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Sapucaia do Sul/Porto Alegre, RS, Brazil
Sócio e Diretor de Comunicação e Informática do Clube de Cinema de Porto Alegre, frequentador dos cursos do Cine Um (tendo já mais de 100 certificados) e ministrante do curso Christopher Nolan - A Representação da Realidade. Já fui colaborador de sites como A Hora do Cinema, Cinema Sem Frescura, Cinema e Movimento, Cinesofia e Teoria Geek. Sou uma pessoa fanática pelo cinema, HQ, Livros, música clássica, contemporânea, mas acima de tudo pela 7ª arte. Me acompanhem no meu: Twitter: @cinemaanosluz Facebook: Marcelo Castro Moraes ou me escrevam para marcelojs1@outlook.com ou beniciodeltoroster@gmail.com

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terça-feira, 11 de agosto de 2020

Cine Especial: 'Domicílio Conjugal' - Relacionamentos Após Maio de 68


Este é o quarto filme protagonizado pelo personagem Antoine Doinel, o alter-ego do cineasta François Truffaut. "Domicílio Conjugal" revela o olhar terno, engraçado e inteligente de Truffaut sobre o casamento e a paternidade. Sendo um cineasta que sempre amou o cinema como um todo, declarou ter-se inspirado nas "comédias americanas sobre os casais, de Leo McCarey e de George Cukor, sem esquecer a influência de Lubitsch, que é decisiva quando se trata de concatenar acontecimentos familiares para fazer rir o público, mas de modo a que tudo fosse tratado, evidentemente, com espírito francês".

Com 100 minutos de duração, direção de arte e figurino bem trabalhados, "Domicílio Conjugal" tem como um dos pontos mais interessantes o painel histórico em que a narrativa está mergulhada. Seguindo o lema do pensador Frederic Jameson, “historicizar sempre”, percebemos que muito do contexto político e cultural da França na época está inserido no filme. Neste período, a França estava imbuída do espírito de mudanças: marcada pelo maio de 1968, pelas manifestações do movimento feminista e por uma crise econômica, a nação passou a ser governada pelo então ministro das finanças Giscard, representante político simpático do movimento feminista, que tratou de, entre tantas reformas, impulsionar a economia, bem como implementar medidas de estatais de modernização.

Ao apresentar os conflitos amorosos sem o modelo prosaico do cinema hollywoodiano, mas como uma caricatura deste, Truffaut toca nas cordas sensíveis da liberdade sexual, um tema ainda tabu nesta época, mas já debatido sem tantas delongas, haja vista que no governo de Giscard, atitudes como a mudança da maioridade penal de 21 para 18 anos de idade, a liberação do aborto e a campanha para uso de contraceptivos marcaram a época.

Por isso a importância do que se seguirá após o aparecimento de Doinel em "Domicílio Conjugal". Ele está casado com Darbon, cuja conquista presenciaremos em "Beijos Proibidos". O amor - tema ao qual o nome do diretor será vinculado - encontra aqui um momento decisivo no casamento e na rotina.  A paternidade, registrada em bela cena, e a estabilidade econômica, conseguida através de um emprego estranho em que cuida de maquetas de navios, darão cores ambivalentes ao progresso de um dos nomes mais importantes da Nouvelle Vague.

Curiosidade: Profundamente apaixonado pelo cinema, Truffaut não consegue deixar de falar de filmes em seus filmes. Antoine passa em frente a um grande cinema parisiense em que um cartaz descomunal anuncia o filme Cheyenne, de John Ford – um dos grandes ídolos do realizador. Num texto de 1974, Truffaut diria: “John Ford era um desses artistas que jamais pronunciam a palavra arte e um desses poetas que jamais mencionam a palavra poesia”. E finalizaria assim: “E como John Ford acreditava em Deus, Deus abençoe John Ford”.


NOTA: Nova live de Tânia Cardoso e que será sobre 'Domicílio Conjugal'. Confira:     

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segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Cine Dica: Mostra online de cinema reúne obras da vinda ao Brasil de Orson Welles em 1942

 Histórias descontinuadas, brasilidade e cinema: próxima mostra da Sala Redenção reúne tudo isso em quatro filmes

Entre os anos 1960 e 1990, um diretor brasileiro buscou retratar a inacabada tentativa de outro diretor, norte-americano, em apresentar ao mundo a complexidade do que é Brasil e do seu povo. A mostra de agosto da Sala Redenção, Nem tudo é Orson Welles, reúne histórias dentro de histórias, que, nesse emaranhado, remonta fragmentos de quem foram Rogério Sganzerla, Orson Welles e Grande Otelo.

