quinta-feira, 5 de abril de 2018

Cine Especial: Projeto Abraccine: Quarto Camarim



Sinopse: O filme, por meio de uma abordagem documental, mostra o reencontro, depois de vinte e sete anos, entre uma sobrinha, que é a própria diretora, e a sua tia, com quem não manteve nenhum contato desde a sua infância. Sua tia se chama Luma, é travesti, trabalha como cabeleireira e vive em São Paulo.

O documentário brasileiro vem ganhando força cada vez maior nos últimos anos seja por questões sociais ou políticas. Ao mesmo tempo, a transição entre ficção e realidade de determinados projetos acabam se tornando mero detalhe, pois alguns títulos como, por exemplo, Castanha e Branco Sai Preto Fica, obtém o feito de ter a nossa atenção a cada minuto de projeção. Mais do que uma obra que levanta questões sobre a temática LGBT, Quarto Camarim fala um pouco sobre o nosso Brasil atual, onde se encontra cada vez mais sugado por um conservadorismo irracional, mas não conseguindo esconder a diversidade que a tradicional família brasileira tem e que eles tentam esconder.
Dirigido pela dupla de cineastas baianos Fabrício Ramos e Camele Queiroz (“Cruzes e Credos”; “Muros”), acompanhamos a cruzada dessa última na tentativa de reencontrar a sua tia Luma que, aos seis anos, ela havia conhecido como tio Roniel. Decidida a reencontrá-la, Camele decide fazer um documentário a partir sobre o que conhece e querendo entrevistar Luma. No principio Luma se recusa, porém, ela muda de ideia e Camele parte para um projeto pessoal, familiar e que logo vai mudando conforme o tempo vai passando.
Totalmente fora do convencional, Camele não tem um roteiro pronto, mas somente a ideia de se reencontrar com a sua tia que vai então crescendo. Portanto, não há aqui nenhuma encenação, ou tão pouco um preparo para determinadas cenas, mas sim tudo é utilizado com que está em mãos, assim como ação e reação da cineasta e sua tia que surge posteriormente ao longo da projeção. Além disso, a obra nos pega desprevenidos quando a tela fica preta, onde somente ouvimos a conversa pelo telefone entre tia e sobrinha e tendo somente na tela letreiros sobre como a última se encontrava quando estava conversando com ela.
O segundo e terceiro ato da obra explora o reencontro dessas duas figuras distintas, mas que possuem uma ligação forte, não somente pelo sangue, mas por terem personalidades fortes. Curiosamente, Fabrício Ramos e Camele Queiroz fazem questão da câmera se destacar em duas formas, tanto quando ela se encontra em movimento, como também em cenas paradas em que somente foca a tia e sobrinha e tornando o cenário ao redor como algo simbólico, como se cada peça do lar de Luma fizessem parte de sua própria história. Gradualmente, se tem uma desconstrução entre ambas, onde se é revelado suas dores, paixões, desejos e anseios com relação ao futuro e sobre reencontros de pessoas as quais Luma, por exemplo, não as vê já faz um bom tempo.
Mesmo com todas as suas limitações, o documentário é hábil em falar sobre o próprio Brasil atual, mesmo somente com apenas duas pessoas em cenas. Ambas demonstram possuir a cada momento um enorme talento, mas que poderiam ir ainda muito mais longe se, por exemplo, não houvesse tamanha burocracia, preconceito, mas sim um maior investimento cultural e melhor reconhecimento para pequenos grandes talentos. Facilmente é um filme do qual nos identificamos, graças a sua humanidade que molda a obra e pela sinceridade de ambas as protagonistas em cena. 
Quarto Camarim é sobre a pequena história de um reencontro, mas tendo um enorme significado, além de ser uma representação de grandes talentos de nosso país escondidos e muito mais próximos de nós do que imaginamos.

Nota: Mais informações sobre o filme e Abraccine clique aqui.

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