segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Cine Especial: Clube de Cinema de Porto Alegre: Corpo e Alma



NOTA: Filme exibido para os membros do Clube de Cinema de Porto Alegre no último sábado (27/01/18).

Sinopse: Um homem e uma mulher, colegas de trabalho, passam a se conhecer melhor e acabam descobrindo que eles sonham as mesmas coisas durante o sono. Eles decidem torná-los realidade, apesar das dificuldades no mundo real.
O século 21 está entrando numa fase meio que nebulosa, onde existe a informação com velocidade instantânea, mas fazendo com que cada vez mais as pessoas se separem uma das outras. A solução seria então voltarmos ao passado e nos dar de encontro com o nosso lado mais primitivo para a gente se lembrar do que nos faz humanos? O filme Corpo e Alma, talvez não tenha tal resposta, mas  nos direciona para um ponto seguro para nos fazer questionar para qual caminho devemos trilhar em tempos próximos!
Dirigido pela cineasta Ildiko Enyedi (O meu Século XX), acompanhamos o dia a dia de pessoas que trabalharam num abatedouro. Um dos supervisores chamado Endre (Morcsányi Géza) começa a ter sonhos estranhos, onde neles ele é um cervo e do qual começa a ter a companhia de uma fêmea. Curiosamente, a nova funcionária chamada Mária (Alexandra Borbély) começa a ter o mesmo sonho e fazendo com que ambos tenham uma relação imprevisível.
Em tempos em que a humanidade se encontra num estágio em que está se perdendo cada vez mais o amor ao próximo, o cenário de um abatedouro se torna uma espécie de prova de fogo para ver até que ponto um ser humano pode ser frio perante o horror. Ao testemunharmos animais serem abatidos, para logo depois servirem de alimento para a massa, nos faz então a gente se questionar se não somos nós os verdadeiros animais que deveriam ser então abatidos. Ao vermos o olhar de pavor desses animais antes de seu calvário é de cortar o coração de qualquer um.
Nesse cenário deprimente, há pelo menos pessoas conscientes de que, num lugar como esse, é necessário manter o que ainda tem de humanidade e sentir um pouco da dor que passam esses animais. Mas se existe aqueles que sabem ainda sentir, há também aqueles que não conseguem se relacionar com o próximo de forma alguma. Mária, por melhor que ela seja como pessoa, é uma que não consegue ter uma aproximação normal com os demais colegas, como se o toque humano fosse então um desafio e fazendo com que ela não deseje sair de sua zona de conforto.
Mas, a partir do momento em que ela começa a ter o mesmo sonho que Endre, ambos enxergam nessa situação uma forma de se relacionarem, mesmo que isso seja de uma forma fora do comum. A cineasta Ildiko Enyedi usa então o cenário do sonho como uma espécie de metáfora com relação às relações de hoje, onde as pessoas se sentem cada vez mais confortáveis, por exemplo, numa relação virtual do que ter qualquer tipo de contato físico: a cena em que vemos o casal central se deitarem um do lado do outro, é como se então eles usassem um aparelho imaginário e se interagissem usando os seus avatares em forma de cervos.
Por outro lado, o cenário dos sonhos e com seus cervos, pode ser interpretado como uma forma de elo que nos une novamente a natureza e com que faça que a gente consiga se lembrar do que nos faz realmente humanos. Por mais que o casal central tenta se desprender disso e voltar ao seu comodismo do dia a dia, ambos no fundo sabem que só lhes restam essa forma de acordarem para ambos ou caírem no esquecimento mútuo. Quando finalmente eles têm uma relação carnal no mundo real, ouvimos um som familiar vindo do lado mais intimo e primitivo de Endre e nos dando a entender que ambos encontraram as suas essências primordiais para então sentirem realmente despertos. 
Grande vencedor do festival de Berlim, além de indicado ao Oscar de filme Estrangeiro, Corpo e Alma é um reflexo do mundo de hoje, onde existe uma sensação cada vez maior sobre a falta de toque humano pelo próximo e fazendo a gente se perguntar como então chegamos a esse ponto. 

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