terça-feira, 19 de dezembro de 2017

Cine Dica: Em Cartaz: Matheus Schmidt, um caso de amor pelo Brasil


Sinopse: Narra 60 anos da história do Brasil através das vivências do político Matheus Schmidt (1926-2010), um dos protagonistas na luta pela democracia ao lado de Leonel Brizola. Pelo caminho, ele enfrentou duas prisões, um exílio, resistiu a um duro embate com a ditadura militar, denunciou prisões e desrespeitos aos direitos humanos, foi para a rua defender estudantes e trabalhadores nos confrontos com a polícia.

É difícil mais ou menos dizer quando foi exatamente em que eu comecei a ter um posicionamento com relação à política. Porém, acho que foi precisamente há alguns anos atrás, quando eu fui assistir no Cinebancários de Porto Alegre o documentário Dzi Croquettes. Nos primeiros minutos de projeção da obra, por exemplo, havia sido dito que nos tempos de ditadura, ao menos, 500 filmes haviam sido censurados pelos censores a serviço dos militares que se diziam donos do poder na época.
Aquilo me soou como um verdadeiro pesadelo, pois não existe coisa pior do que obras que, ao invés de serem apreciadas, eram então escondidas para ninguém conseguir testemunha-las. Infelizmente muitas pessoas não têm esse interesse com relação aos assuntos de políticos, mas querendo ou não, muito que é arquitetado na capital do nosso país pode sim nos afetar mais cedo ou mais tarde. Nos últimos dez anos o cinema brasileiro tem investido em colocar na tela inúmeras histórias dos 21 anos sombrios que assolaram o nosso país e o documentário Matheus Schmidt, um caso de amor pelo Brasil é mais um exemplo de reconstituição dos fatos daquele tempo.
Dirigido por Márcia Schmidt, filha de Matheus Schmidt, a obra explora as raízes desse político que, de uma forma direta ou indireta, participou das principais fases que o Brasil passou em pelo menos três décadas. Ao longo da projeção, o documentário explora políticos importantes da nossa história, que vai desde a Luiz Carlos Prestes, João Goulart, Getúlio Vargas e Leonel Brizola. Esse último, aliás, é o que melhor foi explorado na obra, principalmente pelo fato dele ter liderado a Campanha da Legalidade aqui no RS no ano de 1961, sendo que conseguiu evitar por um tempo o golpe que, infelizmente, viria com força em 1964.
Em meio a lutas, desistências, perseguições, exílios e retorno ao país, Matheus Schmidt parecia ter a voz de um orientador, do qual usava todos os seus recursos para tentar melhor guiar esses lideres políticos da nossa história. Numa sessão especial do documentário, do qual teve debate logo em seguida, alguém havia soltado uma comparação de Schmidt com o personagem Forrest Gump, filme estrelado por Tom Hanks em 1994. A comparação não é nenhum pouco forçado, já que ambos os protagonistas contracenam com figuras históricas da política, mas a diferença está no fato de Schmidt realmente ter existido.
O ápice do documentário está na forma que, gradualmente, vai sendo exibidos na tela os eventos dos quais muitos políticos que, antes exilados para fugir da perseguição política, começaram a retornar para o nosso país. O objetivo era a união desses homens, para assim criarem novas siglas e assim começar a redemocratização dentro do Brasil. Do preto e branco ao colorido, testemunhamos vários registros históricos, onde vemos a força dos grupos de esquerda crescer e nascer assim partidos como o PDT, do qual Matheus Schmidt fazia parte e era um dos pilares de sustentação da sigla.     
É aí que o documentário entra num território que me soa familiar, onde me fez me lembrar da morte de Tancredo Neves, a posse de José Sarney e as eleições de 1989. É aí que os eventos daquele período ecoam com os de hoje, pois na época Leonel Brizola era figura certa no segundo turno contra o então candidato Fernando Collor, mas não conseguindo o número necessário de votos e que até hoje é algo suspeito. Collor havia sido adotado pela mídia, alguém que trabalharia ao lado de poderosos, para obter o melhor lucro e enquanto isso o povo era esquecido.
Nesse redemoinho claustrofóbico político,  Matheus Schmidt sempre esteve lá, seja como deputado ou em outra posição política. Após a fase cinzenta de Collor, a cineasta Márcia Schmidt faz questão também de colocar na tela o período do FHC e o que ocorreu não é muito diferente se for comparado aos dias de hoje. O ápice do documentário, aliás, está justamente nos minutos iniciais da obra, onde em pleno Congresso Nacional, de 1998, Matheus assume o microfone do plenário para denunciar a então escandalosa liberação de verbas orçamentárias por acordo entre o governo de Fernando Henrique Cardoso e a Câmara de Deputados em troca de apoio na votação de pautas decisivas para a FHC. O presidente da Mesa Diretora à época? Michel Temer. 
Quase vinte anos depois, a luta de políticos com posicionamentos semelhantes ao de Schmidt segue a mesma, mas também seguem os mesmos aqueles que são eleitos, não para fazer política, mas para atuar como mestres da politicagem mentirosa, barata e se tornando lideres do crime organizado. É aí que surge então a necessidade preciosa na realização desses tipos de filmes, onde os seus realizadores buscam registros históricos de nossa história, para sim serem colocados na tela e fazendo com que as novas gerações tenham melhor conhecimento sobre os altos e baixos de nossa política. Atualmente vivemos numa nova história, da qual se torna cada vez mais um reflexo de um passado cheio de erros e cabe a nós então freá-los. 
Matheus Schmidt, um caso de amor pelo Brasil não é somente sobre a trajetória de um homem do ramo da política, como também um olhar pessoal dos principais eventos de um país que vive sempre sob ameaça de ser amordaçado pelos golpistas de ontem e hoje.  


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