sexta-feira, 20 de abril de 2018

Cine Dica: Em Cartaz: Em Nome da América




Sinopse: Na década de 1960 milhares de esperançosos jovens norte-americanos vieram para o país, mais especificamente para cidades nordestinas, através do programa de voluntariado Corpos da Paz. Com a missão de ajudar, mas sem funções específicas, incentivo financeiro ou amplo acolhimento da população, eles na verdade eram peças da agressiva política de influência de John F. Kennedy na América do Sul, e através de depoimentos e materiais de arquivo o documentário revela as contradições entre a motivação dos jovens e o que de fato faziam.

A lente de uma câmera cinematográfica, principalmente aquela sendo utilizada em um documentário, tem a capacidade de desconstruir a pessoa que é entrevistada e revelando, por vezes, uma faceta da qual ela tenta esconder. No clássico Edifício Masters de Eduardo Coutinho, por exemplo, testemunhamos uma jovem que fala para câmera do cineasta, mas que não tem a capacidade de olhar para ela, pois sentimos ali um peso interno em que ela sente devido o efeito que o aparelho provoca às vezes nas pessoas. No documentário Em Nome da América, o efeito disso é ainda mais sentido, principalmente em momentos onde se percebe que há uma cortina de fumaça que encobre verdadeiros fatos de um passado distante e que, aos poucos, vai revelando uma possível trágica verdade.
Dirigido pelo estreante Fernando Weller, o documentário investiga eventos da década de 60 ocorridos no nordeste do país. Com a propaganda de boa vizinhança, o até então presidente John F. Kennedy dos EUA decide recrutar e enviar para os países da América do sul um grupo de pacifistas para ajudar os mais necessitados daquela época. Porém, no decorrer do documentário, é revelado que essa missão altruísta possuía algo por detrás das cortinas americanas.
Usando cenas de arquivos liberadas pelo próprio governo americano, Fernando Weller tenta desvendar de uma forma gradual o verdadeiro papel daqueles jovens da época que, decididos a fugir de guerras como do Vietnã, vieram para cá para ajudar os necessitados. Contudo, existia um temor do governo dos EUA, de que a revolução Cubana se alastraria para os demais países da América latina e criando assim um grande risco para o capitalismo americano. Porém, o documentário não nos dá provas concretas sobre isso, mas sim colocando na mesa somente fatos registrados e depoimentos de recrutas daquele tempo.
A partir desses inúmeros depoimentos, tempos a chance de conhecermos cada um deles, sobre as suas motivações da época e suas opiniões sobre o verdadeiro papel que cada um tinha naquele período. Há, logicamente, uma propaganda social de ajuda ao próximo na época, mas isso não significa que, na pratica, isso foi feita de uma forma correta. Há, por exemplo, (extraído do curta The Troubled Land) a chocante cena onde vemos um latifundiário dando tiros para cima, para o chão, ameaçando os trabalhadores que se posicionassem contra ele e dos quais queriam reivindicar melhores condições de trabalho.
Aos poucos, o documentário ainda desvenda certas alianças entre o governo brasileiro e o americano, para que houvesse ajuda sempre para os necessitados, mas que, ao mesmo tempo, observasse os movimentos dos trabalhadores que protestavam por melhorias de vida e da possibilidade de um crescimento dos movimentos mais socialistas. Há ainda a participação da igreja católica onde, aparentemente, exerce o papel de samaritanos, mas tendo sempre ordens superiores vindo de poderosos. Com esse mosaico de eventos, nasceu até mesmo cedo à teoria de que, a revolução de 1964, não seria algo contra o movimento comunista, mas sim um golpe de estado arquitetado, tanto pelos militares do Brasil, como também da política norte americana.
Embora a maioria dos voluntariados norte americanos daquele tempo demonstre total idealismo, ao mesmo tempo, eles não escondem atualmente certa vergonha de que, lá no fundo, talvez tivessem sido usados pelo seu próprio governo para outros fins. Não demorou muito para que surgisse, então, um livro intitulado "A Revolução que Nunca Houve", de Joseph Page, do qual fortaleceu ainda mais a teoria de conspiração e que hoje se comprova o quão estava certo. Em seu livro, Page cita algumas pessoas daqueles movimentos que poderiam ser na realidade espiões infiltrados, como no caso do voluntariado da época Tim Hogen.
É aí que o cineasta Fernando Weller demonstra talento com a sua câmera, principalmente no terceiro ato da obra. Quando finalmente ele se encontra com Tim Hogen para entrevista-lo, Weller faz questão de deixá-lo à vontade para falar, mas não deixando ele em prontidão para escapar de certas perguntas. Quando ele fala que o nome Tim Hogen é citado no livro "A Revolução que Nunca Houve", o mesmo dá sinais de desentendido, mas não escondendo em seu olhar certo aborrecimento da teoria de ter sido um espião ter lhe perseguido ao longo do tempo.
O documentário em si não nos dá provas concretas de que tais teorias conspiratórias eram realmente genuínas. Porém, fica nas entrelinhas, o poderio americano por detrás de tudo e que, através da já citada propaganda da boa vizinhança, conseguiu frear os movimentos socialistas daquele período e prevalecendo a força do capitalismo descontrolado que perdura até hoje. Os minutos finais, onde vemos um familiar símbolo norte americano, em meio a uma favela do nordeste brasileiro, sintetiza a proposta principal do documentário como um todo.
Em Nome da América é um pequeno documentário investigativo, onde somente desvenda a superfície dos fatos, mas com a possibilidade de ter escancarado a hipocrisia do poderio norte americano.
 
Onde Assistir: Cinebancários: Rua General da Câmara nº424, centro de Porto Alegre. De terça a domingo, as 19horas.  



Me sigam no Facebook, twitter, Google+ e instagram

Nenhum comentário:

Postar um comentário