A partir do dia 7, estará disponível, no perfil do Facebook da Sala Redenção, os links para acessar a tetralogia de filmes dirigidos por Sganzerla, se estendendo até o dia 21 deste mês – confira clicando aqui. Ainda no dia 13 de agosto acontecerá uma conversa virtual sobre as exibições, no canal do Youtube do Departamento de Difusão Cultural com a equipe da Sala Redenção e um convidado especial.

O fio começa em 1942, quando o cineasta Orson Welles partiu para territórios tropicais com a missão de introduzir o país de dimensões continentais aos outros continentes. Para personificar com esmero a brasilidade (ainda que de forma minúscula se posta ao lado da imensa realidade), o ator Grande Otelo é convocado – para Welles, não haveria escolha melhor. Não contava o diretor de Cidadão Kane, no auge da sua carreira, que seria impossibilitado de cumprir a missão. 

Fascinado por esse feito-não-feito, talvez por identificação pessoal, Rogério Sganzerla percebeu na impossibilidade de Welles sua possibilidade. Distribuiu em quatro produções a história da visita do cineasta ao Brasil, um misto de especulações e fatos. Quem sabe a única certeza que se mantém intacta nas duas tramas – a real e a ficcional – é a excelência de Grande Otelo. Ou melhor, Sebastião Bernardes de Souza Prata. Também é sinônimo de riso, drama, cor, calor e intensidade.

As histórias de Grande Otelo e Orson se misturam tanto na vida, quanto nos documentários encenados de Sganzerla. Deixe-se envolver por essas descontinuidades históricas – dos homens, do cinema e do país. Acompanhe a tetralogia através do link.


Nem Tudo É Orson Welles

Era meados da Segunda Guerra Mundial quando Orson Welles visitou o Brasil em uma missão diplomática disfarçada de filmagem para um documentário sobre a América Latina, sob o título It’s All True, em português, é tudo verdade. Portanto, independentemente das intenções, não era um filme de mentira, principalmente para Welles, que talvez acreditasse no cinema mais do que em qualquer outra coisa. Welles se entregou de corpo e alma, segundo dizem, para essa produção que acabou interrompida na metade, seus rolos foram encontrados anos depois no porão de um estúdio, depois de ter-se acreditado que haviam sido jogados no mar. Um filme que tornou-se eternamente incompleto. E a vinda de Welles é, de certa forma, uma história sobre interrupções.

É difícil mensurar o que é verdade e o que é mentira em Orson Welles e sua visita ao nosso país, já que sua existência é formada de especulações. Jovem diretor confiante e destemido, esse tipo de personalidade acaba se retroalimentando por todos aqueles que querem contribuir com alguma especulação para a construção do mito. Rogério Sganzerla foi um desses assombrados pelo incerto. Além de companheiro de Helena Ignez, Sganzerla foi crítico, diretor de cinema e assumidamente fascinado pelo diretor norte-americano. Considerava Welles um fenômeno da comunicação do século XX e a vinda dessa figura ao país mais comunicativo das américas (quem sabe do mundo), criou uma série de incomunicabilidades que intrigaram o diretor brasileiro desde muito jovem.

Sganzerla realizou quatro filmes sobre esse episódio durante a segunda metade de sua carreira. Nem tudo é verdade (1986), Linguagem de Orson Welles (1991), Tudo é Brasil (1997) e Signo do caos (2003) são embaralhamentos de documentos e encenações que tentam de alguma forma ilustrar essa visita e a personalidade desse explorador. Investigam o desconhecido, assim como fez Welles no Brasil, que se integrou com facilidade à nossa paisagem. Não sei se por puro deslumbramento tropical, típico do explorador colonizador do bem, tentando descrever as coisas sem usar a palavra “exótico”; ou se Welles de fato se sintonizou com alguma parte transcendental do “ser” brasileiro, essa coisa de lidar constantemente com o inesperado.

