quinta-feira, 28 de junho de 2018

Cine Dica: Em Cartaz: Hereditário


Sinopse: Após a morte da reclusa avó, a família Graham começa a desvendar algumas coisas. Mesmo após a partida da matriarca, ela permanece como se fosse uma sombra sobre a família, especialmente sobre a solitária neta adolescente, Charlie, por quem ela sempre manteve uma fascinação não usual. Com um crescente terror tomando conta da casa, a família explora lugares mais escuros para escapar do infeliz destino que herdaram.

O cinema de horror atual vive colhendo frutos através de franquias de sucesso como Sobrenatural, Invocação do Mal, seus derivados e de outros títulos que fortaleceram esse meu pensamento. Porém, filmes como ‘Corra!”e “A Bruxa” vão muito além de meros entretenimentos para provocar sustos, mas sim ousando em nos brindar com algo novo e imprevisível. Hereditário é um caso raro, onde consegue transitar entre as fórmulas de sucesso e territórios raramente explorados dentro do gênero.
Dirigido por Ari Aster, o filme acompanha a história da família Graham, que a pouco havia perdido avó em circunstâncias, aparentemente, naturais. Sua neta Charlie (Milly Shapiro) age de uma forma estranha perante a situação de luto que se encontra a sua família e sua mãe (Toni Collette, de O Sexto Sentido) parece guardar segredos e sentimentos sobre essa situação. Aos poucos, situações estranhas começam acontecer na casa em que eles vivem e gerando inúmeras situações preocupantes.
Falar muito sobre a obra é o mesmo do que quebrar a experiência de assisti-la, já que raramente o cinema americano atual nos brinda com um filme do qual nos testa e nos faz adentrar em territórios em que não estamos muito acostumados a pisar. Claro que o cinéfilo mais atento, principalmente aquele que estuda sobre cinema, irá se lembrar do horror dos anos 70, onde muitas histórias daquela época não aconteciam exatamente nas típicas casas mal assombradas do gênero, mas sim em cenários que representavam o nosso mundo real e tornando a experiência muito mais inesquecível. Hereditário é, portanto, um filme de horror psicológico, mas que consegue transitar pelo gênero fantástico e nascendo dessa mistura algo novo.
A trama, por exemplo, possui um ritmo lento, principalmente em seu primeiro ato, onde é apresentado gradualmente o cenário e os seus respectivos personagens. O cenário, aliás, é carregado de simbolismos, onde maquetes representando ambientes com seus respectivos bonecos seriam uma espécie de metáfora com relação ao mundo em que os personagens vivem e cada vez mais presos em suas cordas invisíveis. Ari Aster, por sua vez, surpreende da maneira como filma, onde lentamente sua lente adentra os cenários, como se ele quisesse que prestássemos mais atenção a cada detalhe que vai surgindo em cena.
Ainda sobre o lado técnico, por exemplo, a trilha sonora aqui se difere de outros títulos dentro do gênero, onde ela não surge nos momentos em que nos assustam, mas sim em situações desconcertantes e deixando os momentos assustadores no mais puro silêncio. Os jogos de luzes e sombras, aliás, exigem que nos faça prestar atenção ao que realmente se encontra escondido no canto do cenário e fazendo com que a gente se encolha no meio da poltrona a todo o momento. Sinceramente, não me lembro de um filme de horror recente que me fazia temer pelo que iria acontecer em seguida, mas é exatamente isso que  essa obra nos provoca.
Até lá, a produção nos brinda com ótimas interpretações, sendo algo que raramente vemos nesse gênero cinematográfico. Se o mundo for justo, Toni Collette poderá ser indicada ao Oscar no ano que vem, já que ela está assustadoramente bem, ao interpretar uma personagem em que transita entre a razão, loucura e de uma ambiguidade que nos assombra sempre que ela surge em cena. E se por um lado o veterano Gabriel Byrne se apresenta numa atuação estática, por outro, os jovens atores Milly Shapiro e Alex Wolff se sobressaem, sendo que esse último tem papel fundamental na reta final do filme.
Falando nisso, não me admiraria se muitos não forem gostar do final da história, já que ela não é reconfortante, não há uma redenção e deixando em aberto inúmeras possibilidades sobre o que realmente aconteceu. Ari Aster procura se fechar em seu final, onde deixa cada um nós tirarmos nossas próprias conclusões sobre o que aconteceu a partir de várias possibilidades jogadas no decorrer do filme. O resultado é artisticamente ambíguo e nos deixando paralisados perante os acontecimentos. 
Hereditário é um filme de horror maravilhosamente memorável, onde nos pega desprevenidos e fazendo a gente não se esquecer do que testemunhamos. 

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