um casaco surrado, estava fumando e tinha a cara do cantor e compositor Sting. O escritor ficou tão fascinado por aquela pessoa que a mesma o acabou servindo de inspiração para a criação de Constantine, personagem ocultista, que enfrenta diversos demônios, que surgiu pela primeira vez nas HQ do "Monstro do Pântano" que o escritor estava no comando na época dos anos oitenta e que posteriormente acabou ganhando suas próprias histórias.
Quando eu penso nesta lenda urbana logo me vem à mente um outro personagem cuja sua trama é parecida, sobre um detetive dos anos cinquenta que é contratado por um homem misterioso para encontrar o paradeiro de um cantor que se encontra sumido desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O detetive, por sua vez, possui um visual semelhante ao Constantine e o homem misterioso que o contrata não é ninguém menos que o próprio Diabo. A história foi lida pela primeira vez em um livro lançado em 1978, intitulado "Coração Satânico" e escrito por William Hjortsberg.
Sendo assim, talvez a figura de Constantine não seja tão original como eu imaginava, pois a fonte de inspiração para a sua criação talvez já estivesse neste livro e a adaptação para o cinema de 1987 comandada por Alan Parker fortalece ainda mais esse meu pensamento. O filme foi lançado em um momento interessante do cinema norte americano, pois se de um lado havia filmes esperançosos que e que compartilhavam a ideia da Utopia norte americana, do outro, havia produções que ainda exploravam o lado realista e obscuro da realidade do dia a dia. Embora seja um filme de terror "Coração Satânico" foge facilmente dos clichês do gênero e nos brindando com um belo filme investigativo.
Na realidade o filme é bem próximo do subgênero "Noir" do qual fazia muito sucesso nos anos quarenta e cinquenta e do qual foi revisitado ao longo das décadas. Tudo está lá, desde uma fotografia quase em preto e branco, como também cenários que são moldados por muita chuva, mulheres misteriosas, detetives durões e uma trama que explora o lado obscuro da alma humana. Não é à toa, portanto, que o filme o segue uma linha cujo elementos já haviam sido revistados em "Chinatown" (1974) e posteriormente em "Blade Runner" (1982).
Não é sempre, porém, que um filme consegue obter uma fidelidade perfeita quando nós comparamos a sua fonte de origem. Porém, Alana Parker surpreende ao filmar como ninguém, pois determinadas cenas remetem a forma como as obras literárias contam as suas histórias, principalmente quando pequenos detalhes acabam por cobrir meia página para termos uma exatidão sobre um personagem ou situação. Na cena, por exemplo, em que somos apresentados pela primeira vez o misterioso personagem de Robert De Niro logo observamos os detalhes de suas unhas, do seu modo de vestir a sua misteriosa bengala em sua mão direita.
Tudo realizado de uma forma perfeccionista, como se cada detalhe se tornasse crucial e que serviria para montarmos um quebra cabeça e para ficar finalizado ao final da trama. Além disso, a mente do personagem de Mickey Rourke é fragmentada, sendo que as suas lembranças vêm e voltam durante a trama e fazendo com que as mesmas se tornem peças principais da narrativa. O que era para ser a busca sobre um simples desaparecimento de um cantor esquecido acaba se tornando uma cruzada que leva o protagonista a um beco sem saída.
Mickey Rourke estava vindo de um enorme sucesso que foi "9 1/2 Semanas de Amor" (1986) e desde "O Selvagem da Motocicleta" (1983) estava sendo apontado como o mais novo Marlon Brando. Infelizmente os rumos não foram como a gente esperava e o ator acabou enfrentando uma extrema decadência o que é uma grande pena, já que neste filme ele obtém uma de suas melhores atuações, pois tanto o seu personagem como a sua pessoa do mundo real se cruza na construção de seu desempenho e fazendo do seu personagem alguém ainda mais complexo do que nós imaginamos. Embora com poucas cenas Robert De Niro novamente dá um show de atuação e cujo seu misterioso personagem já nos dá uma ideia do que ele é no primeiro ato da trama, mas fazendo com que a revelação se torne ainda mais assustadora.
O final, a meu ver, está entre os mais corajosos da história do cinema, pois ele é bem anti-hollywoodiano e fugindo de qualquer clichê previsível. Curiosamente, "Coração Satânico" foi destaque da primeira edição da saudosa revista Set de cinema e se tornando um verdadeiro item de colecionador para aqueles que buscam informações sobre críticas e análises quando a obra havia sido lançada. O filme por si só envelheceu muito bem e podendo até mesmo entrar facilmente na lista dos melhores filmes da década de oitenta.
"Coração Satânico" é um grande clássico ao saber cruzar o gênero de horror com o subgênero Noir e fazendo da obra se tornar venerada e até mesmo copiada ao longo das décadas.
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Gostei da análise. E muito da oportuna referência ao Alan Moore, um dos meus artistas favoritos. É um excelente filme, na minha opinião, muito tenso e com um final, bem barra pesada, que me faz lembrar até hoje da sensação que tive ao ver pela primeira vez, mais de trinta anos atrás.
ResponderExcluirObrigado pela sua opinião. Eu tenho o filme em casa, mas revendo na tela grande tive a sensação de estar vendo pela primeira vez.
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