Mas nem tudo é Orson Welles. Figura fundamental desse processo de abrasileiramento do diretor é Grande Otelo, ator, compositor, cantor e “cachaceiro presidente”, segundo consta na “carteirinha de cachaceiro” dada à Welles em uma das sabe-se lá quantas idas dos dois ao bar. Sebastião Bernardes de Souza Prata, o Grande Otelo, não apenas atuou em algumas cenas do incompleto It’s All True, também esteve em mais de cem filmes, produções de televisão, palcos e rodas de samba. Na época ainda não havia feito metade do que chegou a fazer, mas foi reconhecido por Welles como o maior ator brasileiro. Existiu, nessa relação, a lenda da promessa de levá-lo para Hollywood para tornar-se estrela, o que nunca se concretizou.

Sganzerla, assim como outros diretores da sua geração, admirava Grande Otelo. Deu à ele destaque nessa intermediação entre o ator brasileiro e o estadunidense. Otelo como personificação de um cinema nacional pulsante, cuja voz remonta à esse passado sempre meio próximo e meio distante demais, de um mundo que explodia numa guerra mundial enquanto o Brasil “crescia” para os padrões imperialistas e os EUA ainda tinham algum interesse em estreitar convenientemente as relações com o povo latino-americano. Mas é sabido que essa presença estadunidense em nossas terras favoreceu uma interferência no campo político, culminando, entre outras coisas, no Golpe Militar, em 1964. O resultado disso em nosso cinema foram os apagamentos, as perseguições, os exílios, as carreiras impossibilitadas. It’s All True nunca foi completado, assim como a promessa de um movimento cinematográfico extremamente rico surgido na geração de Sganzerla, nas décadas de 60 e 70. Dada as proporções, principalmente de orçamento, a frustração de uma possibilidade impossibilitada existe tanto em Sganzerla, quanto em Welles nesse sentido. 

Talvez o Brasil tenha sido arrebatador para os bolsos de seus produtores, assim como foi para Welles; ou talvez esses produtores não tenham se agradado com o olhar desse diretor diplomata voltado à um artista negro, como Grande Otelo, transbordando talento e brasilidade. Esses quatro filmes de Sganzerla investigam essas incompletudes, tendo a figura de Otelo como mediador, e esse novo ciclo da Sala Redenção pretende relembrar essa figura, cujo reconhecimento pode parecer só especulação para aqueles que dependem de mídias que monopolizam o imaginário artístico brasileiro, mas que é completamente real e verdadeiro para a história do nosso cinema. Como reflete Sganzerla sobre esse processo: “há certas verdades que surgem como blasfêmias e terminam como superstições.”

Texto: Victor Souza, bolsista da Sala Redenção e curador da mostra.

Confira a programação completa no site oficial da Sala Redenção clicando aqui. 

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Cine Especial: 'THE MANDALORIAN' - Faroeste Espacial

Sinopse: Após a história de Jango e Boba Fett, outro guerreiro surge no universo de Star Wars. O Mandaloriano é ambientado após a queda do império e antes do surgimento da Primeira Ordem. A trama acompanhará as histórias de um atirador nos confins da galáxia longe da autoridade da Nova República. 

