terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Cine Dica: Em Cartaz: Tinta Bruta



Sinopse: Pedro é um jovem que tenta sobreviver em meio a um processo criminal, à partida da irmã e aos olhares que recebe sempre que sai na rua. Sob o codinome GarotoNeon, Pedro se apresenta no escuro do seu quarto para milhares de anônimos ao redor do mundo, pela internet. Com o corpo coberto de tinta, ele realiza performances eróticas na frente da webcam. Ao descobrir que outro rapaz de sua cidade está copiando sua técnica, Pedro decide ir atrás do mesmo.


O cinema gaúcho tem surpreendido nos últimos anos ao lançar uma visão desconcertante, porém realista, de Porto Alegre através dos seus  jovens protagonistas e dos quais os mesmos não enxergam um futuro acolhedor vindo da cidade gaúcha. Em Ponto Zero, de José Pedro Goulart, por exemplo, conhecemos o outro lado da capital, onde suas ruas obscuras e chuvosas se tornam implacáveis contra um jovem que busca uma razão pela sua existência. Em Tinta Bruta se segue essa linha de pensamento, ao vermos novamente um jovem como protagonista que, tanto luta contra as armadilhas de uma cidade sombria, como também a busca de uma razão pelo sentido de sua própria vida.
Dirigido por Filipe Matzembacher e Marcio Reolon (Beira Mar), acompanhamos o dia a dia de Pedro (Shico Menegat), que luta para sobreviver em meio a um processo criminal não resolvido. Com a irmã indo embora, Pedro começa a fazer shows eróticos online e se tornando conhecido pelos usuários como o GarotoNeon. Porém, ao perceber que ele começa a perder gradativamente os seus clientes, ele descobre que um rapaz chamado Leo (Bruno Fernandez) está fazendo shows parecidos e decide, então, encontrá-lo.
Assim como foi visto em filmes como, por exemplo, no clássico “Janela Indiscreta”, aqui o voyeurismo é acentuado, mas correspondendo com o nosso mundo contemporâneo que  trata o assunto como algo banal e corriqueiro. Pedro encontra nos momentos que está online, tanto a forma para se conseguir algum dinheiro, como também de se sentir especial e sendo algo que não obtém mais no nosso mundo real. No mundo real, aliás, há também um voyeurismo em destaque, onde vemos nos arranha céus da cidade pessoas obscuras, observando o jovem protagonista, cujos desejos para que algo aconteça com ele ficam evidentes, mas nunca de forma explicitamente.
Aqui os olhares implacáveis do mundo real se tornam a trilha de espinhos para que Pedro não se sinta a vontade de se colocar em meio aos demais cidadãos da cidade, enquanto pela internet ele se vê a vontade para se satisfazer e colocar para fora a sua fúria contida contra o mundo em que vive. É aí que Leo surge como uma espécie de ancora para puxar Pedro novamente a realidade, mesmo quando ela não deseja o mesmo de volta. A relação dos dois, aliás, é onde mora o coração do filme, já que os atores se entregam em cenas fortes, porém, muito bem filmadas pela dupla de cineastas.
Tecnicamente, o filme é impecável numa edição em que transita entre a calmaria e cenas frenéticas, cujos momentos sintetizam a complexidade dos sentimentos escondidos do protagonista, mas dependendo da situação em que ele enfrenta. Ao mesmo tempo, os realizadores conseguem fazer um giro pelos principais pontos de Porto Alegre, mas sendo vistos na tela de uma forma que gera um contraste do nosso dia a dia pela cidade. Contudo, o filme vem num momento mais do que apropriado, pois em tempos retrógrados, nem uma grande cidade se sustenta pelo desleixo e a hipocrisia conservadora vinda de poderosos.
Tinta Bruta é uma representação de uma geração solitária, da qual se vê na luta contra uma cidade de Porto Alegre moldada por sombras conservadoras e retrógradas.  

Nota: o filme irá estrear dia 06/12/18 no Cinebancários as 17h. Exibido numa sessão especial durante o Cinema Esquema Novo, o filme terá novamente exibição especial na Cinemateca Capitólio dia 12/12/18, as 20horas, com a presença dos realizadores da obra para debate.       


Nenhum comentário:

Postar um comentário