George Lucas sempre disse que quando criou "Star Wars" ele buscou inspiração nos filmes de aventura, faroeste e aventuras literárias como o "Senhor dos Anéis". Assistir hoje ao clássico "Star Wars - Uma Nova Esperança" (1977) é encontrar ali algumas fórmulas de sucessos do passado, como no caso, por exemplo, dos filmes de faroeste de John Ford ou de Sergio Leone. Eis que então, vindo do universo expandido de "Star Wars", testemunhamos a série de oito capítulos "The Mandalorian", que não só nos brinda com uma trama independente dos filmes do cinema, como também é uma bela homenagem aos clássicos filmes de faroeste e de boa aventura.
A saga conta a história de um guerreiro solitário de um grupo chamado Mandaloriano, que também vive como um mercenário e caçador de recompensas, viajando pelos territórios esquecidos e marginais do espaço. Em uma missão, ele tem como objetivo raptar um misterioso bebê alienígena para ser usado uma experiência misteriosa. Porém, O caçador decide tomar um novo rumo nesta missão e que irá leva-lo a uma saga de proporções.
Em certa ocasião George Lucas disse que se arrependeu da forma que criou o final para o caçador de recompensas Boba Fett no filme "Star Wars - O Retorno de Jedi". Segundo ele, jamais imaginou que aquele visual e o lado misterioso do personagem acabaria ganhando tantos fãs no decorrer do tempo. Justiça seja feita, pois embora tenham criado um personagem novo, "The Mandalorian" vem para corrigir esse grande erro.
Boba Fett foi um personagem criado através da imagem do cavaleiro solitário, do caçador de recompensas dos filmes de faroestes de antigamente e principalmente daqueles estrelados por Clint Eastwood na “trilogia dos dólares” orquestrada por Sergio Leone. Na série, vemos essa ideia sendo expandida, ao vermos mais desses caçadores de recompensas que vivem em missões clandestinas em capturar vivo ou morto determinado bandido e para assim obter algum lucro. Um cenário extremamente familiar para os amantes do gênero bang bang mas tudo se passando em algum planeta do espaço de uma galáxia muito distante.
O protagonista Mando pode até não ser o Boba Fett, mas carrega com honras o sucesso que o personagem havia obtido e se tornando a alma da série como um todo. Pedro Pascal, conhecido pela série “Narcos”, surpreende em uma atuação contida, porém, certeira ao transmitir uma pessoa com um passado nebuloso, mas que aos poucos é desvendado ao longo do tempo. Além disso, a série explora muito bem a mitologia dos mandalorianos, sem muita complexidade e tão pouco tendo o dever de se conectar por demais com o universo idealizado por George Lucas.
Embora faça parte do universo expandido de "Star Wars", a série pode ser muito bem vista pelos marinheiros de primeira viagem que nunca sequer viram um capítulo da franquia no cinema, pois a intenção principal aqui não é essa. Esse universo criado por George Lucas é tão rico de personagens, seres e lugares que não é preciso exatamente liga-lo sempre a imagem do guerreiro Jedi, pois se há um universo tão vasto de possibilidades nunca é demais ao criar uma trama fresca e que caminhe com as suas próprias pernas.
Para isso, a Disney contratou gente de peso para o trabalho.  Jon Favreau, responsável pela trilogia do "Homem de Ferro", encabeçou a tarefa como diretor de alguns episódios, como produtor e roteirista da produção, Porém, Taika Waititi, diretor de "Thor: Ragnarok" (2017) surpreende em um episódio que não deve nada para uma produção cinematográfica, além de dar voz ao personagem IG-11 que rouba a cena.
Além disso, a série é cheia de personagens cativantes um melhor do que o outro. Se o diretor e ator Werner Herzog, realizador de clássicos como "Nosferatu" (1979), nos chama atenção pelo seu vilão com intenções misteriosas, por outro lado, Nick Noute surpreende como Kuiil, um alienígena sábio e que nos conquista facilmente todas vezes que ele surge em cena. Mas é na figura do bebê Yoda que nos conquista pela sua fofura e nem é preciso dizer que nesta altura do campeonato já tem até mesmo bonequinhos de todas as formas nas lojas especializadas sobre a franquia.
Com um começo, meio e fim bem amarrados, mas deixando uma ponta solta para eventual nova temporada, "The Mandalorian" é uma prova que o universo "Star Wars" não vive somente da imagem do cavaleiro Jedi e que sim pode nos brindar com boas histórias e uma aventura muito bem desenvolvida.  


Onde Assistir: Em breve no Brasil pelo Disney+   

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Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: 'A Despedida'

Sinopse: A família de uma senhora descobre que ela possui apenas mais algumas semanas de vida e decide não a informar a respeito do diagnóstico. Em vez disso, seus filhos e netos tentam arranjar um casamento surpresa para unir a todos. 

Diz o ditado que a mentira tem perna curta e cabe dizermos sempre a verdade haja o que houver. Porém, a mentira também serve para afastar a dor, pois a verdade pode ser muito dolorosa em determinada situação, mas cabe a pessoa refletir até onde quer chegar para ocultar essa real situação. "A Despedida" mostra uma situação incomum, porém, humana e do qual muitos irão se identificar com ela.
Dirigido por Lulu Wang, conhecida mais pelo seu trabalho no filme "Póstumo" (2014), o filme se concentra quando uma família de uma doce senhora descobre que ela possui apenas mais algumas semanas de vida. Eles decidem não revelar a respeito do diagnóstico. Em vez disso, seus filhos e netos tentam arranjar um casamento de última hora para que todos os parentes mais distantes possam vê-la por uma última vez sem que ninguém saiba o que está acontecendo de verdade.
Embora seja moldado com um assunto muito delicado, Lulu Wang surpreende ao alinhar momentos dramáticos com um humor refinado e fazendo do filme uma genuína comédia dramática que nos faz rir e se emocionar a cada instante da projeção. Ao mesmo tempo, em termos visuais, o filme é gostoso de ser assistido, cuja a fotografia iluminada possui cores cheias de vida e reconfortantes para a realidade daquela família que se encontra em uma difícil tarefa. Vale ressaltar a edição, em que alguns momentos ela se torna dinâmica e que dá um bom ritmo para a trama.
Em termos de história, ela pode ser interpretada sobre o real quadro de uma família tradicionalista, não somente chinesa, como também de diversos povos dessa terra. Em tempos de correria em que somos presos ao relógio, vemos alguns familiares ali presos a questão econômica, sobre qual países, seja China ou EUA, que dá mais recursos para a pessoa, mas fazendo com que a própria se esqueça do que é mais precioso para a vida dela. Curiosamente, é um assunto que rende alguns momentos de humor ácido e a cena em que a família discute sobre esse assunto durante o jantar é disparado um dos melhores momentos da trama como um todo.
Curiosamente, é um filme que trata sobre os valores familiares, mas que são, por vezes, esquecidos devido ao dia a dia em que as pessoas sempre se encontram em constante movimento. Por conta disso, fala sobre como as pessoas de hoje cada vez mais optam em serem frias, ao não querer se expressar com relação aos seus reais sentimentos, quando na realidade se esquecem de revelar para si a sua real pessoa como um todo. Dito isso, é preciso ressaltar como os realizadores foram engenhosos em falar até mesmo sobre os lares de um passado distante, em que hoje se encontram extintos, mas que relembrados se encontram cada vez mais dourados.
Delicado, porém, gostoso de ser assistido, "A Despedida" transita entre humor e a emoção ao valorizar as raízes da família e sobre o que nos faz realmente humanos no dia a dia. 

Onde Assistir: Exibido gratuitamente do dia 04 a 09 de Agosto Cine Farol Santander Online. Mais informações cliquem aqui.  


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quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Cine especial: “Boca a Boca”


Para poder ficar curioso e sem conter Spoiler, deixo aqui, uma pequena contribuição sobre o seriado “Boca a Boca” lançado pela Netflix em 2020. Basicamente este texto poderia ser iniciado com o resumo simplificado do seriado: “Em uma cidade do interior do Brasil, o pânico se espalha quando uma doença misteriosa transmitida pelo beijo contamina os adolescentes” (Fonte: https://www.netflix.com/br/title/80994298 Visualizado em 28/07/2020).
Entretanto, prefiro começar com uma visão mais ampla do que foi observado. De acordo com Esmir Filho o diretor do seriado, ele apresenta o vírus do conservadorismo”. Não somente o vírus do conservadorismo mas de diversas diferenças sociais expostos diariamente, nos noticiários. O tempo, a trama, o visual e a ideia do seriado inevitavelmente, nos apresenta a situação vivenciada por nós, atualmente, o Covid -19.
Boca a Boca conta a história de uma cidade fictícia chamada Progresso e esta cidade cinematográfica, fica localizada em Goiás Velho, perto de Brasília. A comunidade começa a ser acometida com um vírus que infecta os jovens pelo beijo e esta relação de vírus, espera pela cura, divisões sociais e a ganância dos que são mais abastados é bem comparada a nossa situação atual. Os elementos de brasilidade são o ponto forte desta série. A trilha sonora é sensacional e cabe um destaque do hit em versão rave da música “boi da cara preta” que ao longo do seriado, vai nos dizer muito sobre o verdadeiro problema da cidade.

O típico tratamento do passado colonial
Temos uma reflexão garantida do processo de colonização realizado no Brasil, com a fazenda que observamos no seriado chamada Colônia. O Brasil passa aqui de uma forma muito natural e as relações de emprego são diferenciadas pelo seu status. O outro aqui, é um ser passivo e que percebe o seu não pertencimento ao mundo da Colônia. A relação de trabalho é dando moradia, alimentação e um salário mínimo de trabalho porém, quando não se está mais apto a realização do trabalho na Colônia, o dono te dispensa, não se importando com suas condições de saúde pois, “as regras são claras e expostos a estes empregados desde o início”.
Além disso vale fazer um destaque na menina negra do seriado. Esta, nos apresenta as suas dificuldades e barreiras para estar inserida em determinados meios sociais, porém, ela possui uma diferença dos demais, elas se impõe e nos apresenta seu local de fala.

As inspirações do diretor
O diretor apresenta em sua inspiração o quadrinho Black Hole e o filme chamado “Os Famosos e os Duendes da Morte” (2010).

As duas inspirações tratam de assuntos parecidos com o que está sendo abordado no seriado e, de como isso se reflete nos dias atuais. A ideia do diretor era falar sobre assuntos como a chegada do HIV, que dividiu demais as relações sociais quando descoberto e assuntos que possuem um quadro social de preconceito contra algumas raças, classes sociais e corpos. Segundo o diretor a ideia era partir para um quadro deste tipo, porém, o lançamento coincidiu com o momento pandêmico que nos encontramos e o jogo por assim dizer, virou.
Um dos fatores relevantes do seriado é a questão de termos necessidades que se aplicam como urgentes e a tolerância que nos parece ser fácil, porém, isso eu deixo como um ponto de vista a ser pensado.

Conclusão
Ainda não temos retorno do diretor sobre uma continuação do seriado, devido ao momento pandêmico que estamos sofrendo. Tomei cuidado com a escrita e evitando contar os segredos de Boca a Boca, pelo fato, do seriado possuir apenas 6 episódios, isso estragaria a curiosidade dos leitores em ao menos dar uma olhada e conhecer os fascinantes protagonistas deste seriado. Seria de muito agrado poder saber como as coisas se desenrolaram na cidade de Progresso, depois dos acontecimentos que foram observados. A indicação que fica é a de ver o seriado com os olhos bem abertos e com a mente no modo aceite o inesperado.

Referências:
Página oficial da Netflix. Disponível em: https://www.netflix.com/br/title/80994298 Visualizado em 28/07/2020.
PRISCO, L. “Boca a boca é sobre o vírus do conservadorismo”, diz diretor Esmir Filho. Disponível em: https://www.metropoles.com/entretenimento/televisao/boca-a-boca-e-sobre-o-virus-do-conservadorismo-diz-diretor-esmir-filho. Visualizado em 28/07/202.

Postado por: Ana Lúcia Schmidt Castelo
Centro/RJ, Brasil.
Mestranda em Administração, graduada em Pedagogia, Arquivologia e concluindo a graduação em Letras. Apaixonada por cinema com preferência por filmes de terror e colaboradora do Blog: “Cinema cem anos de luz, Arte e reflexão” do amigo Marcelo Castro Moraes.

terça-feira, 4 de agosto de 2020

Cine Dica: Durante a Quarentena Assista: ‘AMOR SANGUE DOR’

Sinopse: Uma misteriosa fotógrafa caminha pela noite paulistana à procura de mais uma vítima para seus clicks. Sensações e sentimentos se fundem em um encontro inusitado.

Dirigido por Magnum Borini e tendo o seu primeiro corte exibido agora pelo Youtube, "Amor Sangue Dor" é um filme experimental que se envereda para o gênero fantástico, mas que fala um pouco sobre os nossos tempos atuais indefinidos em que vivemos.  O primeiro ato vai mais para o lado filosófico, sobre as grandes metrópoles de hoje com as suas inúmeras pessoas aglomeradas e das quais convivem entre o consumo e desejos, por vezes, reprimidos por conta de pessoas dispostas a querer exterminá-los. Destaque pela bela fotografia em preto e branco e que fisga a nossa atenção desde o início.
Do segundo ato em diante conhecemos a protagonista, uma vampira (Aline Szpakowski), cuja a sua profissão é a fotografia e nos dando a entender que em sua primeira cena ela havia a pouco bebido sangue de determinada vítima. Porém, ela conhece uma garota (Rute Nascimento), da qual podemos imaginar que se tornará a sua próxima vítima, mas algo acontece de diferente e faz com que tenhamos diversas interpretações com relação ao que vem a seguir. O filme termina novamente com uma fotografia em preto e branco e testemunhamos a protagonista em estado solitário e seguindo sem rumo.
No meu entendimento, "Amor Sangue Dor" fala sobre os tempos conservadores e retrógrados atuais, dos quais muitas pessoas desejam satisfazer os seus desejos mais primitivos, mas tendo receio devido ao que os outros irão pensar a respeito. Ao vermos uma vampira se contendo ao não sugar o sangue que tanto anseia seria uma representação sobre os nossos medos ao vivermos em uma sociedade cada vez mais hipócrita e violenta na medida em que o tempo passa. Curto, mas "Amor Sangue Dor" é eficaz em sua proposta em nos fazer pensar sobre nós mesmos em tempos cada vez mais indefinidos. 

Onde assistir: Pelo Youtube clicando aqui. 


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segunda-feira, 3 de agosto de 2020

Cine especial: “O que o filme Bacurau, pode nos ensinar hoje?”


Chegamos ao ano de 2020 e junto com ele, uma grande crise sanitária, sem indícios de término. Identificamos nesta pandemia chamada de Corona vírus, ou mais conhecida como Covid-19, que assola o mundo inteiro, algumas características inseridas no cinema.
Bacurau, é um filme de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles. Lançado em 2019, este filme apresenta diversos significados simbólicos e bastante representativos do Brasil. Uma das diversas características marcantes da película é que, em sua totalidade, ele aborda temas que parecem ser uma distopia tais como, políticos corruptos, drogas, prostituição, diferenças entre raças e a visão sobre o outro. Os pontos apontados são de um filme com uma realidade baseada em fatos porém, em Bacurau, podemos perceber um Brasil, com estéticas de fome, sonhos e uma pedagogia que paira a violência (Bentes, 2019).
De acordo com Bentes (2019), o filme Bacurau se aproxima dos filmes de Glauber Rocha como “Deus e o Diabo na terra do Sol” de 1964 ou de “O Dragão da maldade contra o santo Guerreiro, de 1969”, devido a sua “invenção de um imaginário rural brasileiro catártico, que realiza uma política vinda do povo” (Bentes, 2019).

Esta política vinda do povo é que pode ser aprendida nos dias atuais, como uma pedagogia voltada a um novo aprendizado de nossas relações sociais e capitalistas que temos com nosso mundo. Um exemplo prático é o que fazer diante de um capitalismo que se impõe em nossa sociedade, como a única forma de subsistência possível? O filme traz esta noção de que, se tudo quebrar, estamos prontos para nos adaptar, será? Reconhecer que a trágica violência nos leva a lutar por nossa sobrevivência, já é um ponto a pensar.
Fatores que podemos apresentar como uma escola da vida conforme, aborda Freire (1967), não é o medo da liberdade mas sim, a transferência de conhecimento e a criação de possibilidades para sua construção e produção deste conhecimento. Este conhecimento fica muito explicito nas relações sociais dentro da cidade de Bacurau.
Um político corrupto e inescrupuloso que leva a cidade a ter sua própria organização coletiva, um espécie de autogestão conforme, cita Motta (1981) e que esta autogestão seria um lugar fundamental de autonomia coletiva, Ou seja, seria o lugar da iniciativa social, onde o grupo se administra livre e de forma espontânea pelos seus interesses comuns (Motta, 1981). O poder coletivo de decisões da cidade, impõe um líder que não necessariamente, dita as regras mas, que informa aos indivíduos da cidade, uma forma de comportamento e adequação, diferenciadas das que estamos condicionados a sofrer.
As divisões dentro da cidade são claras e cada um sabe seu lugar. As vantagens sustentáveis que esta organização possui é aquilo em que coletivamente ela usa com prontidão e adquire seus conhecimentos (Davenport e Prusak, 1998). A comunidade de Bacurau utiliza seu espaço de forma a garantir sua sustentabilidade, sem prejudicar seu ambiente.
Além disso a autogestão da cidade, implica em algumas tendências irregulares tais como, um poder paralelo que auxilia e ajuda a comunidade nos momentos de crise. As nuances de Bacurau são evidentes demais para serem deixadas de lado e nos remete a uma categoria afirmativa de dados do que temos nos dias atuais. Na gestão de Bacurau, observamos uma tendência de desnaturalizar o capitalismo vigente, quebrar regras e identificar-se como um ser social e não fora de um mapa, que também não temos ideia de quem o desenhou.
Traços coloniais existentes em Bacurau, são muito representativos e percebemos a intervenção dos “colonizadores” em dar significado a sua origem e raça, como se isso, fosse de fato, algo relevante, visto que raça foi uma criação colonial para garantir a retroalimentação de um trabalho escravo direcionado aos negros, índios e judeus, justificando assim, os “outros” como subalternizados e seres de extrema ignorância (Mignolo, 2003).
Por citar capitalismo, não se assuste se ver a única nota em dinheiro do filme, ser dada pelos turistas que chegam a cidade. Como a cidade funciona sem o ritmo tradicional do pague e leve, não fazemos a mínima ideia de como se sustenta mas temos uma noção, de que a cidade possui outras regras, apesar de não se incomodar com o dinheiro vindo de outras práticas não tradicionais.
Quando chegamos ao cinema, sentamos na poltrona e o filme começa pensamos: “nossa que gente primitiva”, isso é uma forma de reproduzir as histórias únicas que conhecemos nossa vida inteira, a história apenas de quem venceu e o perigo de uma história única, de acordo com
Adichie (2019) é que ela, é contada apenas pelos vencedores, que da mesma forma que usurparam, estupraram, escravizaram, roubaram e determinaram características nos “outros”, beneficiando-se de um “status” de ser racional, erudito, culto e com características que devem ser mais representadas dentro da sociedade só o são tão belos e desenvolvidos, devido a carnificina empregada em sua gestão e controle.
Em Bacurau não é diferente, os “outros” são os despreparados, assim pensamos e o filme, leva você a sentir um arrepio pois, seu final é surpreendente. Ainda não conferiu este filme? Então veja, disposto a tomar um susto e de sair sem entender se o filme é de fato numa cidade fictícia. Preste bastante atenção na televisão da cidade e na forma de organização e comunicação repassada. Uma comunicação tão eficiente, que derruba até a política vigente.
O mercado da morte aparece em Bacurau e nos envia para a nossa realidade de mortes pelo Covid-19 em todo o Brasil, e no mundo, podemos assim dizer. Baseado apenas em fatos, Bacurau, nos reserva surpresas e nos permite uma sensação de dever cumprido. Um sensação de acordo com Spivak (1985) de um subalterno poder falar, de um subalterno se organizar, sobreviver sem ajuda política, de existir sendo considerado excluído.
Espero que as reflexões deste texto consigam fazer com que o filme Bacurau, exista não apenas como o “outro” mas como forma de poder e reflexão crítica sobre as condições sociais existentes em nosso mundo, vale ressaltar que a trajetória está mudando, só não percebe quem aceita de bom grado, uma história única e não reconhece que antes, já existia uma cultura existente com suas regras, padrões, cultura e sobrevivência.
Pois bem, se vier, venha em paz.

Referências:
CHIMAMANDA, N, A. O perigo de uma história única. Editora: Companhia das letras. 2019.
DAVENPORT, T, H.; PRUSAK, L. Conhecimento Empresarial; como as organizações gerenciam o seu capital intelectual. Rio de Janeiro: Campus, 1998. 237p
IVANA, B. Bacurau e síntese do Brasil brutal. Disponível em: https://revistacult.uol.com.br/home/bacurau-kleber-mendonca-filho/. Visualizado em 30/07/2020.
MIGNOLO, W. Histórias Globais/projetos Locais. Colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
MOTTA, F, C, P. Burocracia e autogestão (a proposta de Proudhon). São Paulo, Brasiliense, 1981.
PAULO, F. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra LTDA, v. 199, 1967.
SPIVAK, G, C. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora: UFMG, 133p., 2010 [1985].

Postado por: Ana Lúcia Schmidt Castelo
Centro/RJ, Brasil.
Mestranda em Administração, graduada em Pedagogia, Arquivologia e concluindo a graduação em Letras. Apaixonada por cinema com preferência por filmes de terror e colaboradora do Blog: “Cinema cem anos de luz, Arte e reflexão” do amigo Marcelo Castro Moraes.